terça-feira, maio 05, 2020

Há 16.100 aviões parados e companhias já estudam novas formas de viajar

O sector da aviação vive os dias mais negros da sua história. Com a maior parte dos aviões no chão, muitas companhias já discutem como será a nova arquitetura das cabines. Uma coisa é certa: os prejuízos são monumentais e vai haver muito menos gente a andar de avião. Desde a passada sexta-feira reiniciaram operações mais 140 aviões de transporte de passageiros à escala global, sendo que continuam em terra, parados há várias semanas, cerca de 16.100 aeronaves de um total de 24.000 registadas, de acordo com a base de dados da Cirium. Há pouco mais de uma semana (a 25 de abril) estavam parados e inativos mais de 16.800 aviões em todo o mundo.
A maior parte dos aviões que agora já cruzam os céus fazem sobretudo operações de repatriamento, transporte de carga e, em especial de material médico (a TAP tem feito isso com frequência e ainda no passado fim de semana fez um voo entre a China e o Brasil) ou ainda ligações regionais de curta distância.
Segundo a mesma fonte, as aeronaves inativas que agora se encontram paradas estão estacionadas em 876 aeroportos, um pouco por todo o mundo, sendo que mais de 2.000 se encontram concentradas em apenas 10 aeroportos.
O destaque vai para o Roswell International Air Centre, nos Estados Unidos da América (EUA) onde estão agora parados perto de 400 aviões, contra pouco mais de 100 em fevereiro. Na segunda posição surge o Southern California Logistics Airport, também conhecido como Victorville Airport, em San Bernardino, no Estado da Califórnia, que agora acolhe perto de 250 aeronaves.
No top 10 mundial dos aeroportos com mais aviões parados está ainda Barajas (Madrid), na 8ª posição, onde agora se encontram estacionados perto de 150 jatos de passageiros.
Em Lisboa, no aeroporto Humberto Delgado, estão parados mais de 50 aviões, a maioria deles da TAP, que também tem aeronaves estacionadas no Porto, em Faro e em Beja.
PREJUÍZOS DE €230 MIL MILHÕES ATÉ ABRIL
De acordo com vários analistas citados pela Associação Internacional de Transporte Aéreo (IATA - International Air Transport Association), o sector da aviação vive os dias mais negros da sua história, com prejuízos estimados (até abril) da ordem dos 230 mil milhões de euros.
Em vez de um crescimento de 4,7% no tráfego aéreo que a IATA tinha previsto para este ano, o sector depara-se agora com uma quebra que ronda já os 50% (até abril, comparado com o mesmo período do ano passado), sendo que ainda faltam oito meses para o final deste ano, sem que ninguém saiba ao certo qual será a evolução da atividade à medida que os vários países forem reabrindo o seu espaço aéreo.
Da mesma forma que também ainda ninguém consegue dizer com precisão qual será a nova forma de viajar de avião numa fase pós-confinamento, nem tão pouco qual a distância exigida entre passageiros, daqui para a frente, bem como o impacto que isso pode ter ao nível dos custos das passagens. É que, se houver menos assentos ocupados por avião o custo de operação irá disparar. Esta questão remete para uma outra que tem a ver com a forma como serão desenhadas, daqui para o futuro, as cabines dos aviões, ou como serão reconvertidas as dos que agora já operam à escala global.
Mas, se os primeiros três meses do ano já foram desastrosos para o sector da aviação, o segundo trimestre será o mais crítico pois, de acordo com a IATA, haverá uma redução de 70% na procura, o que irá deteriorar ainda mais a situação financeira das transportadores, obrigando-as recorrerem aos 61 mil milhões de euros das suas reservas de caixa.
25 MILHÕES DE DESEMPREGADOS
A IATA recorda ainda que o setor global das viagens e turismo (avaliado em 9,1 biliões de euros) está "suspenso" por pelo menos três a seis meses, com todo o impacto daí decorrente na cadeia de fornecedores e em todo o circuito das reservas de viagens.
De todo este cenário negro provocado pela pandemia Covid-19 a IATA estima que deverão resultar 25 milhões de desempregados na aviação e em todos os sectores correlacionados. O sector do transporte aéreo dá trabalho a mais de 65 milhões de pessoas em todo o mundo. A maior parte da destruição de emprego ocorrerá sobretudo na região da Ásia/Pacífico (11,2 milhões de pessoas ficarão sem trabalho) e na Europa (5,6 milhões).
