Começarei por referir - para marcar bem posições - que
sou totalmente contrário à existência da figura do Representante da República -
hoje apenas uma personagem nomeada pelo Presidente da República mas com
competências diminutas e portanto sem grande razão de ser institucional e
constitucionalmente falando - tal como era relativamente ao Ministro da
República. Isto nada tem a ver com as pessoas que exercem essas funções,
credoras de todo o meu respeito, apesar de um desses protagonistas no cargo ter
sido incapaz de separar o trigo do joio, confundindo as críticas que eram
feitas ao cargo - nomeadamente ao seu enquadramento institucional, depois de
esvaziado de competências e importância, ao papel dúbio que lhe era atribuído
no contexto regional, etc - de questões meramente pessoais, ainda por cima
quando na minha vida nunca falei com a pessoa.
Recentemente, em Angra do Heroísmo, durante um
encontro com o Representante da República nos Açores, a comitiva de que eu
fazia parte percebeu claramente que a figura hoje é mais um acompanhante do
processo autonómico, repetindo várias vezes que por natureza é uma pessoa
reservada e que não gosta de ter intervenções públicas que possam ter
aproveitamentos políticos. Pessoa simpática, antigo diplomata prestigiado,
conhecedor da realidade açoriana, estudioso do tema autonómico, fiquei com
muito boa impressão da pessoa em questão, não confundindo isso com a minha
posição pessoal e política sobre o cargo propriamente dito.
Há dias, depois da cerimónia autárquica em Câmara de
Lobos, parece que ficaram todos "escandalizados" pelo facto do Representante da República não ter sido convidado. Fracamente,
40 anos depois da autonomia regional e esta submissão continua intratável? Que
desilusão! Obviamente que a pergunta, em situações normais, seria o contrário:
porque razão o Representante da República
é convidado pelas Câmaras Municipais da oposição, e porque razão o
titular nomeado pelo Presidente e sem os poderes que teve outrora, aceita esse
papel de "ouvidor" do reino, sabendo perfeitamente que não tem
nenhuma competência em matéria autárquica na Região. Aliás, parece-me que seria
de bom tom, acho eu, que o titular do cargo optasse por uma atitude de maior
reserva pública, menos mediatizada, pois isso não constitui nenhuma mais-valia
para o cargo ou desprestígio para quem o desempenha. E muito menos tem alguma
coisa a ver com a pessoa do dr. Irineu Barreto, que muito prezo e respeito, por
sinal irmão de uma figura que esteve envolvida activamente no processo
autonómico depois do 25 de Abril e na afirmação de uma nova Madeira. Estou a
falar do Representante da República que não devia imiscuir-se em actos públicos
claramente fora da sua competência, onde não há qualquer representação
institucional da República, sem a sabedoria de perceber que está a ser usado,
por puro oportunismo partidário, como um mero instrumento numa
"guerra" política e partidária entre autarquias da oposição e o
governo regional, tudo com as eleições regionais de 2019 no horizonte. Nada é
ingénuo, nada acontece por acaso.
Orador nessa cerimónia autárquica, Tranquada Gomes,
presidente do parlamento regional, colocou abertamente o dedo na ferida - aliás
já tinha feito declarações semelhantes em entrevista no passado - quando
referiu ter sido a primeira vez, desde que assumiu o cargo de Presidente da
Assembleia, que recebeu um convite que, "contrariamente a todos os outros
que sempre recebo por ocasião dos aniversários dos concelhos da nossa Região
Autónoma, não se limitou a convidar-me para estar presente ou assistir".
Apesar de muito sinceramente ter alguma dificuldade, também, em ver o
presidente do parlamento presidir a actos de natureza autárquica em concreto.
Sublinhando que estes eventos relativos a cerimónias
do poder local regional "assumem um carácter vincadamente regional",
Tranquada lembrou que ele era o
"primeiro titular do primeiro órgão de governo da nossa Região Autónoma que representa toda
a população madeirense e portosantense". Gostem ou não é isso mesmo que
acontece, seja o PSD, PS, CDS, ou qualquer outro partido na liderança do
parlamento regional.
"Como tenho vindo a sublinhar, parece-me
importante e necessário que as instituições locais valorizem os órgãos de
governo próprio, independentemente das diferenças ideológicas ou das opções
partidárias dos eleitos. Cada instituição na região tem o seu espaço, as suas
competências e a correspondente
legitimidade. Confundir eleitos com nomeados fragiliza as instituições
autonómicas e ofusca de forma irresponsável a legitimidade dos eleitos. Não
podemos, por um lado, reclamar a defesa da autonomia como uma prioridade
colectiva e uma obrigação da classe política e por outro ter procedimentos que
vão exactamente em sentido oposto, contra essa alegada predisposição
autonomista. Não se trata de reclamar protagonismo a favor de quem quer que
seja. Trata-se apenas, como tenho vindo a enfatizar, de recomendar que a
Assembleia Legislativa, representante máxima da vontade livre e
democraticamente expressa pelos cidadãos, não seja menorizada e relegada para
protagonismos secundários ou transformada num actor de segundo plano, numa
encenação na qual, paradoxalmente, até parece que a afirmação da Autonomia
Regional passa pela valorização mediática e institucional de respeitáveis
entidades nomeadas".
Obviamente que a polémica surgiu mas a verdade é que
isto tinha que ser dito, dito em voz alta para que as pessoas percebam do que
falamos e do que realmente está em causa.
Se a ideia é no fundo demonstrar uma submissão que
deixou de fazer sentido num quadro institucional que 40 depois da autonomia é
diferente e de respeito mútuo, então melhor será que, em vez de se alimentarem
farsas - isto apenas no caso dos madeirenses não terem espinha dorsal nem
orgulho e dignidade a defender - que se revoguem as normas constitucionais
imediatamente bem como toda a restante
legislação e se volte aos tempos do antes do 25 de Abril, com uma Junta Geral
comandada à distancia por Lisboa e onde tudo era pedido pela Madeira como se se
uma esmola se tratasse (LFM)
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