quinta-feira, novembro 10, 2022

Coleção Berardo. 1,8 mil milhões, fim do arresto e adeus ao CCB?

 

Valorização das obras abre portas ao fim da apreensão judicial. Advogados de Joe Berardo contestam pretensões "abusivas e de má-fé" de Novo Banco, CGD e BCP. Ministério da Cultura admite negociar com quem for o proprietário da coleção se as obras saírem do CCB. O que em 2008 valia quase 316 milhões de euros, avaliação feita pela Christie"s, e em 2009 mais de 509 milhões, avaliação da Gary Nader, vale hoje quase 1,5 mil milhões de euros. A nova avaliação da arrestada Coleção Berardo, também da Gary Nader, ontem entregue no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, na ação principal de que depende o arresto da coleção, sustenta o requerimento dos advogados de Joe Berardo que contesta o pedido "de indemnização" do Novo Banco, CGD e BCP alegando que é "fundado numa pretensa desvalorização do penhor". "É abusivo e de má-fé alegar a insuficiência da garantia para cobrança de todo o crédito, pois tal insuficiência já se verificava, aliás, aquando da constituição do penhor e nunca poderia fundar o direito a qualquer indemnização" que, ainda, não foi quantificada pelos bancos, argumentam.

Explicam os advogados que "na data de convenção do penhor, 31 de Dezembro de 2008, existia uma avaliação do Volume I da Colecção Berardo realizada pela Christie"s no valor de 316 milhões de euros. Foi esse o valor relevante para efeitos da constituição da Garantia, pois na altura os Bancos não consideraram sequer de valorizar os volumes II e III da colecção. É esse o valor a considerar para efeitos de aferir qualquer desvalorização da garantia juridicamente relevante de acordo com as regras do Código Civil".

E, sustentam, "não tendo havido manifestamente desvalorização da garantia, antes tendo havido a valorização efetivamente verificada, esta ação [dos bancos] não pode proceder".

No total, a coleção que "se mantém integralmente no património da Associação Coleção Berardo" está avaliada, pela Gary Nader, em 1,8 mil milhões de euros se "for adquirida na sua totalidade" ou 1,5 mil milhões no caso de ser vendida "peça a peça".

Ou seja: há dinheiro, não existe "desvalorização do penhor", não há razão para o arresto das obras.

A conclusão dos advogados de Joe Berardo é a de que "no único plano em que legitimamente pode colocar-se a pretensão dos Bancos Autores, o da cobrança dos seus alegados créditos, a situação dos Bancos Autores está até melhorada".

Mais ainda, acrescentam, "pode dizer-se" que Novo Banco, CGD e BCP, "ou os adquirentes dos títulos empenhados, que poderão ser os próprios Bancos Autores, nunca deixarão de ter acesso às obras, porquanto, nos termos dos Estatutos da Associação Coleção Berardo, os adquirentes dos títulos em execução têm direito à amortização dos mesmos, recebendo o seu correspondente valor em dinheiro ou, no limite, bens da Associação Coleção Berardo de valor estabelecido por avaliação independente".

Dito de outra forma: "é evidente é que Joe Berardo detém património mais que suficiente para suprir uma hipotética dívida aos bancos que a reclamam", diz fonte ligada ao processo.

O empresário reclama mais de 900 milhões de indemnização aos bancos por não lhe terem dado informação sobre o risco real "das instituições" quando comprou ações a crédito; os bancos numa ação executiva, entregue em tribunal, querem cobrar "dívidas" de Joe Berardo no valor de 962 milhões de euros.

Sem argumentos de "insuficiência da garantia para cobrança de todo o crédito" e, por isso, sem razão para qualquer "indemnização", e dada a avaliação de que a coleção Berardo "vale hoje praticamente o triplo" de 2009, se o arresto "cair" a Associação Coleção Berardo fica a dispor da coleção e em tese "provável", até porque o Estado denunciou o acordo existente sobre a coleção de arte cujo prazo expira a 31 de dezembro deste ano, as obras do Museu Coleção Berardo podem sair do CCB.

A denúncia pelo Estado do protocolo assinado com José Berardo, que terá efeitos a 1 de janeiro de 2023, se outro acordo para a cedência e exposição pública não for entretanto negociado entre as partes envolvidas, abre portas a que um arresto (que "até final do ano é pouco provável porque as decisões têm recurso") deite por terra parte do plano do Ministério da Cultura de criar no CCB um novo museu de arte contemporânea que reunisse várias coleções (para além da Coleção Berardo) e permite à Associação Coleção Berardo retirar as obras do CCB.

O Ministério da Cultura, questionado pelo DN, afirma que "uma vez existindo uma decisão dos tribunais sobre o processo [o fim do arresto], estará disponível para negociar com quem for o proprietário da coleção. Até ao momento dessa decisão, há um quadro de incerteza judicial e, nesse quadro, cabe ao Estado ser um fator de previsibilidade e de segurança. É o que tem sido feito e continuará a acontecer".

E, nesse sentido, reitera que "o Estado está disponível para assegurar a preservação e a fruição pública da coleção Berardo se os termos do arresto se mantiverem". O Ministério da Cultura entende que "a determinação de arresto, por decisão judicial, não está relacionada com o protocolo que foi denunciado", que é somente "uma decisão do Tribunal, num processo em que o Estado não é parte" (DN-Lisboa, texto do jornalista Artur Cassiano)

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