“Portugal é um país com toda a espécie de
palhaçadas. Chamar palhaço ao político Cavaco Silva, que é Presidente da
República, pode ser crime, sendo certo que o jornalista Miguel Sousa Tavares
considerou que se excedeu mas, mesmo assim, o assunto gerou grande debate. Já o
político Mário Soares, antigo presidente da República, acusar alguém de fazer
chantagem sobre o ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros e insinuar que
Paulo Portas tem muito a esconder no caso dos submarinos é igual ao litro. Não
se passa nada. Ficamos a saber que ser palhaço, em Portugal, é muito pior que
ser chantagista ou corrupto. E ficamos a saber também que algumas pessoas podem
dizer o que lhes apetecer, porque é igual ao litro. Sendo que quando isso
acontece com Soares é triste.
Portugal
é o país de toda a contestação. Contesta-se a existência de cursos superiores a
mais, alguns com meia dúzia de alunos, e contesta-se que um qualquer governo
queira pôr ordem nesta balbúrdia. Contesta-se a máquina do Estado por ser
demasiado grande, e consumir gulosamente a nossa riqueza, e contesta-se que um
qualquer governo queira aplicar uma banda gástrica no monstro. Contesta-se os
governos pouco interventivos e contesta-se os que se metem em tudo e mais
alguma coisa. Contesta-se os políticos que enganaram o povo e contesta-se o
povo que não aplaude os políticos que prometem este mundo e o outro.
Portugal
é o país do faz de conta. Faz de conta que a culpa é do outro e aí encontramos
as nossas desculpas. Faz de conta que o problema é a austeridade que trouxe a
pobreza, como se não soubéssemos que foi a falsa riqueza que trouxe a austeridade.
Faz de conta que se aprendeu com os erros do passado, quando gritamos que os
queremos cometer outra vez.
Portugal
é o país em que o comentário político é feito maioritariamente por pessoas que
António Variações bem definiu: "Tenho pressa de sair/ Quero sentir ao
chegar/ Vontade de partir/ Para outro lugar." É por isso que se gerou um
grande consenso sobre a necessidade de chamar a troika e aplicar um rigoroso
plano de austeridade para agora parecer que ele nos foi imposto por alguém que
nos quer mal. É por isso que a quase totalidade dos comentários pediam a saída
de Sócrates e a chegada de Passos Coelho e agora, com a legislatura a meio, o
que se pede é a partida de quem chegou. E voltará a repetir-se o refrão.
Portugal
é um país que sofre, que vai sofrer ainda muito tempo, mas que tem de saber que
a cirrose de um alcoólico não se cura com uma garrafa de vinho. O mesmo é dizer
que o excesso de dívida não pode ser resolvido com mais dívida, mesmo que nos
digam que é para pôr o País a crescer. A última vez que nos disseram isto, deu
no que deu” (texto de Paulo Baldaia, DN de Lisboa, com a devida
vénia)