Segundo os jornalistas do DN de Lisboa, João Cristóvão Baptista, Rui Pedro Antunes e Sónia Simões, no âmbito da grande reportagem que o jornal tem publicado, "o Tribunal de Contas só recebeu a contabilidade de 1724 organismos e fiscalizou apenas 418. Isto num universo de 13 740 entidades, entre administrações central, local e regional, empresas, institutos e fundações que estão sob sua jurisdição e que consomem metade do PIB. Portugal não tem capacidade para fiscalizar os 13 740 organismos que recebem dinheiro do Estado. A realidade é que cerca de 90% escapam ao controlo do Tribunal de Contas (TC). De acordo com os dados de 2009, o tribunal apenas recebeu informações sobre a despesa de 1724 entidades (12,55%) e destas só teve capacidade para verificar 418. O universo é grande, mas ninguém conhece a sua real dimensão. Não há listas oficiais. A compilação foi feita pela investigação do DN após consulta de várias fontes (e vai estar disponível por completo no site do DN - dn.pt - para consulta). São 10 500 entidades das administrações central, local e regional, 1500 empresas públicas, cerca de 350 institutos e 1100 fundações e associações que, no seu conjunto, empregam perto de 660 mil pessoas e consomem anualmente 81 mil milhões de euros - o equivalente a quase metade (48%) da riqueza nacional. Embora a ideia de que o Estado financia um universo tão alargado de organismos seja aceite por vários economistas e especialistas nesta matéria - entre os quais o próprio presidente do tribunal, Guilherme d'Oliveira Martins -, a verdade é que este não é um número estático e ninguém tem a noção exacta do seu número. A velocidade a que são criados, extintos ou fundidos muitos dos institutos, empresas ou meras estruturas de missão faz com que seja quase impossível determinar o total de organismos existentes e impossibilita o cálculo da evolução do número de entidades que o Estado financiou ao longo dos últimos anos. Este é um problema com que se têm deparado, inclusivamente, os partidos da oposição com assento no Parlamento: o DN sabe que os deputados do CDS-PP têm há vários meses uma equipa a trabalhar na contabilização de todas as empresas que se alimentam do Orçamento do Estado e, até à data de fecho desta investigação, não tinha ainda alcançado dados conclusivos. Um exemplo claro da rapidez com que se criam e extinguem novos organismos em Portugal é o da Comissão para a Optimização dos Recursos Educativos - tutelada conjuntamente pelos ministérios das Finanças e da Educação - e que foi extinta em Outubro do ano passado, exactamente dois meses e 12 dias depois de ter sido criada. O número reduzido de contas que foram remetidas ao Tribunal de Contas - e que constam do relatório de actividades referente a 2009 deste regulador - é explicado pela própria legislação do organismo presidido por Guilherme d' Oliveira Martins. Segundo o próprio, embora o universo de entidades sob jurisdição do TC que movimentam dinheiros públicos seja de 14 mil, apenas metade está obrigada a entregar anualmente todos os documentos relativos a contratos e contas de gestão. "Há uma definição para efeitos do Tribunal de Contas que leva a considerar que elas são sete mil, independentemente de haver em termos puramente administrativos 14 mil entidades", explicou ao DN o presidente do TC, sublinhando que qualquer entidade que movimente dinheiros públicos se encontra sob jurisdição do tribunal. A Presidência da República, a Assembleia da República, os tribunais, as autarquias ou as Assembleias Legislativas Regionais são exemplos de alguns dos organismos que todos os anos são obrigados a enviar as suas contas para este tribunal. No entanto, a legislação do Tribunal de Contas prevê que algumas destas entidades possam ser dispensadas de apresentação de contas. O Regulamento da 2.ª Secção define que é anualmente elaborada uma lista com as entidades que beneficiam desta dispensa com o fundamento da "fiabilidade dos sistemas de decisão e de controlo interno constatados em anteriores auditorias", exigindo no entanto que estes organismos sejam sujeitos a uma auditoria pelo menos de quatro em quatro anos. No ano a que se refere este relatório, foram dispensadas de apresentar contas 5717 entidades, 76,8% do universo de organismos contabilizados. Carlos Moreno, juiz jubilado do Tribunal de Contas, aponta estes números como um sinal da falta de recursos que este organismo tem para controlar todas as entidades que se encontram sob a sua jurisdição. "O TC não tem meios: ao todo há 16 juízes, nove dos quais estão na 2.ª Secção, que é a maior, com nove áreas de responsabilidade", explicou ao DN, salientando que cada um destes juízes "faz, no máximo, nove ou dez auditorias por ano". Visão divergente tem o presidente do Tribunal de Contas, Guilherme d' Oliveira Martins, que garantiu ao DN que os meios que tem este tribunal são "suficientes" e "adequados para fiscalizar as administrações públicas central, regional e local e o sector público empresarial". Embora o número de entidades que enviaram as suas contas para o TC represente apenas 24% do universo de organismos obrigados a prestar contas anuais ao regulador, o presidente da instituição fez questão de sublinhar que "não se pode dizer que há aqueles que escapam" à fiscalização do Tribunal de Contas. "Nenhuma entidade escapa ao controlo do TC, até porque hoje a lei consagra o princípio de perseguição do dinheiro público", assegurou Guilherme d'Oliveira Martins, recordando que a instituição que dirige pode, a qualquer momento, proceder à fiscalização da utilização do dinheiro do Estado em qualquer entidade, pública ou privada.
