“Hoje
6 de Maio de 2014. Há quarenta anos o PSD de Sá Carneiro, Magalhães Mota e
Pinto Balsemão - destacados deputados da chamada "ala liberal" da
Assembleia Nacional do regime anterior - dava os seus primeiros passos,
iniciando um longo percurso político marcado por sucessos e descalabros, por
méritos e desastres. O PSD, no fundo tal como os demais partidos, é o que os
seus militantes querem (e permitem) que seja. Ninguém tem direito, de fora, de
querer moldar os partidos em função das suas opiniões não militantes. Também
não duvido que os partidos não são "coutadas" de ninguém. São
instituições que vivem para os cidadãos o para (e pelo) país em geral e que se
afirmam pelo que valem, assumindo uma importância política e social que é construída
na exata proporção das suas responsabilidades e da credibilidade.
Os
partidos em democracia não têm donos, não precisam de donos. Hoje nem sequer as
chamadas referências ideológicas fazem muito sentido, porque os próprios
partidos têm dificuldades acrescidas para se identificarem ideologicamente,
dado o caos quase constante na diferenciação das ideologias e dos panoramas
ideológicos europeus onde se encaixam os diferentes partidos.
Quarenta
anos de vida de um partido significa, obviamente, no caso do PSD, anos de
poder, outros de oposição. Falamos de uma caminhada difícil - no caso do PSD
ela foi ainda mais acentuada nos primeiros tempos que coincidiram com o PREC e
no qual era "proibitivo" pensar de forma diferente daqueles que
tentaram apoderar-se da revolução portuguesa e encaminhá-la para a órbita
ideológica e política da ex-URSS em plena "Guerra Fria". Foram anos
de contradições, de vitórias e derrotas, de erros, más escolhas, decisões
erradas, de desilusões, de promessas não cumpridas, de adaptações, de mudanças
estatutárias, de alterações na própria base social de apoio. Mas de sucessos,
de afirmação, de dinâmica, de valorização da democracia portuguesa também.
Sobretudo também de vitórias. Os partidos vivem das vitórias eleitorais. Tal
como no futebol, na política não há "vitórias morais". Os partidos ou
ganham ou perdem eleições, ou são poder ou são oposição. Não há terceiras
escolhas. Não há outros caminhos.
No
quadro destas comemorações dos 40 anos do PSD, cerca de 40 pessoas estarão hoje
reunidas na Madeira num restaurante para assinalar esta caminhada. Mas
sobretudo para assinalarem 40 anos de escolha, pois há 40 anos tomaram uma
opção de militância, quando o PSD nem era poder, quando não havia lugares a
distribuir por ninguém, quando inclusivamente não se sabia sequer o rumo da democracia
portuguesa e do país.
Sá
Carneiro foi sempre um apoiante da Madeira, que visitou diversas vezes. Com o
primeiro governo da antiga AD várias decisões importantes para a nossa região
foram tomadas por ele, cumprindo os compromissos assumidos, exatamente o oposto
do que hoje lamentavelmente acontece. Profissionalmente tive oportunidade de
estar algumas vezes com o fundador e Presidente do PSD e dele guardo uma imagem
de cordialidade. Sobretudo de um político confiante e de um homem sereno.
Hoje,
com um PSD que pouco ou nada tem a ver com as ideias e os propósitos dos seus
fundadores, sobretudo de Sá Carneiro, considero que é recomendável que se
recorde, pelas afirmações proferidas, exatamente essa grande personalidade que
teve em Dezembro de 1980 o fim trágico que todos recordam, sem que ninguém conheça,
quase 25 anos depois, a verdade de um acidente que nunca deixou de ter uma
vertente política e criminosa subjacente. Um homem que viveu com dignidade, com
coerência, com coragem a sua vida, que se afirmou pelos seus méritos, pela sua
simplicidade e pela sua habilidade política:
- "A pessoa humana define-se pela
liberdade. Ser homem é ser livre. Coartar a liberdade é despersonalizar;
suprimi-la desumaniza. A liberdade de pensar é a liberdade de ser, pois implica
a liberdade de exprimir o pensamento e a de realizar na acção" - Imprensa
(1969)
- "O fim principal do poder político é
o serviço da pessoa. O Estado está ao serviço da pessoa" - Assembleia
Nacional (1971)
- "O que não posso, porque não tenho
esse direito, é calar-me, seja sob que pretexto for" - Assembleia Nacional
(1972)
- "Sem um crescimento económico não
sairemos da atual situação de penúria que impõe, sobretudo às classes mais
desfavorecidas, uma vida abaixo do nível a que se tem direito" - Imprensa
(1974)
- "O que há é que impor uma disciplina
de atuação do poder económico e dos investimentos, para que ele seja feito com
proveito de todos nós e não apenas para os detentores do poder" - Imprensa
(1974)
- "Sectores como a saúde, educação e
outros fazem parte das atribuições e são responsabilidade do sector
público" - Imprensa (1974)
- "Sei que o meu destino é morrer cedo
e só concebo a vida se for vivida vertiginosamente" - Correspondência
(1977);
- "Não há futuro económico e social
possível quando o problema principal não é o excesso de consumo privado, com o
que nos querem convencer, mas o excesso de consumo público, a monstruosidade
das despesas públicas" - Comício (1978)
- O nosso Povo tem sempre correspondido nas
alturas de crise. As elites, as chamadas elites, é que quase sempre o traíram,
e nós estamos a ver mais uma vez que o Povo Português foi defraudado da sua
boa-fé" - Congresso do PSD (1978)
- "Nós, Partido Social Democrata, não
temos qualquer afinidade com as forças de direita, nós não somos nem seremos
nunca uma força de direita" - Congresso do PSD (1978)
- "Nós vivemos num país de inutilidade
pública, inutilidade pública que custa caríssimo e que afinal, agora, querem
que continue a proliferar, obrigando os particulares a suportar todo o peso da
crise económica" - Comício (1978)
- "Quem quer constituir família
procura casa e emprego e não os encontra. Os que trabalharam toda uma vida
veem-se, no fim dela, condenados a morrer à míngua" - Assembleia da
República (1978) (JM)
