Nascida em Chaves, licenciada em Vila Real, foi nos Açores que Maria João Sousa encontrou condições para fazer o que sempre sonhou: ser professora, e ser respeitada por isso. Mil vezes pensou em desistir. O saltar de ilha em ilha, a casa a tiracolo, os dois filhos, ainda crianças, a mudar de escola todos os anos. Faial primeiro. Depois São Miguel. Terceira, no ano seguinte. A família sempre longe, o marido. Um mar de distância a separá-los. A saudade esticada pelo Atlântico e pelos montes e montanhas até Chaves.
Nunca teve medo do trabalho e mil vezes pensou fazer outra coisa. O bom ordenado, a estabilidade da carreira, o respeito da profissão. Tudo ingenuidades que ficaram lá trás quando Maria João Sousa terminou a licenciatura em Educação Básica na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro.
A primeira paragem, com o canudo ainda fresco na mala e uma montanha de ilusões na alma, foi o pequeno Centro Escolar Viatodos. Ali, a meio caminho entre Famalicão e Barcelos. Foi bem recebida. A escola era simpática e os alunos educados. Mas e o futuro? O ano seguinte.
Maria João Sousa tinha 26 anos. Sabia que fosse qual fosse a escola a que concorresse, seria a mais nova, em idade e em tempo de serviço. Sabia que tamanha juventude, significava arriscar um ano de horários zero, turmas de substituição. Enfim, o que sobrasse. Falou com o marido, com o resto da família em Chaves, e aventurou-se para os Açores.
“A ideia era vir um ano para os Açores para fazer tempo de serviço, mas as coisas começaram a complicar-se no continente e eu fui ficando”, recorda ao PÚBLICO. Antes de Angra do Heroísmo, onde esteve nos últimos 12 anos, aterrou no Faial. No ano seguinte, mudou-se para São Miguel, e depois finalmente para a Terceira. Os filhos sempre atrás, o marido sempre longe. “Foi muito difícil. Para mim, para eles, para todos.”
Aos 41 anos, 15 de docência e já com o marido a trabalhar nos Açores, Maria João Sousa diz que valeu a pena. Que não se arrepende. Não vai tão longe em chamar “paraíso” aos Açores, mas para os docentes, olhando para o panorama do país, é uma espécie de “purgatório”.
Na região autónoma, refere a professora do 1.º ciclo que ficou efectiva há oito anos na Escola Básica e Secundária Tomás de Borba, a carreira docente é horizontal. Não há quotas de acesso, nem aulas observadas para subir ao 3.º escalão.
“Aqui encontrei estabilidade profissional e familiar. Os professores ainda são respeitados nos Açores”, diz, acrescentando que por via da carga fiscal mais reduzida o salário líquido é mais elevado, quando comparado com o continente e a Madeira.
No recibo de Maria João Sousa sempre esteve o 1.º escalão. O valor bruto é de 1.518€, e à conta bancária chegam pouco mais de 1.200 euros.
Com o anunciado descongelamento integral do tempo de serviço – nos Açores os professores já recuperaram dois anos, dois meses e dois dias, metade em 2008 e a outra metade em 2009 –, esse valor vai subir. Maria João Sousa já fez as contas. Em Junho do próximo ano, sobe para o 2.º escalão. “São mais 180 euros na conta.” Em 2020, nova progressão, agora para 1.864€ brutos mensais.
Nos Açores, a reposição do tempo de serviço começa em Janeiro e será feita de forma faseada, ao longo de seis anos. “Queríamos que fosse mais rápido, mas já é uma vitória. Uma boa vitória.” (texto do jornalista e correspondente do Público no Funchal, MÁRCIO BERENGUER)
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