quinta-feira, fevereiro 06, 2025

Justiça: Tutti Frutti, o complot para tramar José Eduardo Martins

Acusação detalha como Sérgio Azevedo e Luís Newton terão tomado de assalto a bancada do PSD na AML, onde se distribuíam lugares e avenças. “Mas tu achas que eu vou dar um gabinete pó gajo gerir e meter quem quer a trabalhar e a gente não controla nada? Tu és doido?” Uma das histórias mais emblemáticas do processo Tutti Frutti, cuja acusação do Ministério Público (MP) foi conhecida esta semana, foi a forma como a candidatura de José Eduardo Martins a líder da bancada do PSD na Assembleia Municipal de Lisboa (AML) terá sido boicotada nos bastidores por Sérgio Azevedo e Luís Newton (deputado, presidente da junta de freguesia da Estrela e que acabaria por ficar com o lugar). Era um cargo fundamental e será a primeira vez que é explicado num processo o que há muito se sabe no meio autárquico de Lisboa: o esquema dos assessores-fantasma.

A AML é um lugar estratégico nos jogos de bastidores dos partidos, uma vez que é dado a cada grupo parlamentar um orçamento para contratarem assessores. Não é feito qualquer tipo de controlo sobre estas avenças e todos os partidos sabem que muitas delas são fantasmas. Ou são, alegadamente, usadas para favores a amigos pessoais e políticos, ou para pagamentos a funcionários de partidos (que assim deixam de ter essa despesa laboral). José Eduardo Martins seria o candidato natural ao lugar de líder da bancada do PSD por ter sido o primeiro eleito da lista nessas eleições. Mas havia quem tivesse outros planos, no entendimento do MP.

"A Comissão Política de Secção do PSD Lisboa, designadamente Paulo Quadrado, Luís Newton, e, também Sérgio Azevedo, no contexto da aliança entre os núcleos Oriental e Ocidental de Lisboa, mobilizaram-se para angariar apoio a uma candidatura alternativa que fosse encabeçada por Luís Newton, o que lhes permitia manter o controlo das nomeações para os lugares de assessores nos gabinetes de apoio e granjeava protagonismo para Luís Newton."

A 20 de julho de 2017, Sérgio Azevedo viria a ser escutado ao telefone com Carlos Reis, hoje deputado municipal e deputado no Parlamento: "Mas tu achas que eu vou dar um gabinete pó gajo [José Eduardo Martins] gerir e meter quem quer a trabalhar e a gente não controla nada? Tu és doido? Ó Carlos."

Para se ter uma ideia do que se está a falar, e do que acima se disse, foi o próprio Sérgio Azevedo (que era precisamente líder cessante da bancada do PSD na AML) a explicá-lo nesse telefonema: "É que o gabinete, sabes quanto tem de orçamento por mês? O gabinete tem €12.000 de orçamento por mês, tu podes contratar gajos, com requisições à Câmara ilimitadas. E tu achas que eu vou por ali um gabinete para o Zé Eduardo [Martins], ó Reis só se eu fosse maluco."

Em 12 de outubro de 2017, já depois das eleições, José Eduardo Martins "ligou a Sérgio Azevedo, questionando-o sobre o funcionamento do gabinete de apoio do grupo municipal da AML, dando-lhe a entender que pretendia introduzir alterações relativamente às pessoas que 'nunca lá apareciam'", lê-se na acusação. É uma referência às alegadas avenças fantasmas.

A acusação detalha uma série de démarches de Sérgio Azevedo para angariar apoios para a candidatura de Luís Newton e para boicotar a de José Eduardo Martins, que tinha "de ser corrido", para usar a sua expressão num telefonema com o deputado Pedro Pinto.

O boicote incluiu a ausência numa reunião do grupo municipal agendada a pedido de José Eduardo Martins, "à qual Sérgio Azevedo e Luís Newton decidiram que os seus apoiantes não iriam, incluindo Vasco Morgado, com quem Sérgio Azevedo falou", diz o MP.

Nesse dia, Sérgio Azevedo voltou a ligar a Pedro Pinto: "Eu andei aqui a proteger o Luís [Newton] e a arranjar e a foder os gajos e a dar o corpo às balas para fodê-los para o Luís ser candidato àquela merda. (…) Sabes o que é que eu vou fazer? De tudo para o Zé [Eduardo Martins] não ser o líder da bancada, isso é o que eu vou fazer. O Newton faz muita merda, mas o gajo a mim não me fode. Pronto." José Eduardo Martins, que foi ouvido neste processo como testemunha, acabaria por retirar a candidatura. Luís Newton foi eleito e ligou a Sérgio Azevedo: "Um grande obrigado por tudo".

E começou a distribuição de lugares, lê-se na acusação: "Luís Newton, como acertado com Sérgio Azevedo, quando assumiu o cargo indicou para integrar o gabinete de apoio ao grupo municipal, Nuno Vitoriano e Filipa Lages. Também como acertado com Paulo Quadrado, indicou para integrar o gabinete, Patrícia Brito Leitão, Afonso Costa e o próprio Paulo Quadrado" (Sabado, texto do jornalista Marco Alves)

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