domingo, novembro 07, 2021

Um PSD cheio de truques mas a caminho da normalidade

I.

Estou absolutamente convencido que a proposta de Rio para alargar a participação nas directas a todos os militantes, mesmo os que há dois anos não pagam quotas, foi uma rasteira deliberada urdida por aquela corte de desconhecidos que rodeia Rio, influenciada pelo desespero, provavelmente com o propósito de aumentar a confusão interna. Ou seja, com esta proposta anti-estatutária - logo ele, que se agarra tanto aos estatutos por tudo e por nada... - Rio em caso de derrota ou de vitória, estaria a abrir porta a mais uma palhaçada no PSD - como se não bastassem todas as palhaçadas nos últimos dias - nomeadamente a apresentação de recursos para tribunais externos ao PSD, inclusivamente o Tribunal Constitucional em última instância com todas as repercussões dai resultantes para o processo eleitoral interno que irremediavelmente teria que atrasar-se ainda mais ou inclusivamente teria até de ser anulado (o Chega, por exemplo, foi obrigado a directas e a um segundo congresso num ano devido a uma questão processual suscitada por um tribunal).

Sá Carneiro:

A política não é um jogo de partidos nem uma questão que só a eles diga respeito. É um problema da nação que a todos os Portugueses afecta e na qual todos estão imersos, pois lhe suportam pelo menos as consequências (Assembleia da República, 1978)

II.

Francamente não vejo qual o mal em o PSD promover directas e realizar congresso antes do Natal. Se Rangel ganhar, será uma alternativa nova depois de 4 anos sem vitórias nenhumas e sem que o PSD se tivesse afirmado inequivocamente como uma alternativa política credível, mobilizadora e consistente ao PS e a Costa. Se Rio ganhar, isso significa que para as bases social-democratas, na sua livre escolha entre duas pessoas, terão preferido, por segurança (?) manter tudo como está e não arriscar mudanças com eleições à porta. Mas seja qual for a opção das bases, o líder do PSD que sair destas directas e deste Congresso, sairá mais legitimado e mais reforçado do que qualquer líder que usasse de expedientes e truques estatutários, conforme a conveniência ou se socorresse da argumentação idiota como Rio repetidamente tem feito - tudo por que Rio quer ser candidato a primeiro-ministro à força e sonha com esse tacho e sabe que provavelmente esta será a sua última oportunidade política para o tentar, caso seja candidato e seja derrotado.

Sá Carneiro:

A pessoa humana define-se pela liberdade. Ser homem é ser livre. Coartar a liberdade é despersonalizar; suprimi-la desumaniza. A liberdade de pensar é a liberdade de ser, pois implica a liberdade de exprimir o pensamento e a de realizar na acção (Imprensa, 1969)

III.

O que me espanta é a apologia absolutamente irracional de acharem alguns que tudo podia ficar para depois das eleições. Para depois como? Com um PSD dividido em facções por não se ter realizado Congresso? Congresso com mais uma derrota do PSD que há 4 anos não ganha uma eleição nacional que seja? Com um PSD desmobilizado e desanimado e descrente em caso de insucesso nas urnas? Com mais uma potencial crise política e orçamental nos Açores onde a palhaçada política ali ocorrida, e alimentada apenas pela fome de poder, é de todos conhecida? Com um Rio derrotado e enxovalhado que teria andado tristemente a mendigar votos aos eleitores em geral, mas paradoxalmente - ou talvez não.... - "fugia como o diabo da cruz" das directas no seu próprio partido? Esses truques, que no passado muitos cometeram de forma autocrática e leviana, deixaram de fazer sentido e a democracia interna dos partidos não se compadece teorias ou egoísmos pessoais, com concepções políticas ultrapassadas e pouco democráticas e transparentes como algumas que andaram a ser discutidas e até lamentavelmente votadas (!)

Sá Carneiro:

Nunca me senti tão sozinho e nunca tive tanta certeza de estar tão certo (Imprensa, 1976)

IV.

Afinal alguém perguntou a Rio porque razão andam tantos filiados do PSD distantes do partido e sem qualquer actividade partidária incluindo o não pagamento de quotas? O que foi feito pela direcção de Rio para promover o regresso a casa de todos esses milhares de militantes que estão desligados ou distantes do partido? Seria agora, tentando envolvê-los nas directas sem o cumprimento das regras estatutárias, que isso seria resolvido? E quem sabe se foi esta liderança de Rio que aumentou esse distanciamento entre o PSD e muitos desses milhares de militantes hoje sem qualquer actividade partidária activa, muitos deles já terão até mudado de partido ou afastado da política e das urnas?

Pessoalmente contínuo a achar que a morte social e política do PSD - até que recupere de forma inequívoca, só depois de ser limpo de alto até baixo - começou com o “passismo” em 2011, e com descaracterização direitista e liberal do PSD, e manteve-se com Rio que está longe de trazer a dinâmica e a confiança que o PSD precisa. Como é que o PSD pode ter futuro se aquelas "famiglias" todas continuam por lá, desestabilizando, movendo-se nos subterrâneos da política, umas até beneficiando de espaço mediático e nas televisões?

Eu não estou com isto as dizer que votaria num em detrimento do outro porque também acho que Rangel é visto como uma mera extensão de segunda ou terceira categoria desse "passismo", que ele afrontou mas que depois a ele se acomodou bastando para tal o perfume da Europa, "passismo" que deixou marcas desastrosas na alma do PSD de Sá Carneiro.

O paradoxo de tudo isto é que esta liderança de Rio começou a alimentar a convicção, hoje existente em muitos militantes, que provavelmente caminhamos para um tempo em que o regresso dos que deram cabo do partido até passou a ser visto como um mal menor...

Aliás eu não entendo a dificuldade de Rio e da sua desconhecida corte de iluminados que o rodeia em associarem estas movimentações no PSD e esta alegada ligação de Rangel ao "passismo", com as presidenciais pós-Marcelo Rebelo de Sousa, presidenciais que já agitam, mais ou menos discretamente, os meandros da política nacional, ou melhor dizendo, a agitar as mentes de alguns protocandidatos.

Sá Carneiro:

Não somos nem queremos ser um partido de quadros ou de elites (Imprensa,1974)

V.

O PSD, que sempre olhou com desconfiança para as teorias dos iluminados salvadores da treta, tem que interiorizar e dar resposta a uma questão muito simples e que o mais simples anónimo dos seus militantes certamente coloca: "Afinal o que é que penalizaria e prejudicaria mais o PSD? Fazer Congresso antes do Natal ou deixar tudo numa paz podre que desestabilizaria? Será que as tais elites iluminadas do PSD acham mesmo, digam-me sinceramente, que os eleitores do partido, aqueles que votam, fielmente no PSD independentemente de quem o lidera e das asneiradas das lideranças e dos truques e passes de magia? Falo de muitos oportunistas que rodeiam os líderes e que abusivamente falam em Sá Carneiro por tudo e por nada, quando na realidade a sua "praxis" é um insulto à sua memória.

Sá Carneiro:

"Nós, Partido Social Democrata, não temos qualquer afinidade com as forças de direita, nós não somos nem seremos nunca uma força de direita (Congresso do PSD, 1978)

LFM

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