domingo, junho 16, 2024

Nota: porque acho que Chega e JPP deviam aguardar até Março de 2025


Resolvi escrever um pequeno texto, libertando-me de qualquer vínculo partidário - acreditem as pessoas se quiserem ou não - e tentando ser pragmático e sério na abordagem do tema, sem especulações ou derivas "amarradas" seja ao que for. Falo do motivo porque acho que nem JPP nem Chega deviam votar contra o programa de governo e que deviam ser seguidos nessa lógica pelo PAN e pela IL. Vou enumerar alguns itens que pretendo sustentem a minha lógica de análise, que obviamente é apenas decorrência de uma opinião pessoal num contexto político, parlamentar, social, económico de que não há memória na Madeira:

1 - O PSD-M já devia ter afirmado - mas como sempre alguns erros comunicacionais que o fragilizam e alimentaram a especulação e a dúvida junto das pessoas - que não teme eleições antecipadas, embora valorizando a ideia essencial de que os madeirenses estão fartos de eleições e que não estão dispostos a serem usados em jogos partidários pouco claros e alguns deles pouco sérios. E que os partidos não precisam de sacrificar os interesses da RAM, mais imediatos – caso de um orçamento para 2024, com retroactividade a Janeiro de 2024 nalguns domínios e rubricas, apenas possível, com um governo regional devidamente legitimado para o fazer – e não com um governo derrubado ou em gestão.

2 - Nunca percebi a lógica do PSD-M que passou uma campanha eleitoral sem ter a coragem de assumir perante as pessoas um compromisso inequívoco de combate a toda e qualquer forma de corrupção na vida pública, tenha ela a natureza que tiver. Também não percebo o receio do PSD-M em assumir o combate à pobreza como uma prioridade programática em vez de andar a divagar em torno do tema atolando-se em conversas da treta desvalorizadoras de uma realidade cada vez mais presente na sociedade, seja ela regional, nacional ou europeia.

3 - Não entendi até hoje que tipo de negociações - se é que as houve - existiram entre o PSD-M e os demais partidos da oposição, com quem e porque falharam, se for caso disso. Era sabido que depois daquela encenação - o que dirá o eleitorado madeirense a tudo isso - protagonizada por PS e JPP, um dia depois das eleições, mesmo sabendo que tudo não passou de foguetes de pólvora seca, PSD e CDS, por forma do acordo, tinham apenas 21 votos a favor do programa de governo, quando eram necessários pelo menos 24. Acham mesmo que um programa de governo com umas "pinceladas" retiradas de propostas veiculadas pela oposição não socialista na campanha eleitoral, resolvia o assunto? Mas será que vivem na terra, que têm os pés bem assentes na terra? Ou andam na lua, divagando, sonhando com soluções impossíveis e condicionando ou manipulando os factos e a realidade?

4 - Com 21 votos (PSD + CDS) de um lado e 20 votos (PS e JPP) do outro, e com PAN e IL (2 votos) a não poderem resolver nada, pelo menos de forma decisiva, resta o Chega com os seus 4 deputados a tentar assumir o papel decisivo. Foi o eleitorado que votou nessa solução da direita radical, foram os madeirenses que acharam "piada" a essa solução (pese o crescimento de apenas pouco mais de 500 votos entre 2023 e 2024) e de eu acreditar que agora começam a perceber o "quadro" que nada tem a ver com a teoria.

5 - É óbvio que o PS e o JPP utilizam a minoria que têm no parlamento (20 deputados) para irem a reboque do Chega (4 deputados), porque sabem que sem o Chega a votar contra, o governo social-democrata não cairia. E fazem isso descaradamente, nem precisam de disfarçar o que pensam e com o que contam, na medida em que sabem, tal como o PSD-M sabe, que o Chega anunciou há muito a recusa em votar a favor, não do programa de governo, nem de um governo do PSD - indiscutivelmente o vencedor das eleições nas urnas, algo que cada vez mais conta menos na política - mas de Miguel Albuquerque. E o JPP sabe se vai manter em próximas eleições os mesmos votos e deputados? Duvido imenso. E tem a certeza do que dirão os eleitores ao "negócio" político e parlamentar feito com o PS, em menos de 24 horas, quando parece óbvio, pela leitura dos resultados, que os eleitores votaram no JPP e não no PS que apenas aumentou 137 votos comparativamente às regionais de 2023?

5 - Porque acho que Chega e JPP não deviam votar contra o programa de governo, mesmo que tenham, e obviamente que terão, naturais divergências, motivos de queixa e diferenças ideológicas substanciais com o PSD e sobretudo com Albuquerque? Em primeiro lugar é óbvio que o PS-M, sistematicamente derrotado nas urnas - e voltará a ser derrotado em novas eleições - não consegue em campo o que quer obter na secretaria, ou seja, governar sem ganhar eleições, arrastando debaixo da asa os partidos que forem necessários a uma maioria parlamentar e estiverem disponíveis a alinhar na palhaçada. O PS-M, que se coloca num patamar superior face aos demais partidos da oposição, não teve dificuldade em convencer o JPP em alinhar na sua estratégia, dando corpo àquela coligação, anunciada um dia depois das eleições, mas que eu acho que Paulo Cafofo não percebeu - ou se percebeu disfarçou bem e desvalorizou o assunto - o que estava subjacente à anuência do JPP.

Admito que existem afinidades normais entre os dois partidos, que identifico, desde o momento em que Filipe Sousa, então deputado do PS no parlamento regional,  e outros conhecidos militantes socialistas, abandonaram o PS-M por divergências que, recordo-me muito bem, tiveram origem na gestão da rotatividade dos deputados eleitos. Se tiverem dúvidas basta consultarem os jornais da época, está lá tudo! E por falar em oportunismo político, o que dizer do anúncio de Cafofo de que o PS-M avançará com uma moção de censura ao governo de Albuquerque? Para tirar protagonismo ao JPP? Para neutralizar o Chega, diabolizar a direita radical, mas rogar aos santos e aos pecadores a obtenção dos seus votos contra, sem os quais nada feito?

7 - Qual seria a alternativa mais plausível na lógica desde meu texto de oposição? Votar um programa de governo, neste quadro político regional, significa tudo e o seu contrário. Um partido que se abstenha na votação de um programa de governo - e o parlamento regional reúne para discutir e votar programas de governo, não o estatuto de arguido seja de quem for - isso não significa que dá a anuência ao documento, que não passa de um mero rol de intenções ou enumeração de compromissos que, depois são consubstanciados nos orçamentos e planos de investimentos - esses sim, verdadeiramente os documentos-chave de uma governação e de uma Legislatura e sujeitos a discussão e votação pelos deputados, na generalidade e na especialidade. Sem a queda do programa do governo teríamos um governo regional, sempre amarrado de curto pelo parlamento, e movendo-se no trapézio, com legitimidade para apresentar urgentemente um orçamento para o que resta de 2024 - e não tentem desvalorizar hipocritamente a gestão por os duodécimos, porque uma coisa são as tiradas com muita partidarite à mistura e sem lógica subjacente, outra cosia é a realidade de uma governação aos solavancos dos duodécimos. E eventualmente avançar com uma primeira proposta de orçamento regional para 2025. Depois de aprovada a proposta orçamental para 2024, "normalizando" a situação que há muito deveria estar normalizada, nada impede que os partidos da oposição refaçam as suas agendas políticas e parlamentares e, a partir de Março de 2025 - ano de eleições autárquicas! - avancem com iniciativas destinadas a fazerem o que perigosamente anunciam que farão agora sem medirem as consequências, em meu entender. Os Madeirenses - que votaram nas regionais de Setembro de 2023, nas legislativas de Março de 2024, nas regionais de Maio de 2024 e nas europeias de Junho de 2024 - vão aceitar tudo isto de ânimo leve, vão ser cúmplices deste massacre eleitoral e deste consequente impasse político e governativo que penaliza a região e o seu povo, sem reagirem depois, quando tiverem oportunidade disso?

8- Lembram-se o que aconteceu nas regionais de 2019 e nas legislativas nacionais de 2022, depois das eleições que levaram a geringonça de esquerda ao poder em 2019? Depois do PS de António Costa ter assumido a liderança e os louros (?) dessa geringonça, o que aconteceu em Março de 2022, quando o PS de Costa obteve uma maioria absoluta e quase arrasou nas urnas os seus parceiros de coligação? E lembram-se do que aconteceu em 2019 na Madeira quando o PS apostou na bipolarização - algo que fez, e falhou, nas regionais de 2024 - e deu cabo de todos os demais pequenos partidos da oposição? É com essa bipolarização que o PS-M volta a sonhar. Por mim, que fique claro, eleições antecipadas teriam dois desfechos que tenho como adquiridos: PCP e Bloco voltariam ao parlamento regional, de onde foram afastados injustamente, vítimas do voto útil, que em Maio de 2024 beneficiou o JPP e não o PS, e o PSD-M recuperaria alguns milhares de eleitores que votaram no JPP, na convicção de que desta vez não existiriam campanhas internas vergonhosamente implementadas (e não vou desenvolver mais este assunto...) de apelo ao voto útil no JPP para "castigarem" o Albuquerque só porque este ganhou as directas!

9 - Afinal Miguel Albuquerque é acusado do quê? A Assembleia Legislativa da Madeira e o Conselho de Estado já receberam do Ministério Público, ou qualquer Tribunal,  algum pedido do levantamento da imunidade parlamentar para que Albuquerque seja legalmente ouvido e preste declarações, ficando ele próprio a conhecer as acusações que existem contra ele? A atribuição do estatuto de arguido condena alguém? O Chega ao pretender afastar Albuquerque só porque acha que é culpado de alguma coisa em abstrato, sem fundamentos judiciais para o fazer, não está a correr o risco de ver que atitudes iguais sejam depois tomadas contra militantes ou dirigentes seus que a seu tempo serão confrontados - alguns já o foram - com problemas com a justiça? O Chega faz a apologia da condenação de uma pessoa na praça pública, sem que a mesma seja formalmente acusada, julgada e condenada por quem de direito? Nunca vi o Chega reclamar medidas tão radicais contra autarcas, por exemplo que mesmo arguidos continuam em funções. Não é arriscado para o Chega, que apenas aumentou cerca de 500 votos entre as regionais de 2023 e as de 2024, beneficiando do voto útil de eleitorado social-democrata, radicalizar as suas posições com base nestes pressupostos? Que fique claro: se o MP ou algum Tribunal solicitar o levantamento da imunidade de Albuquerque, o parlamento regional tem a obrigação de o fazer e Albuquerque o dever de solicitar ao Conselho de Estado que seja feito o mesmo. Quanto a isso nenhuma dúvida. Mas até que isso aconteça com que direito apontam o dedo ou lançam a suspeição contra quem quer que seja? E, já agora, a colagem do Chega ao PS na Assembleia da República não será uma das causas políticas - deliberadamente escondidas - para a queda eleitoral do Chega nas europeias?

10 - Finalmente, e sem perder tempo com as "marcelices" tontas de uma pessoa instável, com uma imagem em queda, que tenta desesperadamente disfarçar situações em que alegadamente estará acusado no quadro da sua função - e que usou com celeridade a dissolução de três parlamentos originando as crises que de uma maneira geral estão à vista de todos ou em banho-maria, aguardando apenas uma melhor oportunidade... - gostaria de saber se o Representante da República na Madeira vai deixar que acentuem a sua inutilidade institucional, deixando que os madeirenses se convençam que se trata de uma figura usada por uns e por outros, conforme as conveniências, ou se vai dar um murro na mesa, com a legitimidade dos seus mais de 80 anos de idade, e em defesa da sua dignidade institucional vai esclarecer os madeirenses, caso o GRM seja derrubado no parlamento, do que se passou nas audiências concedidas em São Lourenço. E porque digo isto? Quando Irineu Barreto convidou Albuquerque a formar governo, fê-lo, incompreensivelmente, com uma excessiva pressa, pressionando os partidos e retirando-lhes espaço para eventuais negociações.

Recordo a notícia de 28 de Maio de 2024, segundo a qual o representante da República para a Madeira, "anunciou que ia indigitar Miguel Albuquerque (PSD) como presidente do Governo Regional, considerando que a solução conjunta de PS e JPP "não tem qualquer hipótese de ter sucesso". Ireneu Barreto explicou que a indigitação se devia ao facto de considerar que Albuquerque "terá todas as condições de ver o seu programa aprovado na Assembleia Legislativa".

Perante os factos e o desfecho mais previsível, caso não tenhamos um ainda possível e recomendável recuo estratégico de alguns dos protagonistas deste complicado processo, que garantias teve afinal Irineu Barreto, e dadas por quem, de que o programa de governo regional seria aprovado no parlamento? Ou foi apenas uma perigosa dedução pessoal? Confesso o meu interesse em saber o que ele tem a dizer sobre esta situação, aliás recomendando que oiçam atentamente o comentário de Marcelo quando confrontado pelos jornalistas com a opção do Representante da República... (LFM)

 

Nota final: o PSD-Madeira do que não pode nem deve ter qualquer receio, aconteça o que acontecer, é de eleições antecipadas, embora se esse desfecho se confirmar, deve reunir urgentemente os seus órgãos dirigentes - eleitos num contexto diferente do que existirá em caso de recusa do programa de governo e queda do governo - e debater tudo o que deve ser debatido, sem tabus, sem  constrangimentos, sem receios, porque o partido é um coletivo que tem que ser símbolo de liberdade, mesma na divergência de opiniões.

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