Eu
não sei - não sei mesmo - os contornos das negociações (?) com Lisboa para que
a República aprovasse a garantia à Madeira de um aval para uma operação
financeira junto da banca, permitindo assim que a RAM suportasse cerca de menos
6 a 8 milhões de juros anuais. Numa altura, isso eu sei, em que o estado
pretende meter mais 460 milhões no ex-BES (cuja rede de gatunos e corruptos nem
julgados ainda foram) - e esta geringonça já espatifou mais de 3 mil milhões de
euros na banca falida e roubada - o Estado, ou melhor, o governo da geringonça
envergonhada recusa (?) o aval pomposamente anunciado na imprensa local, tendo
como fonte - outro mistério estranho e algo caricato - por Marcelo Rebelo de
Sousa, que atendendo ao desfecho, acaba por sair deste processo chamuscado,
desautorizado e ridicularizado.
Acho
tudo isto lamentável e absurdo.
Começo
por referir, porque me parece importante trazer a este texto opinativo, que desconheço
a dimensão do embuste político, a amplitude da manipulação mentirosa que rodeou
este processo negocial, mesmo correndo o risco de ter que recuar nas
considerações dado que, repito e insisto, desconheço em absoluto os contornos
de todo este dossier e já não acredito em nada do que é publicado.
A
sensação que eu tenho é que há um défice tremendo de diálogo entre os dois
governos, um diálogo que se desenvolva nos bastidores da política e das
relações institucionais, sem as doentia dependência de notícias nos jornais e
destaques nas televisões (não há maneira de perceberem que essa trampa de
atitude não dá votos) - e isso está a contaminar a política madeirense há uns 3
a 4 anos para cá (a chamada governação ou oposição da treta, feita para
notícias e não a pensar nas pessoas). Neste caso do aval solicitado pela RAM
acresce que tenho a sensação que a opinião pública não tem sido devidamente
informada, que há uma desconfiança enorme em relação aos factos e à verdade.
Afinal:
- que
contactos manteve o GRM com Lisboa sobre esta matéria? Datas? Missivas?
Contactos telefónicos? Entre quem? Quem com quem?
-
quem coordena os contactos políticos entre o GRM e Lisboa? E como isso é feito?
- que
documentação existe disponível que confirme a razão do GRM perante a recusa (?)
de Lisboa na concessão desse aval?
- com
o aval do Estado quanto pagaria a RAM, mensalmente? Sem o aval quais os
encargos mensais da RAM com essa operação financeira?
-
quais as características da operação financeira negociada pelo GRM junto da
banca e cuja necessidade ninguém ousará contestar, muito menos nestes tempos de
pandemia e atendendo ao rombo causado e que vai continuar a causar?
- que
respostas deu Lisboa aos pedidos do GRM? E em que sentido?
-
como se envolveu neste processo o Presidente da República - que acaba por fazer
uma triste figura e protagonizar um papel ridículo neste processo,
desautorizado, colado ao rótulo de potencial "mentiroso" neste
processo?
-
como é possível, e com que fundamentos institucionais, um jornal regional tenha
destacado em primeira página, e com relevo, o alegado "sim" de Lisboa
ao aval (curiosamente não deu igual destaque e relevo quando afinal esse
"sim" virou "não" de um dia para outro... - quando pelos
vistos foi enganado e manipulado nessa notícia?
O que
eu sei é que entre a RAM e a República - e confesso que não vejo sinais de
qualquer mudança política potencial com este PSD de Rio que acaba por ser
apenas um prolongamento, um apêndice se preferirem, de Costa e da sua lógica
governativa - e ao contrário do que devia existir, não há canais de diálogo, e
as portas que se abrem em Lisboa ou parecem ser reduzidas para as necessidades
ou quase não existem.
