“Numa das inúmeras ações meritórias que
se realizam em Portugal e que passam mais ou menos despercebidas, a Fundação
Francisco Manuel dos Santos realizou quinta-feira uma conferência subordinada
ao tema 25 Anos de Portugal Europeu. O debate foi sereno, inteligente e
motivador, reunindo pessoas de várias origens e latitudes políticas que,
evitando a demagogia que por aí vai, tentaram focar-se na discussão concreta
de um problema concreto: soubemos ou não aproveitar os fundos e as
oportunidades que a Europa nos propiciou?
Em tempo de crise muita gente se vira
contra a Europa e o Euro. São mal-agradecidos. Vivemos, apesar desta crise
profunda, incomparavelmente melhor. Aliás, a brutal contração que sofremos
coloca-nos ao nível de 1998 ou 1999, o que significa num patamar muito mais
elevado do que aquele que tínhamos em 1986.
Eu sei que é politicamente incorreto
dizer isto e que uma série de pessoas que nem sequer leem os textos me
insultarão por minimizar esta crise. Não é disso que se trata, mas apenas de
tentar um esforço de realismo. Os anos de 1986 a 2000 correspondem aos de
maior crescimento económico no pós-25 Abril e, excetuando a década de 60, aos
de maior crescimento no século XX. O que aconteceu a partir daí foi um
desastre. E o professor Daniel Bessa, baseando-se no estudo feito por Augusto
Mateus, foi muito claro: Portugal pensou que podia crescer pelo consumo e
pelos serviços e não pela produção. Isto, devido a um erro claro de análise
que começou nos responsáveis do Banco de Portugal (propositadamente não coloco
nomes, porque o erro foi partilhado por vários governantes), segundo o qual,
com a moeda única, não haveria limite ao endividamento.
Ainda hoje os apelos que se ouvem ao
crescimento se baseiam quase todos no modelo de mais consumo, pois pelo lado da
produção poucas ou nenhumas ideias surgem. Foi este modelo, baseado nas
obras, no cimento, na formação profissional (tantas vezes falsificada) e em
muitos outros aspetos que todos conhecemos que falhou. E, segundo Bessa,
que foi ministro de Guterres até 1996 (sendo substituído, precisamente, por
Augusto Mateus e depois por Pina Moura) foi o esgotamento deste formato, que
era visível já em 2000, e que se sabia ser claramente agravado pela entrada no
Euro, caso não mudássemos de rumo, que levou Guterres, em 2001, a deixar o
Governo alegando estarmos metidos num pântano. O professor de economia
sublinhou mesmo que "O pântano dizia essencialmente respeito à situação
económica entretanto criada no nosso país".
Mas os governos seguintes pouco ou nada
fizeram para inverter esta situação pantanosa. Barroso também preferiu sair.
Do governo de Sócrates, que entra em 2005, afastou-se rapidamente outro
professor de Economia, Luís Campos e Cunha, arrepiado pelas PPP e pelas
perspetivas de endividamento com a construção de um novo aeroporto e de um TGV.
O que lá vai lá vai e não é falar disto
que nos ajuda agora (e aqui omitem-se outras causas globais). Porém, é bom
sabermos que nada aconteceu por acaso. Nem sequer por distração. Foram opções
políticas e económicas que uns tomaram e que outros - lamento dizê-lo - não
tiveram a oportunidade ou a força de denunciar e contrariar. O pântano,
simplificadamente, foi esta espécie de paz podre em que vivemos uma década, com
o povo a chamar maluco a pessoas como Medina Carreira e a exigir mais e mais
estradas, aeroportos, comboios, crédito e o que mais viesse.
Teremos
aprendido? Não me parece” (texto de Henrique Monteiro, Expresso, com a
devida vénia)