sexta-feira, março 24, 2023

Quanto custa eleger um deputado? E conquistar um voto?

Várias conclusões se podem tirar das contas partidárias da campanha eleitoral de 2022. O PS consegue, em simultâneo, ter a campanha mais cara mas também a mais rentável (dividindo-se a despesa pelo número de votos obtidos e pelo número de deputados eleitos). Para ter o mesmo resultado do que o Livre, o PAN gastou quatro vezes mais. Com 19 mil euros elege-se um deputado socialista; e com 252 mil a deputada do PAN. Dois cafés "compram" um voto nos socialistas. Socialistas e liberais. O PS e a Iniciativa Liberal foram os campeões nas legislativas de 2022 no que respeita a derrapagens entre o que previam gastar nessa campanha eleitoral e o que efetivamente gastaram. Em valores absolutos, o PS esmaga todos os outros partidos: a sua campanha eleitoral custou quase um milhão de euros a mais do que o partido tinha inicialmente orçamentado. Passou de 2,45 milhões (custo previsto) para 3,38 milhões de euros (custo final). Um desvio de 38,2 pontos percentuais face ao inicialmente previsto.

Mas se no capítulo das derrapagens os socialistas são campeões em valores absolutos, já a Iniciativa Liberal bate todos os outros partidos parlamentares quanto ao desvio percentual. Os liberais gastaram mais 55% do que tinham inicialmente previsto. Uma campanha orçamentada em 385 mil euros acabou a custar quase 600 mil euros. Neste campeonato das derrapagens entre previsões e custos finais, destaque para o PSD e a CDU. Com estas duas formações ocorreu o contrário do que se viu em todas as outras: a despesa final foi inferior ao custo inicialmente previsto. No caso do PSD, a diferença é de 4,1% (quase 85 mil euros); no caso da coligação liderada pelos comunistas, a percentagem é superior: gastaram menos 20,6% do que tinham inicialmente orçamentado. Uma campanha que previam que custasse 695 mil euros acabou por custar 552 mil. Poupança: 143 mil euros.

Os números relativos às despesas e receitas dos partidos nas últimas legislativas constam no site da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos (ECFP). E permitem avaliar, por exemplo, a rentabilidade das campanhas. Ou seja: quanto custou a cada partido obter um voto; e quanto custou a cada partido eleger um deputado.

Assim, tendo sido a campanha do PS de longe a mais cara (3,4 milhões de euros), ela foi também - dado o resultado obtido pelo partido (maioria absoluta, com 2,3 milhões de votos a eleger 120 deputados) - a mais rentável. Cada deputado custou ao PS cerca de 19 mil euros. Foi o custo por candidato eleito mais baixo da campanha - 13 vezes menos do que o custo mais caro, o da eleição da deputada única do PAN, Inês Sousa Real, que custou mais de um quarto de milhão de euros (252 mil).

Mais pequenos, mais caros

O que esta contabilidade revela é que o custo médio da eleição de um deputado vai subindo à medida que os partidos são cada vez mais pequenos em número de deputados eleitos. Dito de outra forma: o deputado de eleição mais barata é o do PS, depois o do PSD, a seguir o do Chega - acompanhando esta progressão a ordem de grandeza dos partidos no Parlamento. Mas há uma exceção.

Essa exceção é o Livre. Tal como em 2019, o partido elegeu um único deputado. Depois de Joacine Katar-Moreira, agora Rui Tavares. Os números da ECFP revelam que a campanha do Livre foi incomparavelmente mais barata do que todas as outras. Não chegou a custar 60 mil euros.

Isto significa que o Livre conseguiu eleger um único deputado gastando quatro vezes menos do que o PAN, que também só elegeu a líder do partido, Inês Sousa Real, com o custo total de 252 mil euros. Aparentemente, a diferença resulta do facto de o Livre ter concentrado todo o seu esforço de campanha em torno de Rui Tavares, enquanto o PAN o dispersou por candidatos em vários círculos (pelo menos, além de Lisboa, Porto e Setúbal, onde em 2019 tinha conseguido eleger deputados, quatro ao todo).

