"A Constituição da República
Portuguesa estipula que «o regime político-administrativo próprio dos
arquipélagos dos Açores e da Madeira fundamenta-se nas suas características
geográficas, económicas, sociais e culturais e nas históricas aspirações
autonomistas das populações insulares».
A
consagração das Autonomias na Lei Fundamental de 1976 foi o resultado de uma
luta de séculos dos povos insulares e a sua concretização, com a criação de
órgãos de Governo Próprio, permitiu aos madeirenses e aos açorianos assumirem
os seus destinos, nas últimas três décadas.
A Autonomia veio a revelar-se uma
das inovações mais profundas e bem sucedidas da estrutura do Estado Democrático
instituído pela Constituição. A Autonomia
possibilitou um novo desenvolvimento económico e social e a valorização das
Ilhas no quadro da Nação Portuguesa. Pese
embora todos os resultados positivos alcançados e dos aperfeiçoamentos do
sistema autonómico nas sucessivas revisões constitucionais, subsistem,
acrescidas razões para que hoje se reflicta sobre a necessidade de reformar o
quadro da Autonomia constitucional. A última revisão constitucional cingida
ao capítulo das Autonomias, foi encarada como uma oportunidade para ampliar os
poderes legislativos das Regiões. Assim, pôs-se fim aos conceitos de «interesse
especifico» e de «lei geral da República» e introduziu-se a ideia da
competência legislativa de «âmbito regional». A intenção do legislador foi
alargar os poderes dos Parlamentos Insulares estipulando que «A autonomia
legislativa das regiões autónomas incide sobre as matérias enunciadas no
respectivo estatuto político-administrativo que não estejam reservadas aos
órgãos de soberania» (n.º 1 do artigo 228º da C.R.P.).
A
verdade é que o «legislar no âmbito regional em matérias enunciadas no
respectivo estatuto político-administrativo e que não estejam reservadas aos
órgãos de soberania» (alínea a) do n.º 1 do artigo 227º da C.R.P.) veio a
revelar-se na prática limitador da capacidade legislativa das Regiões em
virtude da jurisprudência restritiva que sobre a matéria foi produzida pelos
órgãos de soberania e, em particular pelo Tribunal Constitucional. O objectivo
de aumentar a competência legislativa regional não foi cumprido, em parte,
porque não se procedeu, de forma clara, na Constituição e nos Estatutos, a uma
repartição de poderes entre o Estado e as Regiões Autónomas.
Assim, importa que na próxima
revisão da Constituição se clarifiquem os poderes legislativos das Regiões
Autónomas e a sua articulação com as matérias reservadas aos órgãos de
soberania por forma a evitar a permanente conflitualidade em torno desta
questão e a atingir os objectivos pretendidos com a revisão de 2004 de alargar
as competências da Madeira e dos Açores.
Importa
pois apresentar soluções para uma nova arquitectura do sistema autonómico que
permita, por um lado, aprofundar as competências legislativas dos Parlamentos
Regionais e tentar suprimir focos de conflito entre as Regiões e o Estado, bem
como introduzir mecanismos para um melhor funcionamento dos Direitos
Democráticos no sistema autonómico.
Acresce
que é necessário substituir o conceito de “federalismo financeiro” plasmado na
lei fundamental pela cooperação financeira, procurando que nos espaços
insulares portugueses sejam os cidadãos tratados de igual forma do que se passa
com o restante território nacional e as finanças regionais sejam efectivamente
olhadas como uma parte do sistema financeiro nacional. A óptica fundamental
deve ser a despesa e não tanto a receita e o quadro de serviços que o Estado
presta. Neste sentido procurou-se introduzir factores de correcção e de responsabilização
que vão no sentido obter um quadro financeiro mais equilibrado e equitativo
para as tarefas que as Regiões assumem em nome e em vez do Estado.
Este
projecto propõe oito grandes
alterações:
1 – Extinção do cargo de
Representante da República. Competências de regulação do sistema legislativo
regional passam para o Presidente da República.
2 – Aumento dos poderes
legislativos das Regiões Autónomas.
