São três da tarde e a
esplanada do bar. Os Castrinhos está quase cheia. Os clientes vêm pelas sandes
e, claro, pela poncha, que tem fama de ser das melhores. Três jovens sentados
numa mesa à sombra vieram por isso e para socializar. Luana Sousa está no
secundário, Pedro Andrade e Carlota Mota entraram em setembro para a
Universidade de Évora, mas a pandemia trocou-lhes as voltas. Ainda aguentaram
os primeiros meses, vieram de férias no Natal e regressaram ao continente, mas
a 10 de fevereiro decidiram que, se era para ter aulas online, era melhor
tê-las em casa, na Madeira.
“Fomos poucas vezes à
universidade e não tivemos praxe, nada do que é a vida académica.” Depois de
ponderar todas as variáveis, Pedro, que entrou em Desporto, decidiu arrumar as
malas e fazer o resto do semestre em casa. “Ao menos aqui temos qualidade de
vida”, explica Carlota, que anda no 1º ano de Enfermagem e acredita que, se
calhar, no próximo ano, terá direito a experimentar o ambiente universitário.
Por enquanto, a melhor opção é estar onde, pelo menos, é possível beber uma
poncha de maracujá com os amigos.
A regra é fechar às 18h
(com recolher obrigatório às 19h) e esse horário num bar que vende poncha é um
rombo, tal como é nos restaurantes que só podem servir almoços ou fazer
take-away. José Abreu é sócio do Londres há 45 anos, um estabelecimento com
nome na baixa do Funchal, e não se lembra de viver uma crise como esta. Os
turistas representavam metade da clientela, agora são muito poucos e, não fosse
a fama do cozido às quintas-feiras, seria ainda mais difícil encontrar maneira
de pagar aos 13 empregados.
Todos os dias faz uma
ginástica para gerir os stocks e, apesar das quebras acima dos 70%, não tem
dúvidas: “É melhor estar aberto.” É a esta ideia que se agarram os comerciantes
enquanto esperam por clientes. “A situação é desastrosa”, confessa Manuela
Pereira, dona de uma sapataria no centro do Funchal. A manhã até nem correu
mal, conseguiu vender uns ténis, mas a falta de turistas e o teletrabalho
imposto para conter o número de novos casos de covid-19 — a Madeira chegou a
ter o maior Rt do país — fez estragos.
60 CASOS DIÁRIOS DE COVID
A questão é saber quantas
aguentam até à chegada da ajuda e ao desconfinamento dos mercados emissores de
turistas. A estratégia de manter a economia a funcionar é uma tentativa de dar
alguma liquidez aos negócios, enquanto as autoridades regionais de saúde
procuram conter a pandemia sem confinamento geral. Os números têm descido muito
mais devagar, a média está nos 60 casos diários.
O arquipélago, que passou
a primeira onda sem mortos, soma já mais de 60, mas continua a haver camas para
os doentes nos serviços de saúde, o que tem permitido viver uma quase
normalidade. A larga maioria dos alunos das escolas da Madeira, cerca de 30
mil, continua a ter aulas presenciais e apenas os jovens que frequentam o
secundário e o 3º ciclo do ensino regular estão com aulas online.
O desporto escolar e as
atividades desportivas federadas estiveram suspensos — esta semana deverão ser
desconfinados os desportos individuais, como o ténis e o tenis de mesa —, mas
os ginásios continuam a funcionar com aulas de grupo ao ar livre e número
limitado de pessoas nos espaços interiores. Também não existem entraves para ir
cortar o cabelo ou arranjar as unhas. Todos os cabeleireiros e gabinetes de
estética estão autorizados a funcionar.
“Não é como antes”, explica Annie Dias, cabeleireira, enquanto seca o cabelo a uma cliente. São três neste salão no Funchal, estão todas ocupadas mas os tempos já foram melhores. “As senhoras de mais idade, que vinham todas as semanas aparecem menos. E como há menos turismo, há menos dinheiro. O pior foi no ano passado, quando ficámos 45 dias fechados e sem poder trabalhar.” Mas isso foi em 2020. Na Madeira de 2021 a vida de todos os dias é quase normal, mas só até às 18h (Expresso, texto da jornalista Marta Caires, correspondente no Funchal, fotos da reportagem)
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