sábado, abril 30, 2022

Descodificador do Expresso: O Alojamento Local e o Supremo: e agora?


Acórdão do Supremo Tribunal proíbe Alojamento Local em prédios de habitação. Decisão só se aplica em recursos judiciais. Não é o fim do Alojamento Local, mas é um grande revés para os pequenos proprietários.

1 - O que está em causa com a decisão do Supremo?

Desde 2016 que os tribunais discutiam se a atividade de Alojamento Local se enquadrava no uso de uma fração para habitação. A propriedade horizontal de um imóvel prevê apenas os usos para habitação, comércio e serviços. O acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, noticiado pelo Público na semana passada, unifica a jurisprudência e considera que o AL não é enquadrável no uso de habitação e acaba por o proibir. “A partir de agora, qualquer condómino pode pedir em tribunal para acabar com um estabelecimento de AL por contrariar a finalidade de uso da fração num imóvel que esteja em propriedade horizontal”, explica Pedro Morais Vaz, advogado sénior da Vieira de Almeida Associados (VdA).

2 - O que muda com o acórdão do STJ?

Basta que um único condómino recorra a tribunal para acabar com um Alojamento Local no prédio onde possua um apartamento. E uma eventual sentença de perda de registo será definitiva. Até agora, uma alteração à lei feita em 2018 simplificava o processo. Se um condomínio votasse por maioria contra um AL, a decisão seria comunicada à autarquia e, num processo rápido, esta decidiria ou não pela suspensão do registo de AL até ao máximo de um ano. “Agora não é preciso maioria, qualquer condómino pode fazê-lo e não há limite de tempo. Da mesma forma que não posso fazer um café ou um escritório numa fração de habitação, também não posso fazer um AL”, acrescenta Pedro Morais Vaz. Isto, no caso de recurso a tribunal, pois a utilização do mecanismo arbitral junto das câmaras mantém-se.

3 - É o fim das licenças existentes e das novas?

O acórdão do STJ não interfere nas licenças administrativas para Alojamento Local passadas ou futuras. “Não implica a caducidade dos registos existentes nem impossibilita que se possam pedir novos registos de AL”, afirma Pedro Morais Vaz, acrescentando que o regime jurídico que regula a atividade do AL requisita que o proprietário demonstre uma “licença adequada”. Lisboa, onde o pedido de novos registos está suspenso em 14 das 24 freguesias da capital, tem uma situação “esquizofrénica”. Junto do condomínio é proibida a licença de habitação, mas o regulamento da autarquia estipula que para o pedido do registo de atividade não basta uma licença adequada e obriga que quem queira fazer AL possua uma licença para habitação.

4 - O que poderá acontecer?

Pedro Morais Vaz concorda com a declaração de voto de um dos juízes do STJ, de que poderemos assistir a uma avalanche de processos. “O acórdão não é vinculativo nas instâncias judiciais inferiores, mas tem um grande peso”, diz, acrescentando que a decisão do STJ não significa o fim do Alojamento Local, mas é um sério revés para os pequenos proprietários. Quanto à clarificação da lei, o advogado lembra que a única forma que o legislador tem é dizer que o uso de habitação previsto nas propriedades horizontais abrange a possibilidade de AL. Isto do ponto de vista jurídico, pois há toda uma componente política associada. A Iniciativa Liberal entregou na semana passada no Parlamento um projeto de lei para clarificar o regime de AL, pedindo que “nada se altere” e os negócios possam continuar (Expresso, texto do jornalista HELDER C. MARTINS)

Sem comentários: