sábado, agosto 27, 2022

Opinião: O erro do Pontal

Foi este o assunto que prometi abordar esta semana e assim farei.

Começo por referir que, na avaliação que faço do novo líder do PSD, não gosto de Montenegro. Mas sei que isso circunscreve-se a uma matéria opinativa, quando se olha para o PSD e para a necessidade de o partido sair da letargia que o aprisiona ao peso do fracasso, repetido desde 2015. Fracasso eleitoral e de lideranças. Sempre desconfiei, e está escrito, que Montenegro traria de novo para o PSD - bastava ver alguns dos nomes "ressuscitados" para os órgãos partidários, como se o PSD vivesse uma crise de falta de recursos humanos habilitados, ou uma carência de pessoas com novas ideias, libertas do passado e viradas para o futuro – alguns dos símbolos de um período recente da história social-democrata que quase ditou a pulverização do PSD, perante uma sociedade que não tem memoria curta. Tudo isto independentemente de não ter a certeza se Montenegro, mesmo antes das legislativas de 2026, resistirá a eventuais desaires eleitorais nas europeias (2024), nas regionais (2023 e 2024) e nas autárquicas (2025).

Se Montenegro, para se afirmar junto dos militantes do PSD e dos eleitores portugueses em geral, precisa de andar às cavalitas de Passos, então há algo que começa muito mal num PSD alegadamente em mudança, que está a ser timidamente beneficiado nas sondagens pelos erros e pelos tiros-nos-pés do governo socialista e do PS, e não por méritos próprios da nova liderança social-democrata.

O grande erro político da reentrada de Montenegro no Pontal, assentou num paradoxo, o de tentar vender às pessoas a ideia de um Passos renascido das cinzas, elogiado desnecessariamente nesta altura, um Passos alegadamente com um pensamento novo, que nada tem a ver com o Passos fundamentalista dos tempos da troika e dos atropelos sociais, um Passos irrascível e convencido, que foi afastado do poder em 2015, e que apesar de ter tido mais votos que o PS, em coligação com o defunto CDS de Portas, não conseguiu os mandatos suficientes no parlamento - no fundo é isso que interessa - para manter-se no poder, de onde acabou escorraçado pela geringonça de esquerda que soube aproveitar a herança financeira deixada pelo tal Passos agora ressuscitado por Montenegro.

Quando falo da nova liderança do PSD, falo dos desafios de uma realidade nova, num contexto político, governativo e parlamentar nacional muito difícil, exigente e desgastante também para quem precisa de construir, na oposição, uma alternativa na qual as pessoas acreditem e se revejam. Falo de uma liderança social-democrata que tem de ser diferente, que não precisa de ser colada ao “passismo” longe de ser consensual e que não pode ser apenas um instrumento usado ao serviço de estratégias pessoais e políticas manhosas - neste caso falo de eventuais corridas presidenciais - que me fazem lembrar tudo o que aconteceu antes do assalto ao poder no PSD nacional em 2011. E da sua descaracterização ideológica e programática. Passos, gostem ou não os "viúvos" e "viúvas" lacrimejantes de ouvir, não deixou saudades, e ajudou a que uma importante massa eleitoral, que tradicionalmente estava ao lado do centro-direita - falo dos portugueses mais idosos - hoje seja comprovadamente, por estudos de opinião, uma das principais bases eleitorais do PS. Não deixa saudades pela ideologia liberalizadora radical que em baseou a sua postura arrogante, pelo facto de ter pretendido ser, sempre, mais radical do que a troika, castigando as pessoas, indiscriminadamente, sem ganhar nada com isso, salvo o dinheiro deixado para que Costa e o governo da geringonça aplicassem medidas sociais e orçamentais que lhes garantiram espaço de manobra para se afirmarem no poder.

Essa foi a herança de Passos - tão apaparicado por Montenegro – ser o único responsável pelo facto do PSD ser hoje um partido destroçado, derrotado, desmotivado, desagregado, a realizar uma penosa e humilhante travessia do deserto, sem garantias de nada, inclusivamente se assegurar nesta nova realidade política, social e económica, sua própria sobrevivência, caso não tenha o engenho e a arte de ser diferente e de não andar a perder tempo por querer tirar esqueletos dos armários.

O PSD de Montenegro tem de mostrar aos portugueses, prioritariamente, que ainda é um partido útil, que pode ser uma alternativa, que o crescimento da direita e da extrema-direita, ou que correntes de pensamento assentes no liberalismo mais ou menos selvagem, não o incomodam ou fragilizam. O PSD de Montenegro não tem de andar atrelado a Passos ou às sugestões televisivas do Relvas, a mesma dupla que em 2011 assaltou com sucesso o PSD para o usar, depois, no assalto ao poder em Portugal. A mesma dupla que incentivou a golpada no PSD-Madeira, em 2011, bandalhice não totalmente falhada dada a fragilização que se instalou depois das regionais desse ano (LFM. texto de opinião publicado no Tribuna da Madeira de 26.8.2022)

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