Marcelo Rebelo de
Sousa colocou há dias o dedo na ferida, quando falou da comunicação social, do
preente e do futuro, sobretudo do futuro. Acho que o PR - jornalista com larga
experiência, desde os primórdios do Expresso - sabe melhor do que ninguém o que
se passa e sabe que o fundamentalismo político e as posturas partidárias
radicalizadas estão a destruir um dos suportes de qualquer democracia. Um
regime político de liberdade, uma democracia parlamentar, só existem com uma
comunicação social pujante, isenta e com condições de afirmação na sociedade. Se a comunicação social se
fragiliza, se os meios de comunicação deixam de ter condições para
desempenharem a sua função, se os jornalistas se sentem ameaçados peça precariedade
e por constrangimentos intoleráveis, obviamente que passamos a ter uma
comunicação social vulnerabilizada e facilmente cedente aos apetites mais
vorazes de grupos de pressão, regra geral económicos e financeiros, que depois
acabam por usar os meios de comunicação social onde metem as patas como
instrumentos ao serviço das suas estratégias e de defesa dos seus interesses,
sempre contra alguém.
O problema de MRS
- que teve o mérito de colocar a sociedade a discutir o assunto e de contribuir
para que os meios de informação percam a vergonha de assumirem uma realidade
que dificilmente pode ser escondida por muito penosa que ela seja - é que a
gravidade da situação não poupa nem os meios de comunicação social do Estado.
Ou seja, não sei até que ponto o estado está hoje interessado em perder tempo
com a comunicação social, sobretudo quando ela incomoda, tal como não sei qual
será, de facto, o futuro da imprensa, quando vemos empresas que sempre foram
poderosas no sector da impressão - veja-se o caso da Lisgráfica que tentou
evitar a falência, esforço que parece estar a esbarrar com o insucesso por
conta do persistente acumular de significativos passivos mensais - estarem agora
irremediavelmente condenadas, sofrendo os efeitos de uma acentuada queda das
tiragens dos jornais e revistas.
Há que ter
presente que não podemos esperar que gastem recursos financeiros para apoiar
jornais com tiragens insignificantes, jornais que praticamente niguém lê. Tal
como não podemos admitir como plausível que apoiem empresas que foram exemplo
de má gestão, que ruíram por culpa própria, que nunca investiram, que nunca se
modernizaram, etc. Há limites para tudo neste domínio. Envolver o estado em projectos
falhados é uma coisa, envolver o estado em projectos de comunicação social com
potencialidades de sucesso é outra.
Sobre isto, dou-vos um exemplo, bem recente, sobre as contradições que
muitas vezes geram instabilidade no sector e fomentam discussões bem acaloradas
sobre os limites do sensacionalismo “versus” audiências e/ou vendas, bem como um
eventual conflito de interesses entre a deontologia e a especulação assente numa alegada fiabilidade de fontes
de informação que não garantem plena segurança nem impedem desmentidos. Toda a gente de insurge contra o
facto da CMTV e do Correio da Manhã divulgarem audios de interrogatórios na justiça
feitos a indivíduos ligados ao processo do Sporting
(Alcochete) e do Benfica (e-toupeira). Curiosamente acabou por ser a RTP a entrar na onda e a divulgar os
audios do interrogatório feito a Bruno de Carvalho...
O que é facto é que a situação é de
tal modo grave que não há mais espaço para teorizar sobre um tema demasiado
sério e que exige medidas concretas e rápidas, ou para discussões idiotas
assentes em pressupostos de outros tempos, que deixaram de fazer sentido numa
lógica de sociedade de comunicação dos nossos dias, onde o primado das redes
sociais é obviamente destruidor de muitos mitos e chavões feitos, e onde o
objectivo das empresas de comunicação social é sobretudo o de garantir o
pagamento de salários e endividar-se o mínimo possível.
O Estado no sector
É sabido que o
Estado tem directamente responsabilidades na RTP (100% do capital da empresa) e
na agência Lusa de Informação (50,14%).
A estrutura da
agência Lusa, nomeadamente o envolvimento de privados, decorre do processo de
fusão das antigas agências ANOP (estatal) e Notícias de Portugal (privada) que
deram origem à Agência Lusa, hoje com um capital social de 5,3 milhões de euro,
2,6 milhões de euros detidos pelo estado, 1,2 milhões de euros pelo grupo Global
Media, sensivelmente o mesmo valor que possui a Impresa (Expresso e SIC), mais
145 mil euros da antiga NP, 73.200 euros do Público, 1.600 euros da RTP, 775
euros do jornal Primeiro de Janeiro e 562 euros do Diário do Minho de Braga.
Já a RTP tem um
capital social detido integralmente pelo Estado de 1.432.773.340,00 euros.
Os órgãos sociais
da RTP são o Conselho de Opinião, o Conselho Fiscal, o Conselho de
Administração e o Conselho Geral Independente.
O que se passa na RTP chega a ser patético porque o
Estado assume uma posição de dívida permanente tentando manter-se ao mesmo
tempo nas das margens do rio.
A empresa atravessa dificuldades financeiras que em
2018 se agravaram com os resultados da cobertura do Mundial de futebol e do
Eurofestival da Canção. Os 16 milhões reclamados pela RTP ao Estado-patrão, por conta de uma aumento de
capital antes aprovado - operação já aprovada pela Comissão Europeia, há 2 ou 3
anos - continua adiada e uma proposta de financiamento de 8 milhões apresentada
pelo CDS no âmbito do OE-2019, parece que não passou. Digo que parece porque
oficialmente os membros do Conselho de Opinião não sabem rigorosamente nada do
que se passa.
Sabemos que existe uma grande instabilidade interna,
que há trabalhadores desiludidos e desmotivados, que há imensas carências
técnicas que colocam em causa a eficácia do serviço, que há reivindicações salariais com origem nas estruturas sindicais que podem agravar-se e lançar a
empresa numa paralisação que nada vai resolver, há situações internas de
precariedade por resolver, embora não se possa generalizar dado que
alegadamente parecem co-existir situações de oportunismo entre alguns dos
precários que alegadamente aguardam resolução da sua situação, sobretudo
indivíduos que nada têm a ver com a empresa, já que prestam serviços a
prestadores de serviços contratados pela RTP a que se juntam, alegadamente,
antigos trabalhadores que terão abandonado a empresa mas que voltaram a
colaborar com ela, indirectamente, por via de empresas prestadoras de serviços
a quem a RTP recorre. Situações pouco claras que não sabemos ao certo se
correspondem ou não à realidade.
Depois surgiu a crise com a DI, depois da nova titular
da informação ter contratado no exterior duas jornalistas - de reconhecida
experiência - mas que não foi suficientemente capaz de convencer que os
problemas da RTP, que continua em termos de audiências numa posição fragilizada,
têm a ver com a informação e não com o entretenimento ou outra programação da
grelha.
Esta decisão de Flor Pedroso gerou mais polémica
depois da especulação em torno dos salários que seriam pagos pela RTP às duas
contratadas, contrastando com as exigências sindicais de aumentos que nunca
terão sido aprovados pela empresa. A ERC, entidade reguladora para o sector, também contribuiu para especulação ao pedir mais informações sobre este
processo e as escolhas feitas, repetindo o que se passou há uns meses com outro
processo de nomeações, também na área de informação, que igualmente passou por
algumas hesitações.
Ora o que se espera, e deseja, é que usando os
mecanismos internos de informação a RTP, seja através de quem for, informe os
membros dos seus órgãos sociais - pelo menos enquanto eles existirem - do que
se passa, evitando que eles fiquem dependentes das especulações publicadas na
comunicação social, particularmente no Correio da Manhã que para além de bem
informado sobre a RTP e o que lá se passa, de quando em vez, como parte obviamente interessada, distorce a realidade com base em fontes de informação
que depois são timidamente desmentidas, sem a convicção que não impede a
persistência da dúvida sobre de que lado estará a razão.
A RTP - que Passos Coelho empenhada e insistentemente
tentou vender ao desbarato como o fez com outras empresas públicas através dos
quais tivemos uma invasão de capitalistas estrangeiros que hoje controlam
sectores vitais da economia, permitindo por exemplo, agora com a cumplicidade
da geringonça de esquerda (?), a bandalheira institucional na TAP e o facto de Portugal ter uma das tarifas
energéticas mais elevadas da Europa - continua a viver essa indefinição, já que
o Estado parece continuar a ser,
timidamente, o dono da RTP, apesar de ser primeiro a querer colocar-se fora
dela e a não cumprir as suas obrigações de accionista, para que o chamado
"serviço público" de televisão (cada vez mais um conceito vago,algo
obsoleto e onde parece caber tudo por conveniência - por exemplo duvido que as
transmissões televisivas de touradas sejam consideradas como parte desse
serviço público, apesar de desconhecer os níveis de audiência e os ganhos
comerciais para a empresa decorrentes dessa opção estratégica em termos de entretenimento) corresponda ao que as pessoas esperam e
exigem.
E o COP para que serve afinal?
Eu faço parte, por
indicação da Assembleia Legislativa da Madeira, do Conselho de Opinião da RTP.
Admito que o presidente deste órgão seja informado do que se passa. No meu caso,
e relativamente a esta sucessão de
fatos, desconheço em absoluto o que se passou e se passa.
A Lei n.º 33/2003,
de 22 de Agosto, enumera as competências do Conselho de Opinião no seu artigo 6º:
“1 — A Rádio e
Televisão de Portugal, SGPS, S. A., dispõe ainda de um Conselho de Opinião,
composto maioritariamente por membros indicados por associações e outras
entidades representativas dos diferentes setores da opinião pública, nos termos
previstos nos respetivos estatutos.
