terça-feira, fevereiro 27, 2024

Influenciados pela “novidade” e pelo digital, eleitores jovens votam mais à direita

A pouco mais de duas semanas das eleições legislativas, a última sondagem divulgada pela Universidade Católica para o PÚBLICO, RTP e Antena 1 indica que 50% dos jovens inquiridos tencionam votar à direita. Comparando com o anterior estudo da Católica, PS e Livre foram os partidos que mais cresceram nas intenções de voto na faixa etária dos 18 aos 34 anos, sem ultrapassar a Aliança Democrática (AD), Chega e IL, que ocupam o pódio neste segmento do eleitorado. Especialistas ouvidos pelo PÚBLICO traçam o retrato dos eleitores mais novos: são atraídos pelo que representa “novidade” e influenciados pelo que consomem na Internet. E tendem a identificar-se menos com um partido em concreto.

A última sondagem do Centro de Estudos e Sondagens de Opinião (Cesop) da Universidade Católica mostra que os inquiridos entre os 18 e os 34 anos de idade preferem votar em forças políticas de direita. A soma das intenções de voto desta faixa etária na AD, IL e Chega é de 50%: 20% admitem votar na aliança que junta PSD, CDS-PP e PPM, 16% no Chega e 14% na IL. Os restantes 50% dividem-se entre a intenção de votar à esquerda e no PAN (cerca de 24%) e aqueles que estão indecisos, não querem votar e/ou não quiseram responder (27%).

A faixa etária em questão não é constituída apenas por jovens, mas também por “jovens adultos”, alerta o director técnico da empresa de sondagens Aximage, José Almeida Ribeiro, que acrescenta que nestas idades se verifica “uma grande diferença geracional”. As intenções de voto dos jovens actuais são influenciadas por aquilo que é “novidade”, pelo que traz “diversidade e experimentação”, explica.

E também pela Internet. “Esta geração é tipicamente digital, é a geração da Internet. O acesso à informação é instantâneo e todos sabem onde a ir buscar. E agora as formas de comunicação política alteraram-se”, refere, aludindo à relevância que redes sociais como TikTok, Instagram e X ganharam. Há ainda um terceiro factor que não é exclusivo dos jovens actuais, acrescenta Almeida Ribeiro: o “contexto político-social e histórico em que a geração surge”. Exemplo disso é a geração que, quando entrou no mercado de trabalho, “apanhou a crise financeira de2008 e se distanciou dos partidos tradicionais”.

Dados podem não ser significativos

Comparando esta última sondagem do Cesop com o estudo da Católica divulgado em Novembro, PS e Livre foram os partidos que mais cresceram nas intenções de votos (4 pontos percentuais cada um, chegando aos10% e 5%, respectivamente). O PAN foi a única força política a perder apoio nos jovens: de 4% para 2%.

No entanto, de uma sondagem para a outra mantiveram-se inalterados os três partidos com mais intenções de voto jovem: PSD (AD no estudo de Fevereiro) em primeiro lugar, seguindo-se Chega e IL. “Também nas sondagens da Aximage se encontra uma intenção de voto jovem tendencialmente à direita”, diz José Almeida Ribeiro.

Além dos estudos do Cesop e da Aximage, também nas sondagens da Intercampus (que também usa como referência a faixa etária dos 18 aos 34 anos) divulgadas desde que o Presidente da República convocou eleições antecipadas, os jovens inquiridos surgem mais inclinados para votar à direita. O mesmo se verifica na última sondagem do ICS/Iscte para o Expresso e a SIC, com os jovens apenderem mais para a IL e, logo a seguir, o Chega.

Ainda assim, fonte de uma outra empresa de sondagens diz ao PÚBLICO que não há dados suficientes que permitam concluir estarmos perante uma tendência. Isto por causada dimensão da amostra, sublinha. Se numa sondagem foram inquiridas, a título de exemplo, 600 pessoas, a percentagem de jovens existentes nessa amostra é demasiado baixa, pelo que não permite retirar conclusões definitivas.

