segunda-feira, outubro 01, 2018

Opinião: Roubini prevê próxima crise financeira e recessão global em 2020

Numa coluna de opinião assinada por Nouriel Roubini e Brunello Rosa no Financial Times, os dois economistas dizem que o cenário para a próxima crise financeira já está a fermentar. Os economistas Nouriel Roubini e Brunello Rosa, co-fundadores da consultora Rosa & Roubini Associates, advertem num artigo de opinião hoje publicado no Financial Times para o risco de estar a fermentar uma nova crise financeira e recessão global que poderão tomar forma em 2020. Num artigo para assinalar os 10 anos da falência do Lehman Brothers, as advertências são várias e os autores antecipam que os mercados se confrontem com condições muito mais duras à medida que a economia mundial vá desacelerando.
"Numa altura em que assinalamos os 10 anos da crise financeira mundial, têm surgido inúmeros post-mortens que analisam as suas causas e consequências e que se questionam sobre se aprendemos as necessárias lições", referem. Por isso, acrescentam, "este parece ser um momento pertinente para perguntar quando – e porquê – ocorrerá a próxima recessão e crise financeira". E ambos apontam para 2020 como o ano em que isso poderá suceder. "A expansão global deverá continuar este ano e no próximo – porque os EUA estão a apresentar grandes défices orçamentais, a China prossegue as suas políticas de estímulo e a Europa mantém-se na vida da recuperação. No entanto, existem várias razões pelas quais poderão surgir as condições para uma recessão mundial e crise financeira em 2020", salientam.

Para começar, dizem, não só os actuais estímulos económicos nos EUA terão terminado em 2020 como também se espera um constrangimento orçamental que baixará o ritmo de crescimento do país para menos de 2%. Por outro lado, "uma vez que os estímulos orçamentais nos EUA foram inoportunos, a Reserva Federal norte-americana terá de continuar a subir os juros directores, que deverão ascender a 3,5% em inícios de 2020", consideram Roubini e Rosa. Além da Fed, é provável que outros bancos centrais dêem início a – ou prossigam – medidas de normalização da política monetária, apontam.
Os dois economistas falam ainda sobre as fricções comerciais dos EUA com a China, Europa e os seus parceiros do NAFTA [México e Canadá], que dizem serem sintomas de uma rivalidade muito mais profunda do que aquilo que aparentam – no sentido de se determinar a liderança global nas tecnologias do futuro – e cujo efeito será o de abrandar o crescimento e aumentar a inflação. Roubini e Rosa aludem ainda a outras políticas levadas actualmente a cabo nos Estados Unidos e que irão redundar num enfraquecimento da expansão económica e numa subida dos preços no consumidor. Entre elas estão o controlo sobre o investimento directo estrangeiro e sobre a transferência de tecnologias [que perturbam as cadeias de abastecimento], bem como as restrições à migração numa altura em que a população está a envelhecer.
No resto do mundo, a expansão ficará debilitada por outras razões, destacam. A China irá ser lenta a lidar com a sobrecapacidade e o endividamento excessivo, ao passo que os mercados emergentes [muitos deles já frágeis] serão ainda mais penalizados pela valorização do dólar, pela redução dos preços das matérias-primas e por uma China menos fervilhante, consideram. E apesar de a Europa já ter perdido algum impulso, o intensificar das tensões comerciais e o fim das políticas de estímulo não-convencionais do Banco Central Europeu são factores que significam que em 2020 terá perdido ainda mais ímpeto.
Recorde-se que Roubini previu a bolha nos preços das casas nos EUA antes do pico neste mercado em 2006. Mas as suas previsões nem sempre foram certeiras, como sublinhou recentemente a Bloomberg, lembrando que quando o índice S&P 500 caiu para um mínimo de 12 anos a 9 de Março de 2009, Roubini disse que provavelmente o índice cairia para 600 pontos ou menos até ao final do ano. Em vez disso, o Standard & Poor’s 500 ganhou 65% no resto de 2009.
Activos sobreavaliados
Os dois autores chamam também a atenção para os preços dos activos. "A maioria está efervescente, se não mesmo em território de bolha". As bolsas norte-americanas e do resto do mundo estão caras, consideram. Isso é sobretudo evidente nos EUA, onde os PER [rácio cotação/lucro por acção] estão 50% acima das médias históricas, assinalam. Roubini e Rosa advertem igualmente para outros mercados que estão a fervilhar em todo o mundo e a tornarem-se muito caros, como é o da concessão de crédito e do imobiliário – tanto comercial como residencial. "Por outro lado, os activos dos mercados emergentes já corrigiram, conforme se pode observar no ‘bear market’ das bolsas. Mas a correcção, incluindo nas matérias-primas e obrigações, irá continuar", sublinham no artigo de opinião no FT. Assim, os investidores que antecipam um abrandamento para 2020 vão começar a atribuir novos preços aos activos de risco a partir de meados de 2019, antecipam ambos os economistas. Atendendo às alterações na estrutura dos mercados desde a crise financeira, assim que ocorra uma correcção o risco de falta de liquidez e de venda em massa de acções torna-se mais severo, referem.
As políticas de Trump
Os dois economistas debruçam-se ainda sobre a política da Casa Branca, que é mais um factor de pressão. "Donald Trump já está a atacar a Fed e temos o crescimento económico acima dos 4%, O que fará ele em 2020, que é ano de eleições, quando o crescimento estagnar abaixo de 1% e o desemprego começar a aumentar?". Roubini e Rosa respondem à sua própria pergunta: "haverá a tentação de criar uma crise de política externa. (…) Uma vez que Trump já deu início a uma guerra comercial com a China e não pode atacar uma Coreia do Norte com capacidades de resposta nuclear, o único alvo viável será provocar um confronto militar com o Irão. E isso irá desencadear um choque geopolítico com características de ‘estagdeflação’ [crescimento anémico e baixa inflação], tal como aconteceu em 1973, 1979 e 1990, levando a fortes subidas dos preços do petróleo". Por último, assim que esta tempestade perfeita ocorra em 2020, as ferramentas disponíveis para os responsáveis pela tomada de decisões estarão restringidas. "A política orçamental estará a ser penalizada pelas maiores dívidas públicas, mas o regresso às políticas monetárias não-convencionais poderá ser frustrado pelos balanços gigantescos dos bancos centrais", apontam. E os resgates, por seu lado, enfrentarão um cenário de espírito populista, bem como países menos solventes". Roubini e Rosa terminam com um alerta: "ao contrário do que aconteceu há 10 anos, assim que se dê a próxima contracção económica e financeira, as ferramentas políticas disponíveis para reverter a situação irão, muito provavelmente, ser menos eficazes (Jornal de Negócios)

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