Juízes do
tribunal constitucional alemão defendem o seu direito a emitirem sentenças
sobre o BCE e dizem que a abertura de um processo contra a Alemanha lançaria a
UE num conflito constitucional difícil de resolver. Criticados por vários
líderes europeus e com a presidente da Comissão Europeia a ameaçar levar o
problema a tribunal, os responsáveis do tribunal constitucional alemão decidiram
jogar ao ataque com duas raras entrevistas a meios de comunicação social em que
avisam que procedimentos contra as suas decisões lançariam a UE para “um
conflito constitucional difícil de resolver”. As entrevistas
dos juízes do tribunal constitucional alemão Peter Huber e Andreas Voskuhle aos
jornais Frankfurter Allgemeine Zeitung e Die Zeit, publicadas no final do dia
desta quarta-feira, mostram que este órgão não está disposto a abdicar da
posição assumida recentemente contra o programa de compra de dívidas que tem
vindo a ser implementado pelo Banco Central Europeu (BCE).
Contrariando uma
sentença sobre o mesmo assunto que tinha sido emitida antes pelo Tribunal de
Justiça da UE, o tribunal constitucional alemão considerou na semana passada
que o BCE está a ir para além do seu mandato com as compras de dívida que tem
realizado e exigiu à autoridade monetária explicações no prazo de três meses, caso
contrário o banco central alemão teria de deixar de participar no programa de
compras.
Esta decisão
provocou reacções negativas em vários pontos da UE, incluindo na Alemanha. Do
lado do BCE, a presidente Christine Lagarde disse-se “irredutível”, lembrando
que o banco central está apenas sob a jurisdição do Tribunal de Justiça da UE.
Este ponto foi salientado pelo próprio tribunal europeu em comunicado e foi
também o argumento invocado pela presidente da Comissão Europeia para estar a
ponderar a abertura de um processo de infracção contra a Alemanha por causa da
acção de seu tribunal constitucional. “A última palavra no que diz respeito à
lei da UE é sempre dita no Luxemburgo [onde está situada a sede do Tribunal de
Justiça Europeu]. Em mais lado nenhum”, afirmou Ursula von der Leyen.
Os responsáveis
do tribunal constitucional alemão, contudo, não se deixam intimidar. “Falsa”, é
como Peter Huber classifica esta declaração da presidente da Comissão Europeia,
dizendo que “a sugestão de que a lei europeia tem precedência absoluta não é
compatível com a Constituição alemã”. E deixa um aviso: “A abertura de um
procedimento por infracção [por parte da Comissão Europeia] desencadearia uma
escalada considerável que lançaria a Alemanha e outros Estados-membros num
conflito constitucional que seria difícil de resolver.” “No longo prazo, isso
enfraqueceria ou poria em perigo a UE”, disse.
Foi precisamente
de pôr em risco a UE que o tribunal constitucional alemão foi acusado em várias
capitais, incluindo Berlim, nomeadamente por dar argumentos com a sua decisão a
que países como a Polónia ou a Hungria, que estão em conflito com a UE por
questões relacionadas com o Estado de direito, não considerem válidas sentenças
do Tribunal de Justiça europeu.
Os responsáveis
do tribunal constitucional alemão não concordam. “Estamos convencidos de que
esta decisão é boa para a Europa porque reforça a ligação à lei e iremos ver
isso no médio e longo prazo”, defende Andreas Voskuhle, na sua entrevista. Em Berlim, Angela
Merkel parece apostada em precisamente evitar uma escalada do conflito legal,
tendo mostrado esperança que tudo se possa resolver dentro da Alemanha, com o
banco central alemão a servir de intermediário entre o tribunal constitucional
e o BCE, que se recusa a aceitar a jurisdição de um tribunal nacional. “O
objectivo agora é agir de forma responsável e inteligente para garantir que o
euro possa continuar a existir, o que deve e irá acontecer”, afirmou a
chanceler nesta quarta-feira (Publico, texto do jornalista Sérgio Aníbal)
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