Ficou assustado quando viu a nova previsão do Banco de Portugal para o PIB este ano? Não é para menos. É preciso andar quase 100 anos para trás, até 1928, para encontrar uma queda maior do que os 9,5% estimados para 2020. É a pior crise em quase um século e pode não ficar por aqui. O próprio banco central avisa que, num cenário de segunda vaga da pandemia no outono que obrigue a novo confinamento geral, o PIB poderá cair 13,1%. E a recuperação será mais lenta: em vez de crescer 5,2% e 3,8% nos próximos dois anos, o que deixaria a economia muito perto do nível pré-pandemia em 2022, os avanços serão de apenas de 1,7% e 3,5%. Neste contexto, o cenário usado pelo Governo na alteração ao Orçamento do Estado aprovado esta semana na generalidade, que aponta para uma contração do PIB de 6,9% este ano, parece bastante otimista. Aliás, entre as projeções das várias entidades (Comissão Europeia, Fundo Monetário Internacional, Banco de Portugal, OCDE e Conselho das Finanças Públicas), apenas a Comissão, numa avaliação publicada em maio, prevê uma queda inferior à do Governo (6,8%).
O PIB ‘perdido’ ao longo destes três anos (2020-2022) pode ser, no cenário mais negativo do Banco de Portugal, quase equivalente ao que aconteceu numa década depois da crise financeira. Nessa altura, o PIB só regressou ao nível pré-crise de 2008 dez anos depois e a perda acumulada face ao que teria sido a economia se o PIB simplesmente se tivesse mantido inalterado foi de 39%. O equivalente a cerca de 80 mil milhões de euros, ao nível do PIB do ano passado. Agora, só em três anos, se houver a tal segunda vaga, a perda será de 33% e, nessa altura, o PIB estará ainda 8,5% abaixo do que era antes da pandemia. É, por isso, natural que demore mais dois ou três anos a regressar a 2019 e que, assim, ultrapasse a perda acumulada com a crise financeira.
E PIB perdido não é apenas uma estatística. São salários e outros rendimentos do trabalho (que representam uma fatia ligeiramente acima de 50% do PIB) que se perdem e também rendimentos de capital (lucros e não só) que nunca mais regressam. O mesmo é dizer uma taxa de desemprego que vai disparar para os dois dígitos, algo que não se via desde 2016, em termos anuais.
Na verdade, não há grandes certezas sobre a extensão da crise e a generalidade das previsões que têm sido publicadas tendem a ser sucessivamente mais pessimistas. Há igualmente incerteza sobre a resposta da política económica. O Banco Central Europeu já lançou uma nova ‘bazuca’ e reforçou recentemente a dose. E os governos estão a adotar medidas em função das necessidades, mas, principalmente, da sua margem orçamental. A Alemanha lidera na Europa, Portugal está entre os últimos. Aguarda-se a decisão política sobre o fundo de recuperação europeu, que é particularmente relevante para os países mais endividados (Expresso, texto do jornalista JOÃO SILVESTRE)
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