Noutros
tempos - sem com isso pretender fazer comparações, até porque os tempos são
outros, os protagonistas e os interlocutores são outros, os momentos e os
tempos na política são diferentes -
mesmo parecendo haver "guerra", Funchal e Lisboa tinham canais
discretos de diálogo que asseguravam, com mais ou menos tempo de demora,
soluções que em determinados momentos eram essenciais. Obviamente que nada
funcionou sempre bem e eficazmente, muito menos na perspectiva do que a RAM
pretendia ou reclamava. Obviamente que Lisboa não cedeu em tudo ao que o
Funchal pedia, mas cenas como estas, desculpem, palhaçadas como estas - que
começaram com Cafofo a dizer que ia a Lisboa dar um murro não se percebe onde e
como… - nunca vimos. Pelo menos não me lembro, correndo o risco de não estar a
ser exacto. Mas não me recordo de nada com estes contornos, contradições,
pessoas enganadas, manipulação descarada para consumo mediático, pessoas ridizularizadas,
incluindo o Presidente da República etc. Lembro-me sim, e por exemplo, da
célebre resposta de Cavaco a João Jardim - dada no Porto Santo – do “queres dinheiro vai ao Totta” (frase
publicitária muito em voga nesse tempo), o complicado relacionamento financeiro
com Passos, agravado com a história do tal “buraco” surgido em 2011, a que se
seguiu um humilhante PAEF, o relacionamento exemplar e surpreendente (devido às
“guerras” políticas então existentes) entre Jardim e Guterres, enquanto
primeiro-ministro, e os gravíssimos conflitos no tempo de Sócrates e do seu
ministro Teixeira dos Santos, em torno das mudanças na Lei de Finanças
Regionais, mas que não impediram, já no final do mandato, a Lei de Meios,
depois da Madeira ter sido devastada por um temporal mortal e altamente
demolidor. São episódios que recordo bem. Nada comparável a esta estranha e
idiota novela em torno do aval, algo que já antes teve um primeiro episódio com
a histórias absurdas e mal contadas, em torno do financiamento do Estado à
construção do novo Hospital da Madeira (espero que seja essa a sua designação
oficial)
Dúvida
Uma
dúvida final: afinal que tipo de relação tem o PS-M com o governo da República?
Com quem em concreto? Ou o grupo parlamentar em São Bento é o único interlocutor?
Qual a dimensão da receptividade que o PS nacional atribui ao PS-M, sobretudo
depois de nova derrota nas regionais de 2019, comparando com o que se passa com
o PS-Açores onde os socialistas são poder há décadas. O que eu sei sobre isto,
de fonte da minha confiança e conhecedora da realidade, é que o deputado Carlos
Pereira, sozinho, tem mais canais de contacto e de diálogo em Lisboa - não
confundir com qualquer capacidade de pressão - do que os actuais dirigentes
socialistas locais. Quanto a isso não tenho dúvidas. Aliás gostava de conhecer
a posição do deputado socialista CP perante a alegada recusa do aval (se é que
alguma vez foi acordada...), depois da relação que teve quando foi noticiada a
falsa concessão desse aval.
Nota
final
Será que Lisboa guarda na gaveta uma surpresa no OE-2021, na discussão na especialidade, na lógica da contabilidade de votos para a aprovação na generalidade do OE-2021? Seria surpreendente. E já agora outro desafio: será que a RAM, mantendo-se a recusa da República a este aval pedido pela RAM, ponderou recorrer aos Tribunais para emissão de decisão ou de jurisprudência sobre esse relacionamento financeiro e sobre a lógica do Estado, por um lado se vangloriar com o facto de pagamentos juros com a dívida portuguesa, e por outro penalizar os madeirenses a pagarem mais 6 ou 8 milhões de euros em juros, caso esse aval não seja concedido? O Tribunal Constitucional não tem uma posição sobre esta temática ao abrigo das disposições constitucionais e das obrigações do Estado mais em concreto? O TC não tem opinião sobre uma dualidade de critérios, por exemplo comparando a recusa de concessão de um aval, que não implica o pagamento de um cêntimo que seja - se a RASM cumprir as suas obrigações como lhe compete - e o espatifar de mais de 3 mil milhões de euros para tapar a dívida ao sector financeiro por parte das empresas públicas (com a CP à cabeça com quase 500 milhões de euros), mais os milhares de milhões para uma TAP a definhar e mais quase 500 milhões de euros para o ex-BES. Estou a perorar sobre o envolvimento dos tribunais e do TC na questão das relações financeiras entre Estado e RAs? Sei lá, mas tenho essa liberdade acho eu, mas por acaso alguém pensou a sério nisso? (LFM)
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