quarta-feira, fevereiro 24, 2016

Vergonha: Constitucional aplica em 2016 multas relativas às presidenciais de 2011! Sem o envolvimento do Tribunal de Contas a política não conquistará a sua credibilidade

Tomamos ontem conhecimento de um acórdão do Tribunal  Constitucional que em meu entender apenas comprova a necessidade de termos que repensar tudo isto, concretamente o processo de verificação e controlo dos gastos políticos em campanhas eleitorais ao mesmo nível do controlo das despesas dos partidos que recebem recursos financeiros do estado, mais concretamente dos parlamentos onde estão representados.
Eu não tenho dúvidas, e admito que esteja numa posição muito longe de ser maioritária - por motivos que não vou agora desenvolver - que o Tribunal de Contas tem que ter outra envolvência neste processo. Perguntar-me-ão qual e como? Não sou capaz de responder neste momento, porque acho ser  importante uma abordagem prévia e corajosa ao problema que conduza à inevitável elaboração de legislação na Assembleia da República que não deixe dúvidas nem alimente a ambiguidade mas que devolva ao Tribunal de Contas o papel que neste contexto já teve. Então se defendo, e não me repugna nada, que deve ser este Tribunal a controlar o uso dado pelos partidos aos recursos financeiros obtidos por via de subvenções públicas, porque razão tinha que pensar de forma diferente quando se trata de um processo de controlo das despesas por parte dos candidatos presidenciais que darão origem ao recebimento posterior de subvenções financeiras por parte da Assembleia da República, conforme determina a lei?
Como é possível que o Tribunal Constitucional demore cinco anos (!) para se pronunciar sobre as contas dos candidatos presidenciais referentes a despesas realizadas na campanha eleitoral de 2011?! Como?! Isso mesmo, as presidenciais de 2016 já se realizaram, já temos um novo PR eleito que aguarda a chegada da data da sua posse e andamos a noticiar e a discutir multas aplicadas no quadro das presidenciais de 2011! Alguma coisa não funciona bem desde logo quando me parece importante salvaguardar a credibilidade e a respeitabilidade do Tribunal Constitucional enquanto instituição judicial situada no topo da estrutura piramidal da justiça portuguesa. Ninguém sai dignificado nesta triste imagem que é dada da política, mais uma.
Recordo apenas para memória futura, a decisão tomada no acórdão ontem divulgado:
"III – Decisão
Nos termos e pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide:
a) Condenar o candidato Aníbal António Cavaco Silva, pela prática da contraordenação prevista e punida no n.º 1 do 31.º da Lei n.º 19/2003, na coima de €700,00;
b) Condenar o mandatário financeiro nacional do candidato Aníbal António Cavaco Silva, Vasco Jorge Valdez Ferreira Matias, pela prática da contraordenação prevista no n.º 1 do artigo 31.º da Lei n.º 19/2003, na coima de €1.100,00;
c) Condenar o candidato Fernando José de La Vieter Ribeiro Nobre, pela prática da contraordenação prevista e punida no n.º 1 do 31.º da Lei n.º 19/2003, na coima de €1.900,00;
d) Condenar o mandatário financeiro nacional do candidato Fernando José de La Vieter Ribeiro Nobre, António Manuel Lucas Craveiro, pela prática da contraordenação prevista no n.º 1 do artigo 31.º da Lei n.º 19/2003, na coima de €3.000,00;
e) Condenar o candidato Francisco José de Almeida Lopes, pela prática da contraordenação prevista e punida no n.º 1 do 31.º da Lei n.º 19/2003, na coima de €950,00;
f) Condenar a mandatária financeira nacional do candidato Francisco José de Almeida Lopes, Maria Manuela Simão Pinto Ângelo Santos, pela prática da contraordenação prevista no n.º 1 do artigo 31.º da Lei n.º 19/2003, na coima de €1.500,00;
g) Condenar o candidato José Manuel da Mata Vieira Coelho, pela prática da contraordenação prevista e punida no n.º 1 do 31.º da Lei n.º 19/2003, na coima de €540,00;
h) Condenar o mandatário financeiro nacional do candidato José Manuel da Mata Vieira Coelho, Baltasar de Carvalho Machado Gonçalves de Aguiar, pela prática da contraordenação prevista no n.º 1 do artigo 31.º da Lei n.º 19/2003, na coima de €850,00;
i) Condenar o candidato Manuel Alegre de Melo Duarte, pela prática da contraordenação prevista e punida no nº 1 do 31.º da Lei n.º 19/2003, na coima de €1.900,00;
j) Condenar o mandatário financeiro nacional do candidato Manuel Alegre de Melo Duarte, António Carlos dos Santos, pela prática da contraordenação prevista no n.º 1 do artigo 31.º da Lei n.º 19/2003, na coima de €3.000,00 (fonte: acórdão do TC)

Eu não estou a culpar o Tribunal Constitucional por esta situação. Melhor dizendo, culpo-o também, mas não lhe atribuo responsabilidades exclusivas. O TC não tem competência para esta matéria, não tem que andar a fiscalizar contas de candidatos e tem que ter a dignidade e a coragem de dar um murro na mesa e de exigir do estado que resolva urgentemente esta situação: ou o Tribunal de Contas avança com mais poderes e recupera competências que lhe foram retiradas - não me repugna que até sejam alargadas, ou a chamada Entidade de Contas dos Partidos é integrada no Tribunal de Contas ou na Comissão Nacional de Eleições ou mesmo dissolvida para que se pense numa solução única para todos os políticos, sejam partidos ou candidatos.  Pessoalmente julgo que a Comissão Nacional de Eleições - caso o Tribunal de Contas não esteja muito interessado em ver reforçados os seus poderes, criando ele na sua estrutura orgânica um serviço específico para este fim -  pode criar uma estrutura própria para este fim, liderada por um magistrado indicado pelo Tribunal de Contas indicar. Estamos a falar de contas, de "papel", de controlo de documentos, de verbas públicas que são distribuídas depois deste controlo rigoroso, processos estes que muito francamente nem o Tribunal Constitucional nem a Comissão Nacional de Eleições estão vocacionados. Mas no caso desta última entidade, ainda seria admissível em vez de estarmos a assistir as um pouco dignificante enterrar-se na lama, sem culpa própria de um Tribunal Constitucional que, repito, devia recusar-se a este papel absurdo e pouco eficaz como se constata (LFM)

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