segunda-feira, novembro 29, 2021

Reserva das Selvagens passa a ser a maior área marinha com proteção total da Europa e do Atlântico Norte



Pesca, exploração de inertes e qualquer outra atividade extrativa passam a estar proibidas numa área de 12 milhas náuticas em redor das Ilhas Selvagens, no Arquipélago da Madeira, de forma a proteger todas as espécies ali existentes, criar capital natural e atrair turismo científico. “Dá prestígio à Madeira e é um contributo da Madeira para o país e para o mundo”, diz o presidente do Governo Regional, Miguel Albuquerque.

A reserva Natural das Ilhas Selvagens, criada há 50 anos, estende a partir de agora o estatuto de proteção total de 95 km2 para 2.677 km2, o que torna esta área marinha protegida (AMP) a maior da Europa e de todo o Atlântico Norte. A pesca ou qualquer outra atividade extrativa impactante passam a estar proibidas numa área de 12 milhas náuticas em redor destas ilhas do Arquipélago da Madeira, de forma a proteger todas as espécies ali existentes, criar capital natural e atrair turismo científico.

A classificação é possível com a aprovação pelo Governo Regional da Madeira de um novo regime jurídico de proteção total das Selvagens, uma medida que conta com o apoio técnico e científico da Fundação Oceano Azul, da National Geographic e do Waitt Institute. O anúncio foi feito esta segunda-feira no Funchal.

“Ter esta AMP como a maior da Europa diz muito do caminho que a Europa ainda tem de percorrer a pensar na estratégia para 2030 e nos compromissos de classificar como áreas marinhas protegidas 30% dos mares e oceanos”, frisa ao Expresso o biólogo Emanuel Gonçalves, coordenador científico da Fundação Oceano Azul e investigador do Centro de Ciências do Mar e do Ambiente (MARE). Este cientista lembra que “uma das formas mais eficazes para proteger a vida marinha e restaurar os ecossistemas é definir áreas marinhas protegidas e utilizá-las como ferramentas efetivas”, já que “do ponto de vista científico travar os impactos de atividades intensivas, como a pesca, tem efeitos elevados na recuperação da biomassa marinha”.

As águas em redor das Selvagens albergam um ecossistema único, são um berçário para muitas espécies e fazem parte da rota migratória de outras. Ao proteger-se esta área também “se cria uma marca de sustentabilidade para a região da Madeira em termos de turismo científico e ecológico”, sublinha Emanuel Gonçalves.

Este também é um ponto relevante para o presidente do Governo Regional da Madeira. “Dá prestígio à Madeira e é um contributo da Madeira para o país e para o mundo”, diz ao Expresso Miguel Albuquerque, reforçando que a Madeira tem “águas pristinas a salvaguardar" que quer "abrir ao turismo científico”.



Para assegurar a proteção total desta área de atividades extrativas como a pesca, o Governo Regional tem protocolos com a Polícia Marítima e com a Força Aérea, além dos meios próprios do Parque Natural, com recurso a drones, e a possibilidade de recurso a informação de satélite à qual a Fundação Oceano Azul tem acesso no âmbito dos trabalhos de investigação que apoia.

PROTEGER 30% PARA RECUPERAR CAPITAL NATURAL

A ONU quer que 30% dos oceanos sejam protegidos até ao final desta década, mas atualmente só um terço destes têm algum estatuto de proteção a nível global, e apenas uma ínfima parte conta com medidas concretas de gestão para controlar atividades humanas nas suas águas. Dados da Agência Europeia do Ambiente apontam para que em 90% das AMP classificadas na Europa se continue a praticar, por exemplo, a pesca de arrasto, uma das artes pesqueiras mais danosas para os ecossistemas marinhos.

“Precisamos de avançar rapidamente para o objetivo de proteger fortemente 30% dos nossos mares e gerir sustentavelmente os outros 70%, pois só assim conseguiremos recuperar capital natural”, reforça Emanuel Gonçalves, lembrando que “já se perdeu cerca de 90% do stock de grandes predadores dos mares”. Sobre o que Portugal tem feito neste campo, o cientista considera que “os Governos regionais têm dado passos maiores que o Governo da República”, já que "falta operacionalizar uma estratégia integrada”.

Na totalidade da ZEE portuguesa existem 71 áreas marinhas protegidas, das quais 58 nos Açores, oito no Continente e cinco na Madeira. Portugal tinha-se comprometido a classificar 14% do mar com áreas marinhas protegidas até 2020, mas não foi além de 7% e a proteção efetiva só abrange 0,01%.

O objetivo da Estratégia Europeia para a Biodiversidade e da Estratégia Nacional para o Mar é proteger 30% dos mares até final desta década, um terço dos quais de forma efetiva. O ministro do Mar, Ricardo Serrão Santos, já reconheceu que Portugal está longe do objetivo, que “não se faz de um dia para o outro”, mas que “proteger 30% do nosso mar é um compromisso internacional e europeu e Portugal não pode falhar” (Expresso, texto da jornalista Carla Tomás)

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