quinta-feira, abril 18, 2013

Expresso: "A caminho de um segundo resgate? "



Li no Expresso, num texto do jornalista J. Silvestre, que "o fantasma de um segundo programa da troika pairou esta semana. Mas, até ver, nada de substancial mudou com a decisão do Tribunal Constitucional. Logo no dia em que foi assinado o memorando de entendimento surgiram de imediato dúvidas sobre a capacidade de Portugal regressar à ‘normalidade’ emjunho de 2014 quando o programa terminar. Nessa altura, Portugal terá uma dívida superior, uma notação de risco (rating) mais baixo do que no início da crise e estará a sair de uma penosa recessão. Um cenário nada animador. Não foi por acaso que as maturidades dos empréstimos europeus já foram estendidas e deverão sê-lo novamente. Aliás, o documento que a troika apresentou esta semana ao Eurogrupo, refere precisamente o risco de financiamento do Estado português depois do final do programa. Será que dentro de pouco mais de um ano os investidores estarão disponíveis para emprestar dinheiro a taxas de juro razoáveis? É a grande questão que paira há dois anos e que, na prática, pouco ou nada se alterou com a decisão do Tribunal Constitucional. Apenas perturbou ligeiramente os juros da dívida pública nacional mas, mesmo assim, sem um efeito exagerado.
Em 2014, o Estado português precisa de se financiar em 36,7 mil milhões de euros para cobrir o défice e amortizar dívida, dos quais apenas 8,1 mil milhões de euros estão cobertos pelo FMI e União Europeia. O resto terá de vir de novas emissões. Por isso, o regresso aos mercados é a linha que separa Portugal de um segundo resgate. Se o Estado conseguir financiar- se normalmente até lá, não há qualquer problema. Mas se não conseguir terá de ter ajuda, mesmo que seja uma espécie de resgate light. Ou seja, emissões de dívida no mercado com apoio do Banco Central Europeu (e o seu programa de compra de dívida OMT) e também de uma eventual linha de precaução do fundo europeu de resgate (ESM). Este cenário foi defendido recentemente pelo governador do Banco de Portugal, Carlos Costa. Não se trata de um programa idêntico ao atual mas representa um suporte ao financiamento do Estado português que, apesar de tudo, já deverá estar no mercado ainda que com ‘braçadeiras’. O que não quer dizer que não haja austeridade, mas isso, com o novo pacto orçamental, vai continuar por muitos anos com ou sem segundo resgate.
Como travar a fundo sem patinar?
Vítor Gaspar conseguia cumprir a nova meta de défice definida com a troika sem o chumbo do Tribunal Constitucional? Ninguém pode responder. O que se sabe é que agora vai ser ainda mais difícil. A tudo o que já tinha que pedalar para chegar aos 5,5% pretendidos no final do ano, oministro tem que juntar agora 1326 milhões de euros das quatro medidas declaradas inconstitucionais. É este o efeito orçamental líquido do acórdão, segundo cálculos do Ministério das Finanças. Se nada for feito e tudo o resto se mantiver igual, significa que o défice ficará em 6,3%, oito décimas acima do objetivo. Isto já com medidas adicionais acordadas durante a sétima avaliação no valor de 500 milhões de euros. Quem achava que a sétima avaliação foi amais longa até ao momento estava a fazer as contas por baixo. Neste momento, o cronómetro ainda não parou e a troika vai regressar a Lisboa na próxima semana. Fonte oficial das Finanças não adiantou ao Expresso se virão já os chefes de missão ou se, num primeiro momento, os trabalhos serão deixados às equipas técnicas.
Sétima avaliação
A conclusão definitiva desta avaliação, para efeitos de libertação da nova tranche num total de 2000 milhões de euros, estava já dependente da apresentação do Documento de Estratégia Orçamental com a definição dos cortes de 4000 milhões de euros na despesa até 2015. Agora, o processo ficou ainda mais pendurado porque é necessário, no imediato, encontrar novas medidas. O rol de possibilidades é externo e vai desde aumentos da idade de reforma, a saídas em massa na Função Pública ou a cortes nas prestações sociais. As linhas gerais terão sido comunicadas por Vítor Gaspar aos seus colegas europeus na reunião do Eurogrupo em Dublin. As áreas visadas são Educação, Saúde, Administração Pública, Segurança Social e empresas empresas públicas. Mais ou menos as mesmas áreas (com a exceção das empresas) analisadas pelo relatório do FMI sobre despesa pública divulgado em janeiro, A dura reação de Passos Coelho ao acórdão, na declaração ao país que fez no domingo passado, teve eco financeiro no despacho de Gaspar de segunda-feira em que praticamente congela todas as novas despesas até decisão em contrário. Uma decisão polémica e fortemente criticada em vários quadrantes — dentro e fora do sector público — que obrigou até a um esclarecimento no dia seguinte pela direção- -geral do Orçamento, numa espécie de guia para os serviços do Estado. O despacho congela toda a nova despesa com três exceções:
- salários, custas judiciais e contratos em curso cujo montante a pagar não pudesse ser determinado no momento em que foi celebrado.
À primeira vista, a decisão parecia quase o parar da rotação da Terra (recorrendo à imagem de João Duque no caderno de Economia desta semana) só que, na prática, os efeitos não são assim tão drásticos. Desde logo, os hospitais-empresas estão fora do perímetro orçamental e, por isso, não são abrangidos pelo despacho. Mesmo para os hospitais que se mantêm dentro do sector público administrativo o despacho apenas congela novas despesas e não contratos que estão em curso. Noutras áreas, como a segurança social ou as regiões e autarquias, que estão enquadradas por legislação específica, a despesa continua a ser feita. Gaspar agarrado ao Excel Claro que ficarão sempre despesas por realizar ou novos contratos por celebrar enquanto não forem fixados os novos tetos de despesa. E há serviços que podem ficar parados enquanto o Governo refaz as contas. Para o economista Ricardo Cabral, da Universidade da Madeira, o ideal seria aproveitar esta decisão para não avançar com mais medidas de consolidação nas áreas pretendidas por terem sido já bastante castigadas. “A declaração de inconstitucionalidade de várias normas pelo Tribunal Constitucional é, em si, um fator benéfico para a economia”, sublinha, avisando que “cortes de despesa e aumentos de impostos no contexto atual agravam a espiral recessiva”. Cabral defende, por isso, uma renegociação das metas com a troika e, para o futuro, uma melhoria no processo de tomada de decisões para, entre outras coisas, conhecer o seu real valor. Já António Afonso considera “surpreendente que a política orçamental esteja a ser decidida, de um ponto de vista estrutural, como resposta a factos que surgem de forma ad-hoc, e não no contexto de um processo pensado com tempo e detalhe”. Para o professor do ISEG, não ter em consideração que o Tribunal Constitucional tem uma palavra a dizer “pode provocar situações menos fluidas, como a que agora se vive”.