3- Alargamento das competências em
matéria fiscal.
4 – A necessidade dos Estatutos
político-administrativos, da Lei das Finanças Regionais e das Leis eleitorais
dos Açores e da Madeira terem de ser aprovadas por dois terços dos deputados
nas respectivas Assembleias Legislativas e na Assembleia da República.
5 – Extensão do regime de
incompatibilidades e impedimentos dos Deputados e Governo da República aos
Deputados regionais e membros dos Governos das Regiões Autónomas.
6 – Limite de 3 mandatos para todos
os cargos políticos executivos, eleitos ou nomeados.
7 – Possibilidade de açorianos e
madeirenses residentes fora das Regiões, votarem e serem eleitos para as
Assembleias Legislativas.
8 – A consagração de um novo princípio de garantia às Regiões Autónomas dos meios
financeiros necessários a assegurar aos cidadãos nela residentes as mesmas
prestações e serviços que o Estado assegura no restante território nacional, em
especial no domínio da educação, da saúde e da segurança social, assegurado por
um fundo de garantia de serviços públicos fundamentais;
Este
Projecto de revisão assume, conscientemente, que as modificações a introduzir
no regime autonómico afectam, também, os poderes e a própria estrutura
organizativa dos órgãos do Estado.
Quanto
aos poderes legislativos propõe-se
uma repartição clara das competências dos órgãos de soberania e das Regiões
Autónomas estipulando-se que às Assembleias Legislativas está apenas vedado o
poder de legislar sobre matérias que façam parte da reserva absoluta da
Assembleia da República e da competência exclusiva do Governo da República e,
ainda, outras que ficarem plasmadas na Lei Fundamental. Introduz-se, também, o
conceito de Lei Regional em substituição do Decreto Legislativo.
Em
matéria financeira prevê-se que o
relacionamento entre o Estado e as Regiões é estabelecido por uma Lei quadro
mas obedecendo aos princípios insertos nos Estatutos Político-administrativos e
aos novo quadro de relacionamento.
Finalmente,
consagra-se que a iniciativa de revisão dos Estatutos é da competência dos
Deputados das Assembleias Legislativas, que a sua aprovação é feita por maioria
de dois terços dos deputados nos dois Parlamentos e que a Assembleia da
República só possa rever as normas sobre as quais incide a proposta original
das Assembleias Insulares.
No
tocante à representação do Estado na Região e à regulação do processo legislativo
regional propõe-se a extinção do cargo
de Representante da República e atribuem-se os seus poderes de fiscalização
da constitucionalidade e legalidade da legislação regional ao Presidente da
Republica. Esta solução valorizaria as Assembleias Legislativas Regionais e as
Autonomias da Madeira e dos Açores.
Quanto
à Democracia propõe-se um
desenvolvimento do Principio da renovação (artigo 118º da C.R.P.) introduzindo
um limite de três mandatos para todos os
titulares de cargos políticos executivos, eleitos ou nomeados. Abre-se a
possibilidade de os madeirenses e açorianos residentes no território nacional e
no estrangeiro virem a votar e a serem eleitos nas eleições para as Assembleias
Legislativas nos termos a fixar pelas respectivas leis eleitorais.
Fixa-se,
ainda, que o Estatuto dos titulares de cargos políticos nacionais (Deputados e
membros do Governo) quanto a direitos,
deveres, impedimentos e incompatibilidades é aplicável aos Deputados das
Assembleias Legislativas e aos membros dos Governos Regionais, com as
necessárias adaptações a definir nos Estatutos Político-administrativos.
Admitindo
que em matéria constitucional as soluções são as mais variadas e que não há
medidas perfeitas e definitivas, importa, por isso, reflectir, ponderadamente, sobre
todas as propostas de alteração ao regime autonómico actual e, tentar, chegar a
um sistema que possibilite esbater as conflitualidades existentes e abrir caminho à evolução das Autonomias num
quadro de unidade nacional e de reforço dos laços de solidariedade entre todos
os portugueses e a uma melhor Democracia nos sistemas autonómicos".