sexta-feira, abril 19, 2013

Opinião: "(in) Seguro..."


"Podemos dizer que o líder socialista, reeleito com quase 98% dos votos nas directas, é um dirigente sem vontade própria, na medida em que vagueia em função da dimensão e da persistência das pressões internas e externas, da responsabilidade de sectores socialistas diferentes entre si, a que não escapa o próprio José Sócrates - a imagem da falência do pais e do pedido de resgate financeiro internacional e da negociação com a tróica da versão original do memorando de entendimento, hoje retalhado e alterado depois de sete avaliações.
Pode-se dizer também que não se conhece a Seguro nenhuma medida concreta que seja considerada uma real alternativa às políticas bandalhas que estão a ser executadas por este desacreditado governo de coligação, já que estamos a falar do líder do maior partido da oposição. De facto, ninguém sabe afinal o que pensa Seguro das medidas tomadas por este governo de coligação nem o que faria de diferente, como e em que sectores, caso o PS um dia chegasse ao governo. Mais do que isso, não conseguimos sacar de Seguro um discurso coerente, através do qual se afirme de forma incontestável, como o líder de uma alternativa política e governativa que na realidade não existe aos olhos dos portugueses.
Aliás estou convencido, absolutamente convencido, se é por causa dessa perspectiva de inexistência de uma alternativa consistente e consolidada, que Cavaco já não demitiu este governo de coligação, e convocou eleições antecipadas, que na expectativa de que fossem capazes de remobilizar os cidadãos e de lhes devolver esperança. Hoje os portugueses estão desmotivados, desmobilizados, frustrados, com um forte sentimento de terem sido enganados e de quererem por isso ajustar contas com quem os usou, manipulou e, não satisfeitos, lhes mentiu descaradamente, fervendo como se costuma dizer numa "panela de pressão" social que se um dia se rebenta - oxalá isso não aconteça - será a classe política a primeira a perceber a dimensão dessa fúria popular descontrolada.
Influenciado pelas sondagens ou anestesiado pela perspectiva de uma vitória eleitoral - que será sempre por demérito deste desprezível governo de coligação e não por mérito próprio dos socialistas ou de Seguro - a verdade é que o reeleito secretário-geral do PS junta o facto de não ser capaz de ir muito além de uma dimensão eleitoral que não lhe garante qualquer maioria absoluta e que dificilmente viabiliza outra solução governativa que não seja a de recorrer à esquerda do PS, caso recuse entendimentos com o centro-direita ou com a direita, nomeadamente com o CDS, parceiro privilegiado dos socialistas em coligações.
Seguro tem ainda um problema complexo acrescido, e que resulta da uma dificuldade tremenda em veicular uma mensagem política convincente e mobilizadora da sociedade e em estruturar ideias, que sejam claramente alternativa à política em execução em vez de banalidades ou teorias vagas, sem convicção. Aliás a presença de Sócrates, agora como comentador político da pública RTP - e apesar de estar a perder todos os sábados espectadores, na ordem dos mais de 200 mil, numa demonstração de que os portugueses não são idiotas úteis e que não se esquecem de quem se trata a personagem em questão e das responsabilidades que teve pela situação em que hoje nos encontramos - veio acentuar a dificuldade de Seguro em veicular a sua mensagem, mesmo que Sócrates seja o que vulgarmente se designa de "animal político" enraivecido e sedento de vingança, com um poder de comunicação incontestável, pese a amnésia, a manipulação, a mentira e as distorções que caracterizam as suas intervenções em queda livre e longe de garantirem as audiências que a estação pública pretendia conseguir.
Não é fácil o papel de Seguro, ainda por cima acusado de ter estado calado durante o "socratismo" e de se ter remetido ao silêncio cómodo da última fila dos deputados, aparentemente esquecido pela nomenclatura socialista então dominante, sem qualquer intervenção ou alerta, apesar de perceber o que se estava a passar e de ter a consciência absoluta das consequências criminosas que dai resultariam, como efectivamente veio a acontecer, para o país e os portugueses.
O que quer então Coelho - na sua psicose doentia de uma patética visão messiânica pedante e autoconvencida da política ou de um estatuto patético de salvador do país, nem que seja à custa da penalização dos cidadãos, segundo ele os verdadeiros culpados por estarmos no ponto em que hoje nos encontramos – de Seguro, num estranho coro que junta o presidente da república, desejoso que não ter problemas complicados nesta recta final dos eu mandato, empresários e banqueiros? Cumplicidade, se preferirem a partilha do ónus e da responsabilidade política, da pesadíssima responsabilidade política - que estimo venha a gerar uma hecatombe eleitoral e política do PSD e do CDS, sobretudo do PSD, de consequências imprevisíveis - decorrente da execução de um criminoso programa governativo assente na austeridade pela austeridade, levianamente imposta por decreto, e que se agravará depois das medidas do Tribunal Constitucional, conjugadas com a exigência da tróica, anterior à decisão do TC, de corte da despesa pública da ordem de pelo menos 4 mil milhões de euros.
Acredito que Seguro percebeu que tem pouco espaço de manobra, ainda por cima a escassos dias de mais um congresso que não pode constituir um momento de mera aclamação de um líder político hesitante, vazio de ideias, que não inspira confiança nem mobiliza eleitores e que aparentemente se limita a viver a reboque dos acontecimentos. Os militantes socialistas, que acabaram de reeleger Seguro com cerca de 98% dos votos, são os mesmos que reelegeram Sócrates em Abril de 2011, com quase 99% do universo eleitoral socialista e que dois meses depois, com a derrota eleitoral em Junho desse ano, rapidamente o responsabilizaram pelo desaire do PS e o escorraçaram. Seguro não quer nem pode correr riscos a escassos dias do congresso. Dificilmente Coelho poderia contar com ele para qualquer jogada política mais ou menos mediática e apesar de saber isso o primeiro-ministro aceitou o papel ridículo que a propaganda governamental eventualmente lhe recomendou e alimentou - ninguém sabe se por exigência ou pressão da tróica - a que não faltou a divulgação da carta endereçada ao líder socialista para um encontro cinco meses depois do último. Obviamente que Seguro e o PS perceberam que subjacente a esta encenação mediática estava uma mera intenção propagandística, já que as medidas de austeridade, sobre as quais Coelho pretendeu ouvir Seguro, estavam tomadas, muitas delas há muito tomadas, o que reforça ainda mais a dimensão deste embuste e a descarada hipocrisia que esteve presente na preparação desse encontro.
Finalmente, parece-me óbvio que depois de ter pedido eleições antecipadas e de ter avançado com uma moção de censura, Seguro tema que uma acentuada cedência ao governo, por exemplo colocando o PS numa situação de cumplicidade efectiva com as medidas de austeridade que serão anunciadas e de dependência face ao governo e à actual maioria parlamentar, o epicentro da oposição mude de protagonistas o que colocaria problemas políticos adicionais e complexos aos socialistas.
Decididamente as coisas não estão fáceis" (JM)