Várias instituições apelam para os governos acabarem com apoios extraordinários para não alimentar inflação. Em Portugal ainda há medidas abrangentes que não seguem os alertas. Os avisos multiplicam-se por parte de várias instituições internacionais: os apoios extraordinários implementados pelos governos devem chegar ao fim, ou pelo menos serem mais direcionados para a população mais carenciada, para evitar contribuir para a inflação. Apesar de todos estes avisos, o Governo português anunciou que vai avançar com mais apoios sociais, sendo de recordar que estão ainda em vigor várias medidas direcionadas para a generalidade da população que não vão ao encontro dos alertas de Bruxelas, do Banco Central Europeu (BCE) e da OCDE.
No discurso em que anunciou mais uma subida de 50 pontos base das taxas de juro diretoras, Christine Lagarde defendeu que “as medidas de apoio dos governos para proteger a economia do impacto dos altos preços da energia devem ser temporárias, direcionadas e adaptadas para preservar os incentivos para consumir menos energia”. “É importante começar rapidamente a reduzir essas medidas de forma concertada”, à medida que “os preços da energia baixam”, para evitar “aumentar as pressões inflacionistas a médio prazo”. Tal “exigiria uma resposta mais forte da política monetária”, avisou a presidente do BCE.
Este aviso não é o primeiro do género, sendo que depois de vários alertas a Comissão Europeia decidiu incluir a necessidade de gradualmente retirar os apoios relativos aos preços da energia nas orientações orçamentais para o próximo ano, quando voltam a estar em vigor as regras orçamentais da União Europeia. O comissário com a tutela da Economia, Paolo Gentiloni, citou ainda um estudo que concluiu que os apoios no âmbito da energia na União Europeia teriam custado menos 75% se fossem dirigidos apenas aos mais carenciados.
A OCDE também sinalizou, nas previsões económicas intercalares divulgadas na semana passada, que os apoios “têm de se tornar mais focados para os mais necessitados”. “Melhor direcionamento e uma redução oportuna no apoio geral ajudavam a garantir a sustentabilidade orçamental, preservar os incentivos para reduzir o uso de energia e limitar a procura adicional num momento de inflação alta”, argumentam. O secretário-geral da OCDE alertou mesmo, na apresentação do relatório, que a política orçamental “está a fazer o trabalho dos bancos centrais mais difícil”. O Governo português ainda não deu ouvidos aos alertas, sendo que estão ainda em vigor algumas medidas de resposta ao impacto do choque geopolítico. Entre elas encontram-se as medidas direcionadas aos combustíveis, que são também as mais representativas e que acabam por englobar toda a população que utiliza estes veículos.
Execução orçamental de janeiro de 2023
É um conjunto composto pela suspensão da taxa de carbono (impacto pela perda de receita fiscal de 91,9 milhões de euros, segundo a execução orçamental de janeiro), a redução do ISP equivalente à descida do IVA (impacto de 34,7 milhões) e a devolução da receita adicional de IVA (32,8 milhões). Está também em vigor a redução do IVA da eletricidade, que no entanto não tem impacto registado na execução de janeiro.
O Governo decidiu manter em vigor os apoios para mitigar os efeitos do aumento dos preços dos combustíveis durante o mês de março, ainda que com um desconto mais reduzido. A revisão deste pacote tem sido mensal, pelo que apenas no início de abril se voltará a discutir este apoio.
Segundo a Direção-Geral do Orçamento (DGO), “em janeiro, a execução reportada das medidas adotadas no âmbito da mitigação do choque geopolítico, levou a uma redução da receita em 166 milhões de euros e a um aumento da despesa total em 4,1 milhões de euros”.
Outras medidas incluem o apoio extraordinário às famílias e o apoio ao setor agrícola. As restantes políticas avançadas pelo Governo incluem-se naquelas mais diferenciadas, sendo dirigidas especificamente para as pessoas com menores rendimentos: o apoio extraordinário a titulares de rendimentos e prestações sociais, bem como os apoios a famílias mais carenciadas.
É de salientar também que em janeiro, ainda se registaram gastos da Segurança Social com medidas excecionais e temporárias da Covid-19, ainda que apenas de cerca de 100 mil euros. Já a despesa com subsídios registou um incremento de 1,1%, influenciado pelo impacto das medidas extraordinárias.
No campo das medidas Covid, a DGO nota ainda que “os pagamentos de impostos a realizar no futuro no âmbito das medidas de flexibilização adotadas no contexto da Covid-19 e do choque geopolítico, são contabilizados em contas nacionais no momento em que se gerou a obrigação de pagamento, ou seja, no mês em que deveria ter sido pago (por uma questão de simplificação, não se considera o ajustamento temporal dos impostos em contas nacionais)”.
Além destes apoios que ainda vão continuando em vigor, o primeiro-ministro anunciou esta quinta-feira que esta semana serão lançadas novas medidas de apoio às famílias. A dimensão vai depender dos números finais da execução orçamental de 2022.
Ainda não se sabe muito sobre os novos apoios, sendo de salientar que o ministro das Finanças já sinalizou que vai seguir os conselhos das instituições e recalibrar os apoios para os mais vulneráveis. Fernando Medina disse que o Governo fará um “ajustamento” dos apoios aos portugueses no contexto da inflação, concentrando-os “nos públicos mais vulneráveis” e “menos em medidas de banda larga”.
As mensagens começam no entanto a ser contraditórias, com a ministra do Trabalho a assegurar, esta sexta-feira, que o Governo vai continuar a ajudar as pessoas, nomeadamente as mais vulneráveis, apesar do apelo da presidente do BCE. “Aquilo que temos feito e continuaremos sempre a fazer é procurar em cada momento responder à situação das pessoas, nomeadamente focando-nos nas pessoas que estão em situação de maior vulnerabilidade”, disse Ana Mendes Godinho.
É de recordar ainda que o Governo avançou com um pacote de medidas para responder à crise na habitação, mas os avisos das instituições prendem-se mais com os apoios extraordinários relativos à subida dos preços da energia e dos alimentos. Além disso, as medidas em causa são direcionadas (ECO digital texto da jornalista Mariana Espírito Santo)
Sem comentários:
Enviar um comentário