terça-feira, janeiro 29, 2013

Opinião: “E depois do regresso aos mercados”

“A principal notícia da semana passada sobre a crise nacional não foi o festejado regresso aos mercados, nem o oportuno pedido de alteração dos prazos de pagamento de alguns empréstimos à troika. O acontecimento mais surpreendente e importante foi uma pequena frase de Olli Rehn, que diz assim: "A hipótese de combinar um programa de prevenção com o OMT [programa de compra de obrigações] do BCE é qualquer coisa que não deve ser excluída como forma de suavizar o regresso aos mercados" de Portugal. Tal como há silêncios ensurdecedores, há vazios que podem esmagar. O período pós-Junho de 2014 é um dos segundos. Por essa altura, o financiamento da troika já terá chegado ao fim e o País será chamado a navegar sozinho nos mercados de capitais. A inquietação é por isso inevitável: será que Portugal, um país pobre e endividado como nunca, agastado política e socialmente após vários anos de austeridade, conseguirá safar-se sozinho perante juros mais altos do que alguma vez pagou na década de estagnação que antecedeu a crise?
É certo que o País levantou na semana passada 2,5 mil milhões de euros a médio prazo e parece bem posicionado para chegar aos 6,7 mil milhões previstos para este ano. Mas isso é bem diferente de conseguir por conta própria os 12 mil milhões estimados para 2014 ou os mais de 40 mil milhões que precisará em 2015 e 2016. A dúvida sobre o vazio da transição pós-troika, razoável e potencialmente mortífera, é adensada pelo facto de ser cada vez mais evidente que os planos de Mario Draghi passam por nunca ter de efectivamente comprar um euro de dívida pública para o balanço do BCE. E também pela certeza de que um segundo resgate "à grega" seria visto por todos - Governo, troika e investidores - como uma derrota das políticas adoptadas. Mas então o que fazer com Portugal?
O comissário levantou o véu sobre as respostas que se começam a desenhar do lado europeu: se tudo correr bem, a troika admite (planeia?) ficar por Lisboa mais uns tempos, mais discreta mas igualmente envolvida na governação, garantindo em troca as bóias de segurança de que Portugal precisa para desafiar os cépticos nos mercados de capitais no pós-Junho de 2014. Os programas de prevenção de que fala Olli Rehn foram criados há cerca de um ano com o objectivo de flexibilizar a capacidade de actuação do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (FEEF). Então, o FEEF passou a contar com programas de assistência de curto prazo, materializados em linhas de crédito – concedidas através de empréstimos directos e compras de obrigações em mercado primário – ou em garantias europeias dadas a novas obrigações do Tesouro de Estados-membros em dificuldades. Haverá com certeza em Olli Rehn uma esperança de que as suas palavras (associadas às de Mario Draghi) possam descansar os investidores, pressionar os juros em baixa e, no limite, permitir que Irlanda e Portugal nem venham a precisar de qualquer assistência adicional. No caso português isso parece pouco provável dada a dimensão do desafio. Se assim for a troika continuará por Lisboa pelo menos até às eleições de 2015” (texto de Rui Peres Jorge, jornalista do Jornal de Negócios, com a devida vénia)