"Pára no Parlamento. Está na oposição. Mas fala como se ainda estivesse no Governo. Porque precisa de defender aquilo que alimentou: o monstro das estradas. Paulo Campos foi um homem essencial a José Sócrates, na sua política, nas campanhas e no financiamento delas. Deixou obra feita, algumas com inaugurações estranhamente milionárias e um escandaloso Aeroporto de Beja. Sobretudo: foi o grande actor das concessões de estradas. Mas este editorial não é sobre o homem: já perdeu umas eleições e ganhará outras. Paulo Campos é apenas uma pessoa errada. Cometeu erros que deixam um custo brutal. Aliás, era só fazer as contas. Quando as fizemos, fomos desmentidos. Um desses muitos desmentidos que o tempo clarificaria foi há mais de três anos. A 24 de Julho de 2008, ninguém falava do Lehman Brothers, o mundo ainda não tinha mudado. Mesmo nessas condições, uma investigação conjunta do Negócios e da Antena 1 concluía, em manchete, que as "estradas de Sócrates" não eram rentáveis; o investimento nunca seria recuperado e, em vários casos, nem sequer a operação seria lucrativa. O contra-argumento do Governo era o suposto "keynesianismo": o investimento público traria emprego e crescimento. Além disso, combatia-se a interioridade e acidentes de viação. E o valor económico das externalidades ambientais e de desenvolvimento compensaria. Com o IRC dos lucros das empresas que iriam florescer à volta das estradas, a conta seria paga. Estes argumentos não são idiotas. Se o Estado só investisse no que dá lucro, nem bancos de jardim haveria. Mas naquela altura, com uma dívida pública ascendente e já reconhecidamente desorçamentada, sem a economia a crescer e com juro a subir, era uma loucura. Foram escritos milhares de editoriais sobre isso. Debalde. Ficou um "buraco" de 400 milhões por ano, de 2014 até 2030. Os dados são da Inspecção-geral de Finanças. Esta semana, na Assembleia, Paulo Campos continuava a defender as suas estradas. Devia pedir desculpa: tem pegada fiscal gigantesca. A Estradas de Portugal era um bicho complicado, nascendo de uma Junta Autónoma imersa em dívidas e suspeitas de corrupção. A sua renovação e modelo de financiamento pretendiam dar-lhe respeito e equilíbrio (e, suspeito, desorçamentação). O respeito foi conseguido, o equilíbrio não. A EP é um fracasso. Dá lucro financiado pelos impostos das gasolinas mas não tem dinheiro para pagar dívidas, que não consegue refinanciar. As sete "estradas de Sócrates" (que chegaram a ser doze, mas algumas ficaram pelo caminho, como a sinistra concessão do Centro) estão ainda a ser construídas. Juntando à factura destas concessões os encargos com as Scut e com as PPP, explica-se grande parte do drama português. O "betão" começou com Cavaco, as PPP com João Cravinho (que as fez especialmente ruinosas), a demência final com Paulo Campos. As estimativas de tráfego saem furadas. Os bancos estrangeiros saltam dos contratos de financiamento, que foram sobrando para a Caixa. E os privados pedem compensações ao Estado. Temos infra-estrutras do melhor, o que não temos é dinheiro. As estradas foram parte de um modelo de desenvolvimento que aproveitou às concessionárias. Do crescimento económico, ficaram as dívidas" (editorial do Jornal de Negócios de Pedro Santos Guerreiro, com a devida vénia)
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