“Era impossível tirar-lhe a bola sem fazer falta. O
inventor do “drible da foquinha” ficou mundialmente conhecido não por driblar
com os pés, mas sim com a cabeça.
Assim como o Clark Kent e o Super-Homem, poucas
pessoas conhecem Kerlon Moura Souza, mas quase todos os brasileiros sabem quem
é o “Foquinha”. A promessa do futebol, que surgiu nos escalões de formação do
Cruzeiro, distinguiu-se por passar pelos adversários usando, literalmente, a cabeça.
No campo, Kerlon era um jogador habilidoso, mas não era o seu talento com os
pés que o tornava especial. A sua singularidade estava no “drible da foquinha”,
o que na teoria não é nada inovador, já que se resume a fazer “toques” com a
cabeça. Na prática, por outro lado, é um enorme desafio. Equilibrar a bola e
passar entre os adversários em simultâneo requer muita habilidade. Mas, uma vez
dominada a técnica, Kerlon descobriu que poderia driblar quem quisesse, pelo
menos até sofrer uma falta. Nasceram, assim, duas identidades: Kerlon, o
jogador, e “Foquinha”, o showman.
Quer na selecção brasileira (sub-17 e sub-20), quer no
Cruzeiro, o artifício com a cabeça foi exaustivamente utilizado. O que era, no
início, um show-off bonito de se ver, passou a ser um sinal de provocação aos
olhos dos adversários. Deste modo, ao invés de simples faltas, o “Foquinha”
começou a ser atacado em campo. Para os cruzeirenses, o brasileiro continuava a
ser o herói dentro das quatro linhas, mas para os outros, era visto como o
vilão do fair-play. O culminar da polémica deu-se no dia 16 de Setembro de
2007, durante um jogo na casa do Atlético Mineiro, a equipa rival do Cruzeiro.
Ora, num derby onde os anfitriões estão a perder por 4-3, os ânimos já estão
exaltados, e o drible do jogador (79 minutos) pareceu, aos atleticanos, uma
atitude ofensiva. Por conseguinte, o agredido passou a ser agressor, gerando
uma confusão generalizada no estádio, com direito à expulsão de um jogador do
Atlético Mineiro. Desde então, o “Foquinha” desapareceu.
Algum tempo se passou, até Kerlon ser contratado pelo
Chievo, em 2008 (onde participou em quatro jogos) e pelo Inter de Milão, no ano
seguinte (não jogou nenhum jogo). As lesões e o aumento do peso fizeram com que
o brasileiro decaísse gradualmente de rendimento. Entretanto, a reputação de
promessa descia a pique e a sua outra identidade, bastante polémica, continuava
desaparecida do mapa. Quatro longos anos se passaram até o “Foquinha” de
outrora reaparecer, mas não da forma que os adeptos do Cruzeiro imaginavam. Foi
na garrafa de um refrigerante japonês, criada em homenagem ao jogador quando
este foi para o Japão, que a antiga estrela ressurgiu. Kerlon, por outro lado,
ainda tentou repetir a sua famosa artimanha pelo Fujieda MYFC (terceira divisão
nipónica), mas não conseguiu.
Hoje, a antiga promessa brasileira tem 26 anos e
encontra-se nos Weymouth Wales, uma equipa de Barbados. O jogador é
considerado, pelos brasileiros, um dos maiores flops do futebol actual,
enquanto o “Foquinha” só vive nos registos
históricos” (texto do jornalista do Público Alexandre Richa, com a
devida vénia)
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