Acabou por ser aprovada por unanimidade, na terça-feira passada, a avaliação que já na véspera era pedida por 120 Estados-membros da Organização Mundial da Saúde (OMS). Alinhar vontades para avaliar o papel da organização de forma “imparcial, independente e completa” durante a pandemia de coronavírus tornou-se uma prioridade da Assembleia Mundial da Saúde (AMS), a grande reunião anual da organização das Nações Unidas responsável pela saúde pública. “Para ser verdadeiramente completa, essa avaliação deve incluir a resposta de todos os atores, de boa-fé. Iniciarei uma avaliação independente, o mais brevemente possível, para analisar a experiência que se ganhou, as lições aprendidas, e para fazer recomendações para melhorar a preparação e a resposta nacional e global à pandemia”, disse o diretor-geral, Tedros Adhanom Ghebreyesus, na abertura do primeiro de dois dias da 73ª Assembleia Mundial da OMS.
PEQUIM MANTÉM DONATIVO
A edição de 2020 teve pelo menos a sua forma determinada pela pandemia, uma vez que o encontro do início da semana se realizou pela primeira vez em streaming e não ao vivo, na cidade de Genebra, como acontece todos os anos. Depois, incluiu à cabeça na ordem dos trabalhos a moção, que foi esboçada pela União Europeia, para pedir uma “avaliação imparcial, independente e abrangente” da “resposta da saúde internacional à covid-19”.
A AMS tem o mandato de fazer atribuir responsabilidades e exigir dados concretos sobre a data do início do surto da covid-19 no epicentro em Wuhan, na província de Hubei, e sobre a velocidade a que se espalhou pelo mundo. Apesar de a China não ser citada como alvo da investigação inicialmente proposta pela Austrália, a diplomacia de Pequim reagiu prontamente. Isto não impediu o Presidente Xi Jinping de ter anunciado, no decorrer da AMS, um pacote no valor equivalente a €1850 milhões destinado a auxílio internacional no combate à covid-19, declarando que o país colaboraria na investigação assim que o surto estivesse controlado. Xi Jinping defendeu que a avaliação deve basear-se numa “atitude científica e profissional” e que “tem de ser liderada pela OMS”, para que sejam cumpridos “os princípios de objetividade e justiça”. Independentemente do que venha a saber-se ou não sobre o que aconteceu e quando aconteceu, o que está em causa é que “não acreditamos no que nos dizem as autoridades chinesas”, diz ao Expresso a investigadora Raquel Vaz Pinto, do Instituto Português de Relações Internacionais (Universidade Nova).
CIENTISTAS CENSURADOS
Vaz Pinto lembra ainda o controlo exercido sobre os cientistas chineses, que estão proibidos de publicar os seus artigos seja onde for sem passarem “pela censura do partido”, ou seja, o Partido Comunista Chinês (PCC). “A credibilidade do PCC está em jogo. Caso as conclusões da investigação venham a provar que há implicações políticas no facto de as autoridades não terem atuado devidamente a nível da província de Hubei, epicentro da pandemia, penso que os resultados nem virão a ser conhecidos”, conclui a investigadora. A OMS foi criticada pelo que foi descrito como uma postura deferencial em relação à China, elogiando a gestão pelo PCC daquilo que então era ainda um surto e desaconselhando a suspensão de viagens de e para a província de Hubei. A atitude pode ser justificada em parte pelo potencial que a China tem de ser um parceiro na gestão futura de disrupções na saúde global, incluindo pandemias (Expresso, texto da jornalista CRISTINA PERES)
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