Finanças sem números
Finanças sem números
O Estado não sabe ao certo quantos organismos públicos existem. Não há um inventário geral e o próprio Ministério das Finanças escusou-se a indicar - após dois meses em que foi incessantemente questionado pelo DN - um número. "Um dos motivos pelos quais o Estado não consegue reduzir a despesa é porque não sabe ao certo onde cortar, pois não sabe quantos organismos tem." A crítica vem do investigador do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG) João Cantiga Esteves, que fez essa contabilização: no total existem cerca de 13 740 entidades que se alimentam do Orçamento do Estado. Curioso é que foi juntando dados da Direcção-Geral do Orçamento - revelados de forma dispersa - que João Cantiga Esteves conseguiu chegar a estes números, confessou ao DN. Para o economista, "o número de organismos, em que se incluem secretarias e direcções-gerais, é um exagero. Um disparate". Nos últimos anos, em vez de uma redução, tem-se assistido a um aumento das "camadas" que assentam num modelo clássico que, por si só, já é muito pesado. Só nas administrações central e local existem 10 365 entidades, às quais ainda se juntam, de acordo com o investigador do ISEG, "a loucura dos institutos públicos, que é uma batotice feita há muito tempo, e das fundações, onde encontramos exemplos inacreditáveis". De acordo com o estudo realizado por Cantiga Esteves, existem 639 fundações, sendo que várias foram criadas ilegalmente. Ao realizar o estudo sobre organismos públicos, João Cantiga Esteves ficou também "admirado" com o universo de empresas públicas (1182) e alerta que estas servem, muitas vezes, para o Estado contornar os "problemas da contratação e das obras públicas". O investigador denuncia que, por exemplo no caso das empresas de transportes, o Estado reduziu as transferências compensatórias para estas entidades para não prejudicar o défice orçamental. Ou seja, "mandou-as literalmente endividarem-se". O que ainda piora o facto de o Estado ser pesado é, no entender do investigador, "a tendência dos últimos anos, em que ano após ano o Estado cresce". A decisão de alterar a situação tem de partir da classe política, algo que complica a situação. "Politizou-se demasiado o Estado, mais bem dito, partidarizou-se e daí que os níveis políticos do Estado tenham vindo por aí abaixo. Isso faz com que a máquina seja muito vaga e muito dependente daquilo que são as forças partidárias."
Reduzir 4600 a 7000 entidades
E se é consensual, entre a classe política e os especialistas, que o Estado português é pesado, sempre foram várias as dificuldades em reduzir a quantidade de organismos públicos e, consequentemente, o número de funcionários públicos. Marques Mendes, ex-líder de um dos partidos do bloco central e autor do livro Mudar de Vida, não tem dúvidas de que o peso do Estado só pode ser combatido com "redução das estruturas e das pessoas". Para Marques Mendes, "há muitas mais extinções de organismos exequíveis do que as anunciadas pelo Governo". O ex-governante acredita que passando serviços públicos para o domínio privado, torna-se possível reduzir consideravelmente os organismos públicos. Além disso, Marques Mendes denuncia diversas entidades em que existe "duplicação de funções", que podem ser extintas ou integradas noutros organismos. Daí que proponha a extinção de várias entidades. Também os especialistas estão de acordo quanto à necessidade de "emagrecer" o Estado. Enquanto João Cantiga Esteves defende "uma redução para metade dos organismos públicos", o professor do Instituto Superior Técnico Luís Valadares Tavares aponta para a necessidade de "reduzir em 30% os organismos públicos". Tais extinções significariam o fim de 4600 a 7000 entidades públicas. A redução de pessoal é outro dos caminhos "inevitáveis" para aliviar o peso do Estado na economia. Para Marques Mendes, "o Estado deve abrir mão de rescisões amigáveis na função pública. Fazer um investimento no futuro, mesmo que no ano em que as faça gaste imenso dinheiro em indemnizações". O objectivo é reduzir a despesa do Estado, que neste momento consome quase metade do PIB, e, de acordo com Valadares Tavares, "não deveria exceder um terço".
Reduzir 4600 a 7000 entidades
E se é consensual, entre a classe política e os especialistas, que o Estado português é pesado, sempre foram várias as dificuldades em reduzir a quantidade de organismos públicos e, consequentemente, o número de funcionários públicos. Marques Mendes, ex-líder de um dos partidos do bloco central e autor do livro Mudar de Vida, não tem dúvidas de que o peso do Estado só pode ser combatido com "redução das estruturas e das pessoas". Para Marques Mendes, "há muitas mais extinções de organismos exequíveis do que as anunciadas pelo Governo". O ex-governante acredita que passando serviços públicos para o domínio privado, torna-se possível reduzir consideravelmente os organismos públicos. Além disso, Marques Mendes denuncia diversas entidades em que existe "duplicação de funções", que podem ser extintas ou integradas noutros organismos. Daí que proponha a extinção de várias entidades. Também os especialistas estão de acordo quanto à necessidade de "emagrecer" o Estado. Enquanto João Cantiga Esteves defende "uma redução para metade dos organismos públicos", o professor do Instituto Superior Técnico Luís Valadares Tavares aponta para a necessidade de "reduzir em 30% os organismos públicos". Tais extinções significariam o fim de 4600 a 7000 entidades públicas. A redução de pessoal é outro dos caminhos "inevitáveis" para aliviar o peso do Estado na economia. Para Marques Mendes, "o Estado deve abrir mão de rescisões amigáveis na função pública. Fazer um investimento no futuro, mesmo que no ano em que as faça gaste imenso dinheiro em indemnizações". O objectivo é reduzir a despesa do Estado, que neste momento consome quase metade do PIB, e, de acordo com Valadares Tavares, "não deveria exceder um terço".
Sem comentários:
Enviar um comentário