“Não há palavras para descrever o impacto devastador da Covid-19 no setor de transporte aéreo. Irá afetar 25 milhões de pessoas que tem os seus empregos ligados ao setor aéreo. (…) Agora, a ajuda é fundamental para as companhias aéreas”, disse no início do mês de abril Alexandre de Juniac, diretor-geral da IATA.
O mesmo responsável alerta para o facto de a confiança dos passageiros poder vir a sofrer “um golpe duplo, mesmo após a contenção da pandemia: por um lado, preocupações económicas pessoais no cenário da recessão iminente; por outro, as suas preocupações com a segurança das viagens”.
40% DOS PASSAGEIROS FREQUENTES ADMITEM FICAR SEIS MESES SEM VOLTAR A VOAR
Uma pesquisa realizada pela IATA revela que 60% dos passageiros frequentes pretendem voltar a viajar um a dois meses após a contenção da pandemia mas, o pior é que 40% referem que podem esperar seis meses ou mais para voltar a entrar num avião. Por outro lado, 69% admitem ainda adiar o regresso às viagens de avião pelo menos até a estabilização da sua situação financeira pessoal.
A explosão das viagens aéreas que, nos últimos anos, encolheu o planeta, criou milhões de empregos e fez com que milhões de pessoas andassem de avião pela primeira vez, dispersando famílias ricas e pobres pelos vários continentes, com as companhias low cost a darem um empurrão definitivo na democratização do direito do ‘acesso aos céus’. Mas, agora, tudo estagnou.
Uma coisa é certa: andar de avião daqui para o futuro nunca mais será como dantes. Como vai haver menos gente a voar os preços vão ser mais elevados, provavelmente haverá menos rotas e, por outro lado, os exames de saúde antes do voo passarão a ser obrigatórios, para além de poder também haver menos comida disponível (especialmente a que é servida de forma gratuita).
Os tempos de espera nos aeroportos prometem ser desesperantes, com uma antecipação cada vez maior dos passageiros para todo o tipo de procedimentos sanitários. A Emirates, por exemplo, que há pouco mais de uma semana retomou várias ligações internacionais a partir do Dubai, já está a pedir uma presença no aeroporto três horas antes do voo.
ESTÁ AÍ UMA NOVA ERA NAS VIAGENS AÉREAS
A pandemia da Covid-19 está a iniciar uma nova era nas viagens aéreas. Enquanto as transportadoras aéreas de todo o mundo reavaliam a viabilidade das suas operações (num um ano de perdas históricas, que será 2020), ou ainda se conseguirão manter-se operacionais, com ou sem ajudas estatais, nos aeroportos estranhamente vazios, o uso de máscaras e o distanciamento social começam já a mostrar uma mudança de comportamento entre os poucos funcionários de serviço e os viajantes que resistem por estes dias de medo e incerteza.
Com tantos aviões em terra é natural, segundo alguns especialistas em aviação citados pela agência Bloomberg, que algumas companhias aproveitem a paragem forçada para reavaliarem a arquitetura do interior dos seus aviões, ao mesmo tempo que irão começar a pensar em exigir mais dinheiro por cada passagem.
Provavelmente, algumas transportadoras atualizarão os lugares de primeira classe, em resultado de uma diferença ainda mais acentuada entre as secções de classe alta e os assentos económicos, que serão cada vez mais espartanos.
ASSENTO DO MEIO VAZIO RESOLVE?
Entretanto, algumas companhias já adotaram medidas concretas como, por exemplo, deixar vazio o assento do meio, nos poucos voos que ainda conseguem operar, bem como exigir o uso de máscara aos passageiros.
Mas as principais companhias aéreas da Europa – como os grupos Air France-KLM, Lufthansa e IAG, insistem que "o distanciamento social não é necessário nem viável a bordo de uma aeronave".
Aliás, o presidente executivo da Ryanair, Michael O'Leary, disse recentemente que sua empresa não retomaria os negócios se o bloqueio do assento do meio fosse obrigatório, alertando que isso poderia arruinar o modelo de negócios da transportadora.
O'Leary sublinha que "o assento do meio não oferece distanciamento social, por isso será sempre uma solução idiota ".
Especialistas em saúde citados pelo site Euroactive, notam que as pessoas devem manter uma distância de dois metros para reduzir o risco de infeção viral. Ora, dado o tamanho das cabines das aeronaves modernas, os passageiros teriam que ficar sentados com, aproximadamente, sete assentos vazios entre si para terem espaço de segurança adequado (Expresso, texto do jornalista Vítor Andrade)

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