sábado, setembro 10, 2022

BCE reconhece "erros de previsão" e admite recessão em 2023 na zona euro



Cenário mais pessimista aponta para uma quebra de 0,9% do PIB da zona euro no próximo ano. Tensões geopolíticas podem agravar-se e ajustamento ao corte dos fornecimentos russos pode não ser fácil. Christine Lagarde, a presidente do Banco Central Europeu (BCE), reconheceu esta quinta-feira que a organização cometeu “erros de previsão” na avaliação do surto inflacionário que assola a zona euro e anunciou que os economistas da organização admitem, agora, um cenário pessimista de recessão em 2023. O cenário pessimista surge como uma cautela face à incerteza que domina a geopolítica e as cadeias globais da oferta, apresentando aos mercados um quadro com pressupostos mais negativos do que os apresentados no cenário-base por Philip Lane, o membro da comissão executiva do BCE que funciona como economista-chefe.

Neste “cenário alternativo”, a economia do euro registaria uma quebra de 0,9% no próximo ano, em vez de apenas uma abrandamento do crescimento para 0,9%. À luz deste quadro pessimista, a economia não cairia apenas nos primeiros três meses do próximo ano, como já está previsto no cenário-base. Christine Lagarde admitiu, na conferência de imprensa desta quinta-feira, que alguns dos riscos considerados pelo cenário pessimista “já se materializaram”.

Deste modo, a recessão poderá regressar à zona euro, ainda que muito ligeira em relação ao afundamento de 2020 (quebra de 6,4%) e de 2009 (queda de 4,5%). O recuo seria um pouco mais severo do que em 2012 (quebra de 0,8%), no primeiro ano da recessão provocada pelos resgates de resposta à crise das dívidas públicas.

O cenário pessimista prevê ainda que o abrandamento económico no ano em curso seja maior do que o esperado. A economia do euro poderá crescer 2,9% em vez de 3,1% agora previsto pelo BCE no cenário-base. O que significa que a evolução económica no quarto trimestre deste ano será ainda pior do que a estagnação (crescimento zero) que Lagarde admitiu para a ponta final do ano.

Apesar do abrandamento económico e de mais desemprego previsto em 2023 no cenário-base, Lagarde sublinhou que o BCE não se demoverá da estratégia de subir as taxas de juro para quebrar o surto inflacionário e trazer a inflação de volta à meta dos 2% - o que nem em 2024 conseguirá (pois, a inflação ainda estará em 2,3%). A francesa não usou a expressão do norte-americano Jerome Powell de que o aperto na política monetária trará “alguma dor às famílias e às empresas”, mas vincou que os problemas da crise económica e social são responsabilidade de outros (os governos e da Comissão Europeia).

No caso do cenário pessimista se materializar, a presidente do BCE admitiu que “confrontados com grandes choques na oferta, teremos de tomar em conta quer os efeitos recessivos quer os efeitos na inflação”.

Recorde-se que o BCE decidiu esta quinta-feira realizar o maior aumento de sempre da taxa de juros, aprovando por unanimidade uma subida de 75 pontos-base, colocando a taxa diretora em 1,25% e a taxa de remuneração dos depósitos dos bancos (cada vez mais importante segundo Philip Lane) em 0,75%.

O que poderá empurrar a zona euro para a recessão

Christine Lagarde chamou a atenção para a situação da zona euro (e da União Europeia) na linha da frente do embate geopolítico depois da invasão da Ucrânia pela Rússia e das características da crise energética na Europa em virtude da anterior dependência estratégica de uma larga parte das economias em relação à Rússia no plano energético.

Ora, esse contexto pode agravar-se para além do que já é pressuposto no cenário-base do BCE. A presidente do BCE admitiu que as tensões geopolíticas podem agravar-se, que o ajustamento ao corte com os fornecimentos russos pode não ser fácil, e que as economias europeias podem ter de chegar ao racionamento na energia com os inevitáveis cortes na produção.

O que esse quadro pessimista implica em 2023 é mais inflação do que a prevista (6,9% em vez de 5,5% no cenário-base), um preço médio anual do barril de Brent de perto de 140 dólares (em vez dos menos de 90 no cenário-base) e um preço anual médio do gás natural de 360 euros por Megawatt/hora, mais de 50% acima da previsão no cenário-base (Expresso, texto do jornalista Jorge Nascimento Rodrigues)

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