Escreve o Dinheiro Vivo que “se o Governo
relaxar por culpa própria o ritmo de ajustamento orçamental no período pós
troika, e em particular no próximo ano, “estará a dar sinais errados aos
mercados” e estes não tardarão em penalizar Portugal com taxas de juro mais
elevadas, empurrando a República para um segundo programa de ajustamento. O
aviso partiu ontem de uma fonte oficial da Comissão Europeia, numa
teleconferência a partir de Bruxelas. Num cenário destes, nem sequer seria
possível ativar um programa cautelar, apontou. A “saída limpa” ficaria manchada
de forma indelével. O responsável ligado à troika diz que se a saída do
programa for perturbada por uma derrapagem nas metas orçamentais por culpa
exclusiva do Governo, por “falta de compromisso político” ou porque foram
escolhidas políticas “não saudáveis”, os mercados globais punirão o país com
juros bem mais elevados que os 3,5% a 3,7% que vigoram hoje nas OT a dez anos.
Com uma dívida pública “das mais elevadas do
mundo ocidental”, um agravamento das taxas fará subir ainda mais a fatura dos
juros (que contam para o défice) e tornará a dívida pública insustentável. No
atual cenário de políticas, a dívida, apesar de monumental (130% do PIB), ainda
é vista como "sustentável". Ficará muito difícil financiar essa dívida
através de crédito a preços razoáveis, em mercado aberto. Seria nesse ponto,
com o país de novo encurralado, sem acesso a mercados, que ocorreria um segundo
programa de ajustamento: um empréstimo e uma panóplia de austeridade.
Mercados
são benignos... mas também inconsistentes
“Por enquanto, os mercados estão a ser
benignos em relação a Portugal, mas sabemos que os mercados são inconsistentes.
Podem não reagir imediatamente a erros de política, mas fá-lo-ão mais cedo ou
mais tarde”, atirou. O oficial diz, por exemplo, que existe alguma “preocupação
de que o ritmo de reformas tenha abrandado em algumas áreas”. Num cenário de
culpa própria do Governo na condução do ajustamento – foi referido o exemplo de
eventuais tentações eleitoralistas em 2015, ano de legislativas – cessa o
direito a pedir uma rede de proteção cautelar, continuou a mesma fonte. “É
essencial existir um forte compromisso nas reformas estruturais e na
consolidação orçamental.” “Em todo o caso, há memória do que aconteceu ao país
quando não se seguiram boas políticas” e “existem reformas que já estão a dar
frutos”, disse. São “bons incentivos” que permitem relativizar os riscos
políticos ligados ao ciclo eleitoral. No entanto, o direito de pedir um
cautelar em caso de crise existe apenas num cenário em que “o Governo continua
a implementar boas políticas”, mas em que são as “condições externas” a
complicar o ajustamento orçamental.
Será este o cenário em que estaria a pensar o
primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, quando no passado dia 4 de Maio disse
que a escolha por uma saída do programa sem cautelar “está alicerçada no apoio
dos nossos parceiros europeus, que de forma inequívoca o manifestaram fosse
qual fosse a opção que viéssemos a tomar”. “Eles sabem que podem confiar em
nós”, sublinhou nesse dia o chefe do Governo. O responsável da União Europeia é
que está algo cético quanto ao futuro próximo: em 2005, o país tem “um longo caminho” pela frente até
chegar aos 2,5% de défice, combinados com a troika no programa de ajustamento que
termina oficialmente no próximo sábado. “Muito foi conseguido”, “muitas
reformas chave foram feitas” com a aplicação do programa de ajustamento da
troika nestes três anos, mas “o crescimento do PIB ainda não é robusto” e “os
elevados níveis de dívida pública sugerem que Portugal poderá ser afetado por
uma reviravolta no sentimento dos mercados de obrigações”, alertou a mesma
fonte da UE. E há ainda “o endividamento das empresas e o incumprimento de
crédito que continuam a pesar na rendibilidade e no crescimento dos bancos”,
atores vistos como cruciais para o financiamento da economia e do investimento”