sábado, novembro 06, 2021

Nomeações, negócios e até privatizações: Viagem pelas polémicas decisões de última hora dos Governos

Passos Coelho privatizou a TAP dois dias depois do seu programa de Governo ter sido chumbado no Parlamento; ministros de Durão Barroso assinaram um decreto que iria abater mais de dois mil sobreiros: as decisões em contra relógio que deram mau resultado. O Governo assinou, na semana passada, 14 contratos, num só dia, com empresas privadas para concessões de exploração e prospeção de minérios. Entre eles encontra-se a polémica concessão para a exploração de lítio em Argemela, Covilhã ou a concessão de volfrâmio, em Montalegre, que poderão avançar assim que os estudos de impacte ambiental tiverem parecer favorável. O Executivo garante que a lei foi cumprida e lembra que a avaliação ambiental ainda será feita, mas a população já admitiu que vai recorrer aos tribunais. Com a prometida dissolução do Parlamento e as legislativas à porta, pode este ser mais um caso de uma decisão em contra relógio tomada por um Governo de saída?

Privatização da TAP

O contrato que transferiu 61% do capital da TAP para o consórcio Atlantic Gateway (2015) foi assinado, à porta fechada, dois dias depois de o programa do segundo Governo de Pedro Passos Coelho (PSD e CDS) ter sido chumbado na Assembleia da República. O Executivo durou apenas 27 dias, 16 dos quais em gestão, mas concluiu a promessa de privatizar a companhia aérea portuguesa, decisão revertida pelo Governo de Costa, que viria a tomar posse a seguir. “Tratou-se de uma situação absolutamente inadiável. Faz parte das responsabilidades de quem governa, em qualquer circunstância não deixar que aconteçam danos gravosos ao país”, justificou a privatização da TAP durante um Governo de gestão, na altura, a ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque.

Dois mil sobreiros para abater

Faltavam quatro dias para as eleições legislativas quando os ministros do Turismo, Ambiente e Agricultura do Governo de Durão Barroso, substituído por Pedro Santana Lopes, assinaram um polémico despacho que permitia à empresa Portucale, do Grupo Espírito Santo, abater mais de dois mil sobreiros na Herdade da Vargem Fresca, em Benavente, para construir um empreendimento turístico. No despacho, o projeto era descrito como sendo de “imprescindível utilidade pública”, “relevante e sustentável interesse para a economia local e regional que pode permitir a criação de um considerável número de postos de trabalho”. As associações ambientalistas apressaram-se a organizar protestos contra a decisão, que envolvia abater 2605 sobreiros dentro da Reserva Ecológica Nacional e a justiça viria a dar-lhes razão. Foi ordenada a suspensão imediata das obras, mas já tinham sido abatidas quase mil árvores. Esta não era a primeira tentativa de construção na herdade. A iniciativa ultrapassou sucessivos Governos e, em 1995, Duarte Silva, o ministro da Agricultura de Cavaco Silva chegou mesmo a dar autorização ao projeto, nas vésperas da sua saída do Executivo. No entanto, o seu sucessor, Gomes da Silva, travou o abate.

SIRESP

O contrato do Sistema Integrado das Redes de Emergência e Segurança de Portugal (SIRESP) quase que não podia ter sido feito mais encostado à mudança de Governo: Daniel Sanches, o antigo ministro da Administração Interna de Santana Lopes, assinou o contrato de adjudicação três dias depois das eleições legislativas de 2005 (que deram a vitória ao PS com José Sócrates). Numa entrevista ao Expresso, em 2017, Daniel Sanches explicou que considerou “um ato de interesse público” urgente a contratação de um sistema de comunicações eficaz para ajudar no combate aos incêndios. O despacho de adjudicação assinado por Daniel Sanches foi entendido como não admissível e anulado por António Costa, que tomou conta da pasta da Administração Interna no Governo de Sócrates, tendo iniciado conversações com o mesmo consórcio depois.

Nomeações na reta final

Nas semanas que antecederam a dissolução da Assembleia da República, em 2005, quando o Presidente Jorge Sampaio fez uso da bomba atómica para expulsar Pedro Santana Lopes do poder, o então Primeiro-Ministro fez uma série de nomeações. Entre elas, o presidente da comissão política da concelhia do PSD/Aveiro, Ulisses Pereira, foi nomeado para a Agência Nacional para o Programa da Juventude (ANPJ) e três dias antes de o Governo passar a ser de gestão Isabel Meireles, Maria Rita Sousa e Pedro Cortes Picciochi passaram a integrar o conselho diretivo da Agência Portuguesa de Segurança Alimentar.

Na reta final do seu segundo mandato, Pedro Passos Coelho fez o mesmo e assessores, técnicos especialistas, adjuntos, motoristas, auxiliares, chefes de gabinete, secretárias ocuparam lugares nos ministérios das Finanças, Segurança Social, Ambiente, Justiça, Agricultura, Economia, Cultura e Saúde, dias antes do Governo deixar de o ser. As nomeações perfizeram quase uma centena e foram publicadas em Diário da República no dia em que que o Presidente da República chamou António Costa para formar um novo Executivo.

Mesmo assim, os exemplos acima citados não chegam ao número de nomeações feitas por José Sócrates, em 2011, quando o Governo estava já demissionário. De acordo com o Diário de Notícias, o governante assinou 85 nomeações e 71 promoções. A maioria aconteceu no ministério da Administração Interna (Lusa)

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