
Num momento de aperto orçamental, manter uma zona franca na Madeira não é injustificável?
O que é que tem a ver a Zona Franca ou Centro Internacional de Negócios da Madeira com o aperto orçamental? O CINM é um instrumento de desenvolvimento regional, adequado às condições particulares da pequena economia insular da Madeira e, como tal, devidamente autorizado pela Comissão Europeia. Quanto maiores as dificuldades económicas do País, tanto maior a necessidade de bom funcionamento de um mecanismo que, com total legitimidade, ajuda a vencê-las.
O Governo estima a despesa fiscal com a ZFM em mil milhões de euros. Não é um preço demasiado elevado para o País?
Seria, se fosse uma despesa fiscal real. No entanto, como qualquer pessoa minimamente informada percebe, trata-se de um conceito virtual, ou seja, o que as empresas do CINM deixam de pagar em IRC por não se lhes aplicar a taxa normal. Mas se se lhes aplicasse a taxa normal, não estariam em Portugal. Logo, aquela alegada despesa fiscal, de facto, nunca seria cobrável. Isto mesmo foi formalmente reconhecido pelas Autoridades Portuguesas perante a Comissão Europeia no decurso do processo negocial cancelado em 2010.
De acordo com dados do Ministério das Finanças, 2.435 empresas da ZFM não tinham trabalhadores.Qual é, então, o benefício para a região de ter uma Zona Franca?
A ZFM, ou CINM, não é, nem nunca foi, um sistema para criação de emprego imediato. Nos termos da autorização comunitária, as empresas licenciadas até 2000 não tinham obrigação de criar emprego. No entanto, tiveram um fortíssimo impacto pela contratação na Madeira dos mais variadíssimos tipos de serviços, por exemplo de gestão, contabilidade e advocacia. As estatísticas da DGCI, tal como publicadas, são enganadoras por retratarem apenas aspectos muito parcelares da realidade.
Quantos empregos estão criados pela existência da ZFM?
Actualmente cerca de 2.900, usando os critérios aceites pela União Europeia, ou seja, tomando os empregos directos (cerca de 1.700) mais um emprego indirecto por cada emprego directo nas actividades de serviços.
Qual o montante de impostos arrecadados pelo Governo regional e quanto vai receber a partir de 2012?
As empresas licenciadas até 2000 (hoje, ainda, a grande maioria) tinham isenção total de IRC. Salvo quanto aos outros impostos resultantes da actividade, por exemplo IVA e IRS, o seu contributo fiscal anual era assumidamente reduzido. Mas se for possível manter essas empresas na Madeira a partir de 2012 e com o mesmo nível de actividade, passando todas a ser sujeitas a IRC com taxas reduzidas de 4% e 5%, os valores pagos anualmente, apenas em IRC, terão um acréscimo de mais de 80 milhões de euros. À escala regional, é um contributo valiosíssimo.
As regras de tributação mudam a partir de 31 de Dezembro. Que impacto é que essas alterações vão ter?
Um fortíssimo impacto positivo no Orçamento Regional, caso seja possível conservar as empresas que, por terem sido licenciadas até 2000, não estão sujeitas a IRC até 2011. Infelizmente, tal manutenção está muitíssimo ameaçada, não por ser introduzida tributação em IRC às taxas de, sucessivamente, 4% e 5%, mas sim pela fixação de limites máximos à matéria colectável que beneficia daquelas taxas reduzidas ("plafonds"), em termos totalmente incompatíveis com o que ocorre nas praças europeias, bem-sucedidas, com que o CINM tem de competir.
Já há casos concretos de empresas que vão sair da Zona Franca e mais concretamente na Madeira por causa disso? Com que impacto?
Infelizmente sim. O volte-face do Governo da República, rompendo em 2010 as negociações que tinha desencadeado em 2009 com a Comissão Europeia para corrigir aquela situação aberrante, mantendo a desvantagem competitiva do CINM, criou graves expectativas negativas junto de grandes empresários estrangeiros com operações no CINM, levando-os a decidir iniciar deslocalizações para jurisdições europeias que, evidentemente, defendem inteligentemente os seus interesses e não se autopenalizam com qualquer disposição equivalente à dos "plafonds".
O que pretende a SDM que se negoceie com prioridade em Bruxelas?
Que o próximo Governo, qualquer que ele seja, retome imediatamente as negociações injustificadamente rompidas pelo actual, a partir do ponto em que já se encontravam, ou seja, na sua fase final. Só assim será possível travar o actual movimento de saída de empresas, com criação de desemprego e perda de receitas fiscais, estas, sim, bem reais.
A que atribuem a suspensão das negociações em Bruxelas por parte do Governo português?
Não conhecemos as razões reais para uma atitude que, objectivamente, foi gratuita e só provocou prejuízos ao País e à Madeira, sem qualquer compensação. As poucas e frágeis explicações dadas pelo Ministério das Finanças são totalmente contraditadas pelas posições que as autoridades portuguesas tinham, anteriormente, assumido formalmente junto da Comissão Europeia.
Considera que Bruxelas iria aceitar negociar "plafonds" novos?
Bruxelas estava já a negociar, de facto, uma nova e menos penalizadora estrutura de "plafonds".
Como podem garantir que o fim da Zona Franca iria levar à saída de empresas da Madeira?
Não é necessário o fim do CINM para que as que empresas nele licenciadas saiam da Madeira: basta que não se lhes assegure condições equivalentes às das praças internacionais concorrentes. Os empresários que internacionalizam as suas operações escolhem racionalmente as jurisdições em que se instalam, em função de critérios objectivos. Para mantê-los na Madeira, e congregar outros, não chegam discursos atraentes: é preciso agir com eficácia, de acordo com as exigências da competição internacional. E, de resto, as empresas já estão a sair, por força do impasse criado.
Por que não divulgam, como requerido pelo Ministério das Finanças, os dados relativos às empresas na ZFM?
Ao contrário do que a pergunta sustenta, a SDM fornece anual e pontualmente todos os dados que, legalmente, devem ser prestados. Mas fá-lo a quem de direito no contexto da regionalização dos serviços da Administração Fiscal, ou seja, ao Governo Regional da Madeira.
Não há falta de transparência na divulgação de informação da ZFM?
Não. Nenhuma.
A ZFM não propicia esquemas de fuga ao fisco?
A ZFM está totalmente integrada na ordem jurídica nacional e comunitária. As empresas instaladas estão sujeitas exactamente às mesmas obrigações declarativas e aos mesmos mecanismos de supervisão, controle e fiscalização. Como tal, a prática de irregularidades tem as mesmas condições e probabilidades de sucesso que em qualquer outra região do País. A presunção de existência de normas de excepção e de menor regulamentação, que de todo não corresponde à verdade, é outro dos grandes equívocos que tem contribuído para avaliações negativas sobre o regime do CINM.
O facto de a Madeira ter um IVA mais baixo não é suficiente para fixar empresas na região, nomeadamente as de comércio electrónico?
Uma taxa de IVA mais baixa ajudaria, e, de facto, ajudou no passado, a atrair empresas na área do comércio electrónico. O problema é que há quem tenha hoje taxas mais baixas, como o Luxemburgo. E se, em condições de fiscalidade idêntica, já é difícil competir com esta jurisdição pelo conjunto vastíssimo de outras vantagens, então, com taxas superiores, a dificuldade converte-se em quase impossibilidade" (texto da jornalista do Jornal de Negócios, Alexandra Camacho com a devida vénia)
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