O Livre conseguiu, assim, também ser o partido que menos gastou por voto obtido (e foram ao todo mais de 71 mil votos): 0,83 euros. A seguir, neste rácio (dinheiro gasto dividido pelo número total de votos) ficou o PSD (1,22 euros por voto) e depois o PS. Mais uma vez, a partir daí os valores acompanham inversamente a ordem de grandeza dos partidos: quanto mais pequenos são, mais dispendioso sai cada voto. O PAN foi, neste capítulo, novamente o partido menos rentável: cada um dos seus 88 127 votos custaram ao partido 2,85 euros.

Gasto inferior a 2019

As contas das campanhas que agora constam no site da ECFP revelam que, do ponto de vista da despesa real efetuada pelos partidos que obtiveram eleição parlamentar, o custo global foi ligeiramente mais baixo do que o das campanhas das legislativas de 2019. Ao todo, gastaram nas últimas eleições cerca de oito milhões de euros; enquanto em 2019 tinham gasto quase 8,2 milhões de euros.

Já o valor total da subvenção estatal aos partidos aumentou de seis para sete milhões entre as duas eleições - o que se deverá, em parte, ao facto de em 2019 nem o Chega nem a IL terem reclamado os seus créditos, tendo-o feito em 2022.

O PS, em valores absolutos, foi quem carregou mais nas despesas: em 2019 as despesas totais ascenderam a 2,9 milhões de euros e em 2022 subiram para 3,4 milhões. Já o PSD - liderado então por Rui Rio, que se gabava da contenção nos custos - manteve-se em níveis semelhantes: 1,8 milhões em 2019 e 1,9 em 2022. O número de deputados eleitos também quase não mudou, para os sociais-democratas: 77 nas últimas eleições e 79 nas anteriores.

BE e CDU cortam...

A diminuição global das despesas de campanha das penúltimas legislativas surge, assim, em grande parte, pelo esforço de contenção feito pelo Bloco de Esquerda e pela CDU.

Em 2019, o partido de Catarina Martins tinha tido uma despesa total de 1,3 milhões de euros (obtendo meio milhão de votos, que elegeram 19 deputados). Conscientes de que as legislativas de 2022 seriam já feitas em perda, dadas as circunstâncias que as geraram - rutura na geringonça, chumbo do OE2022, demissão do governo e convocação pelo Presidente de eleições antecipadas - os bloquistas baixaram os gastos para mais de metade: 590 mil euros.

...Chega e IL aumentam

Com os comunistas, foi a mesma coisa - pelas mesmas razões. A despesa total de campanha da CDU em 2019 foi de um milhão de euros (que "renderam" ao partido 332,4 mil votos, convertidos em 12 deputados eleitos); já em 2022, o gasto baixou para cerca de metade (551 mil euros) - e o número de deputados eleitos também (seis). Com o Chega e a Iniciativa Liberal (IL) passou-se exatamente o contrário. Tanto um como o outro entraram na campanha de 2022 esperando crescer substancialmente em número de votos e em deputados eleitos (em 2019 tinham conseguido um deputado cada).

Assim, Ventura e (na altura) Cotrim Figueiredo, líderes respetivamente do Chega e da IL, carregaram no acelerador das despesas. Estado gastou sete milhões no financiamento das campanhas de 2022: 64 cêntimos por eleitor inscrito.

Segundo a informação disponível na ECFP, a campanha do Chega custou, em 2019, 150 mil euros. Agora, nas legislaturas de 2022, esse valor mais que quadruplicou para 615,4 mil euros. O partido passou de um deputado para 12. De 67,8 mil votos cresceram para quase 400 mil.

Na Iniciativa Liberal passou-se a mesma coisa - embora aqui com uma enorme derrapagem entre custos orçamentados e despesa final. Em 2019, o partido gastou 65,6 mil euros e em 2022 quase 600 mil - a despesa aumentou quase dez vezes. O partido passou de um deputado eleito para oito. Os 67 681 votos das penúltimas legislativas passaram a 273,4 mil votos nas últimas. Contas apresentadas, resta agora à EFCP aprovar eventuais sanções por incumprimento (DN-Lisboa, textro do jornalista João Pedro Henriques)

Sem comentários: