Os descontos para a Segurança Social geraram mais de 20,6 mil milhões de
euros para os cofres do Estado, um recorde que não tem paralelo nos últimos 25
anos. O outro grande motor das receitas fiscais foi o IVA, fruto da melhoria no
consumo. Um e outro serão muito penalizados este ano. Em 2019, os portugueses
suportaram um valor recorde de contribuições para a Segurança Social:
descontaram, ao todo, 20 612 milhões de euros, mais 7,7% do que um ano antes e
o equivalente a 9,7% da riqueza criada no país. A percentagem é a mais alta
desde 1995, colocando o peso as contribuições em níveis historicamente altos.
No ano passado, pela primeira vez na história, o Estado foi buscar mais de
20 milhões de euros em contribuições sociais, revelam as ‘Estatísticas das
Receitas Fiscais’ do Instituto Nacional de Estatística (INE), publicadas esta
segunda-feira. O valor cresceu significativamente face a 2018 (7,7%), mas não é
a taxa de crescimento que se registam recordes (nas últimas décadas houve
crescimentos anuais maiores). A grande novidade está no facto de estas receitas
estarem a poucas décimas de valerem 10% do PIB.
Em 2018, as contribuições sociais representaram 9,4% do PIB e foi em
2014 que esta fonte de receitas atingiu o patamar dos 9%, onde permaneceu em
2015, para paulatinamente vir a assumir um maior peso nos anos seguintes.
Do lado das empresas, através da taxa social única (TSU), foram
entregues aos Estado 12 416,5 milhões de euros (cerca de 11,4 mil milhões de
euros um ano antes), enquanto o restante saiu dos bolsos dos trabalhadores num
total de 8 195,5 milhões de euros (contra os 7,7 mil milhões anteriores) –
recorde-se que os patrões suportam uma taxa de 23,75% aplicada ao salário
bruto, enquanto aos empregados cabe outra fatia de 11%.
Há uma relação íntima entre o desempenho das contribuições sociais e o
mercado do trabalho e o INE dá conta dos dois fatores que ‘engordaram’ os
valores: subida dos salários e mais pessoas empregadas. “Este resultado
deveu-se ao crescimento das remunerações em 4,5%, refletindo o aumento do
emprego (o número total de indivíduos remunerados na ótica das contas nacionais
aumentou 0,8%) e da remuneração por trabalhador”.
O gabinete de estatísticas menciona ainda que também houve ganhos com
“as medidas de combate à fraude, nomeadamente, o controlo das declarações de
remunerações, num processo iniciado em 2016”.
Mesmo assim, em termos europeus, Portugal figura em sétimo lugar em
termos de peso das contribuições sociais no total da carga fiscal, com 28%,
inferior à média 31,6% registada para global dos estados-membros (o ranking diz
respeito à União a Europeia a 28, ainda com o Reino Unido que saiu a 31 de
janeiro de 2020).
RECEITA FISCAL RECORDE COM DOIS (VALENTES) EMPURRÕES
No total, os portugueses pagaram quase 74 mil milhões de euros de
impostos e contribuições (73 984 milhões de euros) no ano passado, o que
corresponde a 34,8% do Produto Interno Bruto (PIB) e que é um valor idêntico ao
registado em 2018. Trata-se de um novo recorde inscrito nas estatísticas do INE
(recuam até 1995), mas note-se que os dados do INE são ainda provisórios e
podem sofrer alterações.
São mais 4% em termos nominais, em linha com o crescimento da economia
nacional de 3,9%, incluindo inflação, dá conta o INE. Ou seja, as receitas
fiscais e o PIB cresceram a um ritmo idêntico o que justifica a manutenção de
uma carga fiscal de 34,8% - na União a 28 a taxa média foi de 39,4% e Portugal
é o décimo país com o menor peso dos impostos e contribuições na carga fiscal).
O crescimento em 2,8 mil milhões de euros da carga fiscal teve também o
empurrão do imposto sobre o valor acrescentado (IVA). Se do lado das
contribuições sociais vieram 1 471 milhões de euros, o IVA (que tributa o
consumo e é o grande motor das receitas fiscais) trouxe outros 963 milhões de
euros.
Em 2019, o IVA representou 57,9% das receitas obtidas com os impostos
indiretos e cresceu 5,4% (contra os 6,3% em 2018), totalizando 18,8 mil milhões
de euros. Este valor representa já 8,9% do PIB, uma percentagem também ela
historicamente elevada, pelo menos desde 1995.
O comportamento do consumo privado das famílias residentes é o fator que
mais influencia o IVA e, de acordo com o INE, este indicador cresceu 3,3% em
termos nominais. Do lado do consumo feito por não residentes em Portugal (são
sobretudo turistas) também veio uma preciosa ajuda (expandiu-se 8,1%).
Porém, em ambos os casos – contribuições para a segurança social e IVA
–, 2020 tem tudo para ser um ano de quebras abruptas por razões óbvias. O
mercado de trabalho vai encolher, a Segurança Social terá maiores gastos
(nomeadamente com medidas de ajuda à economia para mitigar o impacto da
covid-19, como o lay-off simplificado), as famílias terão menos rendimento (já
estão a travar nas compras não essenciais) e o turismo também irá tombar.
FAMÍLIAS PAGAM MAIS IRS E EMPRESAS MENOS IRC
Do lado dos impostos diretos, no caso da receita do imposto sobre o
rendimento de pessoas singulares (IRS) verificou-se um aumento de 2%, enquanto
a receita do imposto sobre o rendimento de pessoas coletivas (IRC) decresceu
2,9%. Ou seja, no IRS registou-se um acréscimo de 268 milhões de euros que foi
contrabalançado pela receita de IRC que diminuiu 187 milhões de euros.
Quanto à performance do IRS a explicação, segundo o INE, é de que, tal
como acontece com TSU, se trata de aumento explicado pelo comportamento
positivo dos vencimentos auferidos pelos empregados. “Adicionalmente, de acordo
com dados relativos à cobrança de impostos da Autoridade Tributária e
Aduaneira, registou-se um aumento do IRS cobrado aos rendimentos sobre as
pensões (4%)”.
Mas, em sentido contrário, o IRS cobrado aos rendimentos sobre
atividades empresariais e profissionais diminuiu 0,9% e a cobrança sobre
rendimentos de capitais provenientes de juros de depósitos diminuiu 20,7%,
“embora esta última componente tenha um peso relativo diminuto no total da
cobrança do IRS (em 2019 valia apenas 0,6% enquanto em 2016 o peso era de
2,5%).
Por sua vez, sobre o IRC, o INE detalha que a quebra de receita é fruto
de um decréscimo das autoliquidações deste imposto (verba a pagar na sequência
da entrega da declaração de IRC – Modelo 22) e dos pagamentos por conta (cuja
valor depende do IRC pago no ano anterior). Realidade a que não será alheio
também o fim da obrigatoriedade do pagamento especial por conta para muitas
empresas, que também terá contribuído “para esta evolução” (Expresso, texto dajornalista Ana Sofia Santos)
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