2 — Compete ao
Conselho de Opinião:
a) Dar parecer
sobre os contratos de concessão de serviço público de televisão e de
radiodifusão e os planos e bases gerais da atividade das sociedades
participadas que explorem os serviços de programas integrados nos mencionados
serviços públicos;
b) Pronunciar-se
sobre quaisquer outras questões que lhe devam ser submetidas nos termos dos
estatutos”.
Acrescente ainda o
artigo 22.º que “compete ao Conselho de Opinião:
a) Apreciar os
planos de atividade e orçamento relativos ao ano seguinte, bem como os planos
plurianuais da sociedade e das sociedades participadas que explorem os serviços
de programas integrados nos serviços públicos de televisão e de radiodifusão;
b) Apreciar o
relatório e contas;
c) Pronunciar-se
sobre a atividade das sociedades participadas que explorem os serviços de
programas integrados nos serviços públicos de televisão e de radiodifusão, relativamente
às bases gerais da programação e aos planos de investimento;
d) Apreciar a
atividade da empresa no âmbito da cooperação com os países de expressão
portuguesa e do apoio às comunidades portuguesas no estrangeiro;
e) Emitir parecer
sobre os contratos de concessão a celebrar com o Estado, designadamente quanto
à qualificação das missões de serviço público;
f) Eleger, de
entre os seus membros, o presidente;
g) Pronunciar-se
sobre quaisquer assuntos que os órgãos sociais entendam submeter-lhe a parecer”.
Um dia destes lá
vamos nós para reuniões em Lisboa destinadas a cumprir formalidades que questionam
o que afinal andamos por lá a fazer. Reuniões para emitir pareceres sobre
o Orçamento e Plano de Investimentos da
RTP para 2019 – sem que previamente o Conselho de Administração compareça para
dar esclarecimentos sobre as opções constantes dos documentos e poder responder
ao que os membros do COP entendam suscitar. Não tarda muito lá vamos para um
reunião qualquer em Lisboa destinada a elaborar e aprovar o relatório sobre as
Contas reportadas a 2018, sem que, por exemplo, o Presidente do CA se tenha
dignado responder e uma conjunto de questões que lhe coloquei, através do
Presidente do Conselho de Opinião, já lá vão alguns meses. Em linguagem bem
popular diria que o Presidente o CA borrifou-se literalmente para o
assunto, mantendo a sobranceria arrogante do costume, e que lhe tem valido para
sobreviver no lugar, desde que foi nomeado por Passos, inclusivamente tendo
sido o único sobrevivente da razia operada no último CA da RTP.
Ou seja, temo que o COP acabe por cumprir formalidades, repetir rotinas, disfarçar que não existe uma realidade que temos que acompanhar bem mais de perto e devidamente informados, em vez de nos refugiarmos no cumprimento de obrigações legais que não podem ser dissociadas de tudo o que se passa numa empresa com a importância e relevância da RTP. De facto, há entidades que parece que só existem para fingir que servem para alguma coisa, gerando o risco das pessoas que se deslumbrarem - quando são apenas os portadores da chave da arrecadação da cave da sub-cave - ou de acreditarem que são absolutamente desnecessárias num contexto empresarial que é mais complexo do que aparenta. Não podemos deixar que a RTP mergulhe - só porque isso foi conveniente para determinados políticos num determinado período, depois de frustrado o sonho de venda da empresa... - num emaranhado de organismos internos que se cruzam, com competências que esquertejam o poder e o dividem por várias capelinhas, para que todos continuem a ser insignificantes em detrimento de quem realmente tem o poder na empresa ou de quem fora dela tem um poder de decisão condicionador, o poder. O poder ilusoriamente "afastado"... (LFM)
Ou seja, temo que o COP acabe por cumprir formalidades, repetir rotinas, disfarçar que não existe uma realidade que temos que acompanhar bem mais de perto e devidamente informados, em vez de nos refugiarmos no cumprimento de obrigações legais que não podem ser dissociadas de tudo o que se passa numa empresa com a importância e relevância da RTP. De facto, há entidades que parece que só existem para fingir que servem para alguma coisa, gerando o risco das pessoas que se deslumbrarem - quando são apenas os portadores da chave da arrecadação da cave da sub-cave - ou de acreditarem que são absolutamente desnecessárias num contexto empresarial que é mais complexo do que aparenta. Não podemos deixar que a RTP mergulhe - só porque isso foi conveniente para determinados políticos num determinado período, depois de frustrado o sonho de venda da empresa... - num emaranhado de organismos internos que se cruzam, com competências que esquertejam o poder e o dividem por várias capelinhas, para que todos continuem a ser insignificantes em detrimento de quem realmente tem o poder na empresa ou de quem fora dela tem um poder de decisão condicionador, o poder. O poder ilusoriamente "afastado"... (LFM)
Sem comentários:
Enviar um comentário