O politólogo João Cancela concorda e alerta que, apesar de “termos alguns sinais do conjunto de sondagens que têm sido divulgadas”, “só vamos saber como vão votar os jovens depois das eleições”. Até porque “as intenções de voto divulgadas até agora” podem não ter “uma taxa de conversão plena em votos obtidos”, alerta o docente de Ciência Política da Universidade Nova de Lisboa.

Chega quadruplica, PS perde mais do dobro

Em 2022, a três dias das eleições legislativas de 30 de Janeiro, o Cesop divulgou uma sondagem em que os partidos de esquerda e o PAN somavam 35% das intenções de voto dos mais novos (na sondagem de Fevereiro de 2024este valor é de 24%). Na época, era o PS o partido que mais “conquistava” votos na faixa etária 18-34 anos. Face à sondagem do Cesop de Fevereiro deste ano, os socialistas, agora liderados por Pedro Nuno Santos, perderam mais do dobro das intenções de voto jovem (de 23% para 10%).

Depois do PS, era no PSD (que em 2022 não foi a votos coligado) que os jovens inquiridos mais tencionavam votar: 21%. Nesse ano, sem PSD e CDS coligados, a intenção de voto jovem nestas forças políticas totalizava 23%, mais 3 pontos do que a AD regista actualmente. Já o partido liderado por André Ventura, da sondagem de Janeiro de 2022 para a de Fevereiro deste ano, quadruplicou as intenções de voto dos jovens (de 4% para 16%). Os liberais subiram 5 pontos (de 9% para 14%) e BE, PAN e Livre cresceram 1 ponto cada um. Tal como PS e PSD e CDS, a CDU também perdeu apoio jovem: de 2% das intenções devoto para menos de 1%.

O Chega foi, assim, o partido que mais cresceu. O partido “atrai os jovens porque são a novidade, seja no estilo, linguagem, propostas e forma de interacção com as pessoas. Fazem-se notar”, aponta Almeida Ribeiro. O director técnico da Aximage diz que este é um “padrão directamente associado à idade e que depois, ao longo da vida, estabiliza”. São “votos de uma geração que não está fidelizada a nenhuma ideologia, tem hábitos de consumo diferentes e é mobilizada por temas para os quais os partidos tradicionais” não olhavam, como era ocaso da saúde mental, exemplifica.

A opinião é partilhada por João Cancela, para quem “os jovens tendem a identificar-se menos com um qualquer partido”, o que os torna “um segmento do mercado eleitoral mais disponível” para votar em forças políticas com mensagens mais apelativas para este eleitorado. As sondagens até aqui divulgadas e os dados de 2022 levam a que o professor de Ciência Política não considere uma “surpresa que nesta fase o Chega consiga mais votos entre os jovens”. E detalha: “A ideia de que os jovens, como um todo, têm maior propensão para o Chega tem nuances: em 2022 foram sobretudo os homens jovens sem instrução superior quem revelou ter votado no Chega.”

Mais jovens a votar e mais indecisão

Olhando para as sondagens de Fevereiro de 2024 e Janeiro de 2022 do Cesop, a percentagem de jovens inquiridos que não tenciona votar no dia 10 de Março diminuiu (de 6% para 2%). Ao mesmo tempo, a percentagem de jovens indecisos cresceu 6 pontos percentuais.

“É provável que os jovens queiram ir votar mais agora porque os partidos novos atraem também novos votantes. Há mais oferta”, afirma José Almeida Ribeiro. E acrescenta que haver “formas de voto facilitadas”, como o voto antecipado em mobilidade, também é benéfico. Contudo, “mesmo que todos os jovens votassem, não iriam reduzir grandemente a abstenção”, diz, já que Portugal tem uma população envelhecida e “os jovens representam apenas cerca de 10% do número total de recenseados”.

Mas, “apesar de o universo [de jovens] ser pequeno, os partidos esforçam-se por ‘captar’ estes votos”. Por dois motivos, aponta Almeida Ribeiro: o primeiro é que “quanto mais cedo começam a votar, menos abstencionistas serão no futuro”. O segundo prende-se com “o impacto transmitido”: “Se [um partido] capta jovens, então é porque tem uma característica diferente, é porque tem as propostas correctas para o futuro.” (Publico, texto da jornalista Mariana Marques Tiago)

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