O Chile é o
terceiro país com mais pessoas vacinadas no mundo, graças a um eficiente plano
de vacinação. Mas uma nova vaga de contágios obrigou ao fecho das fronteiras e
ao adiamento das eleições autárquicas. O que é que aconteceu? As fronteiras do
Chile vão estar fechadas pelo menos durante todo o mês de abril e só reabrirão
em maio caso a situação esteja controlada. As eleições autárquicas, que estavam
marcadas para 10 e 11 deste mês, foram adiadas pelo menos por seis semanas. E a
circulação é atualmente permitida apenas aos detentores de passes diários por
questões profissionais.
Aos fins de semana, todos os outros cidadãos só podem sair de casa uma vez por dia para comprar bens essenciais. São mais de 16 milhões de pessoas que estão confinadas. Outra vez. Teve de ser, não se cansa de dizer o Governo, mas nem precisava. Nestes últimos dias, as imagens dos contentores refrigerados junto à morgue do Hospital Carlos Van Buren, em Valparaíso, a apenas 120 quilómetros de Santiago, a capital, lembram aquilo que vimos acontecer em Portugal no final de janeiro, e são mais do que suficientes para justificar a obrigação de ficar em casa. A surpresa e o choque, porém, foram grandes. A falta de espaço para mais cadáveres naquele hospital surge num momento em que mais de um terço da população já se encontra vacinada. Graças a um rápido processo de vacinação, mais de 6 milhões de chilenos receberam, pelo menos, a primeira dose da vacina contra a Covid-19. O mundo chamou-lhe mesmo “o milagre chileno”.
Não se tratou de
nenhum facto sobrenatural, como é óbvio. O terceiro lugar no pódio que o Chile
ocupa no mundo já vacinado explica-se de maneira prosaica e deve-se, sobretudo,
à visão do presidente, Sebastián Piñera, conhecido pelo seu talento de
negociador. Foi este economista e empresário multimilionário, de 71 anos, quem
mexeu os cordelinhos para o país chegar a um processo de vacinação rápido e
eficiente.
Logo em maio do
ano passado, por sua iniciativa, os ministérios da Saúde, Ciências e Tecnologia
chilenos estabeleceram contactos e acordos com os principais laboratórios que
estavam a desenvolver vacinas no resto do mundo. Grandes farmacêuticas foram,
então, convidadas a realizar no Chile ensaios clínicos de Fase 3 para testar
vacinas contra a Covid.
Na mesma altura,
Piñera também se reuniu com os reitores das universidades chilenas que mantêm
programas de investigação com as suas congéneres nos Estados Unidos e na
Europa, e não só. Há vários anos que a Universidade Católica do Chile, por
exemplo, trabalha com o laboratório chinês que produz a vacina Sinovac.
Tudo isto levou a
que o Chile tivesse à sua disposição vacinas a um bom preço e muito cedo. Mas o
“milagre”, sabe-se agora, levou a uma falsa sensação de segurança. Ter quase
40% da população vacinada com, pelo menos, a primeira dose da vacina não é
suficiente para relaxar as medidas de contenção da pandemia. Já se ultrapassou
1 milhão de casos, quando a chamada imunidade de rebanho estava prevista para
julho.
Bastaram as férias
grandes gozadas durante o verão austral (21 de dezembro a 20 de março) para
mais de 5 milhões de pessoas se movimentarem sem controlos sanitários – dentro
e fora do país, sendo que um dos destinos mais procurados pelos chilenos é o
Brasil, onde por essa altura surgiu uma variante do vírus. Ao mesmo tempo,
reabriram as lojas, os ginásios, as igrejas e quase todas as atividades. Pouco
depois de as crianças voltarem às escolas, o Chile estava com uma média de sete
mil pessoas infetadas por dia. Segundo o Governo, mais de 95% dos ventiladores
estão atualmente ocupados.
Esta segunda onda
de contágios seria um completo paradoxo, uma contradição nos seus termos, se
não estivéssemos já habituados a ser surpreendidos pela Covid-19. Especialistas
da Organização Mundial da Saúde vieram agora dizer que “enquanto a vacinação
não chegar à maioria da população, o rumo da pandemia não muda” (Visão)
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