terça-feira, março 19, 2019

Tragédia nas contas da TAP: amargo de boca para António Costa e desfeita para a política de Pedro Marques

As contas da TAP serão aprovadas esta semana e constituem um problema para o Governo e para o atual presidente executivo, Antonoaldo Neves. Ao contrário dos lucros de 21,2 milhões de euros apresentados pela TAP em 2017, as atuais perspetivas sobre os resultados de 2018 são uma tragédia para a transportadora aérea, mas mesmo assim podem vir a ser menos brutais que o intervalo que de se falava em fevereiro para o valor do prejuízo – entre 150 e 180 milhões de euros. Porém, uma coisa é certa: não deixam de ser um dos piores testes para o primeiro ano de exercício do presidente executivo, Antonoaldo Neves. Para o primeiro Ministro António Costa – que concretizou a reversão da maioria do capital privado, reconquistando para o Estado 50% da TAP – têm um inegável amargo de boca e para o ex-ministro que tutelou a TAP, Pedro Marques, são uma desfeita na sua política, atendendo a que várias vezes disse que os problemas da TAP são só “dores de crescimento”.

Desde fevereiro que o Governo não sabe como há-de lidar com o problema da TAP. Há cerca de um mês, o jornalista Nicolau Santos, presidente da Agência Lusa, comentou na rubrica “Contas do Dia” da Antena1 – ao jornalista José Carlos Trindade – que o problema da TAP era grave e que os prejuízos de 2018 seriam muito superiores a 100 milhões de euros. A informação preliminar que corria na altura – ainda muito longe do fecho de contas – apontava, entre outras parcelas, para cerca de 30 milhões de euros de indemnizações pagas a passageiros por problemas com os voos, mais cerca de 80 milhões de euros em acréscimos na fatura do combustível e cerca de 10 milhões de euros em aplicações financeiras. Do lado operacional, havia constrangimentos nas opções dos aviões colocados a fazer a ponte aérea Lisboa-Porto, que não eram os mais competitivos para os passageiros, e havia ecos de dificuldades no relacionamento entre a administração e os acionistas, evidenciando um fluxo de informação insatisfatório sobre decisões imediatas e relevantes para a vida da companhia.
O Jornal Económico contactou com diversas fontes da TAP, que deram indicações sobre a breve conclusão das contas – a sua aprovação deve ocorrer esta semana -, com a respectiva fixação do valor definitivo para o resultado negativo de 2018. Algumas fontes admitiram que o prejuízo conseguirá ficar abaixo dos 150 milhões de euros, mas ressalvaram que mesmo assim ainda era difícil ter certezas sobre valores consolidados. Politicamente, esta situação é muito delicada, atendendo ao impacto que os resultados preliminares do ano passado têm causado desde fevereiro. Mas tudo indica que a semana que começa este domingo, 17 de março, será a definitiva, em que a administração da TAP terá de encarar o problema de forma objetiva perante os acionistas –, o Estado, os trabalhadores e os privados.
Além de constituir um problema político para o primeiro ministro António Costa e para o ex-ministro do Planeamento e das Infraestruturas, Pedro Marques, agora cabeça de lista do PS às eleições europeias, constitui efetivamente a pior das provas para o primeiro ano de mandato do novo responsável executivo da TAP, Antonoaldo Neves.
Os prejuízos da TAP em 2018 apanham o primeiro ministro António Costa numa situação pouco ou nada confortável, porque ocorrem depois do Governo ter concretizado a reversão da maioria do capital privado, reconquistando para o Estado a participação de 50% do capital da TAP, que juntamente com os 5% colocados nos trabalhadores, remetem os acionistas privados para uma participação de 45%. Além disso, António Costa viu nomeado o advogado Diogo Lacerda Machado para administrador não executivo da TAP – uma nomeação que foi alvo de muitas críticas em diversos quadrantes políticos –, que assim passou diretamente de consultor do Governo para membro não executivo da transportadora aérea. No entanto, o Estado com 50% da TAP não tem administradores executivos na empresa.
Mesmo assim, não deixou de ser este amigo próximo de António Costa, o advogado Diogo Lacerda Machado, quem tratou – pro bono – da própria reversão da privatização da TAP, além de ter feito outros trabalhos de consultoria como por exemplo a não menos célebre “solução” para os lesados do BES. Esta nomeação de Lacerda Machado foi entendida politicamente como “moeda de troca” de António Costa para a nomeação do social-democrata António Frasquilho para chairman da TAP. No meio desta polémica, a TAP transformou-se num palco para as guerrilhas políticas e para os “mentideros” de várias newsletters. Na própria folha informativa do PSD, o deputado social democrata Leite Ramos acusou Lacerda Machado de estar “intimamente ligado ao problema financeiro da TAP”, recordando que, enquanto administrador da Geocapital, “foi responsável pelo buraco enorme da empresa de manutenção no Brasil”. Mas Lacerda Machado defendeu-se, contra-atacando que tinha tornado possível reconfigurar a privatização da TAP “num modelo em que os privados investem o mesmo, mas ficam com 45% do capital da empresa, em vez dos 61%. Para Pedro Marques também não poderia ter havido uma forma mais negativa de deixar para a posteridade o fim da sua passagem pelo Governo – um grande prejuízo nas contas da TAP, além do extenso rol de problemas no sector dos transportes, em que a situação calamitosa dos comboios é a mais grave – onde figuram a vetusta linha de Cascais e a automotora diesel da linha do Algarve.
Neste sentido, o novo presidente executivo, Antonoaldo Neves, falhou o teste do seu primeiro ano de atividade, depois de ter feito uma entrada em força, bastante dura para a anterior gestão de Fernando Pinto – admitindo que com novos acionistas, com possibilidade de injetar dinheiro na TAP, o desempenho da transportadora seria mais pujante do que foi durante os anos da gestão de Fernando Pinto, que fechou o exercício de 2017 com um lucro de 21,2 milhões de euros. O empresário e acionista David Neeleman adota uma posição confiante, tendo comprado por 49 milhões de euros a participação indireta dos chinesas da HNA, que saem da TAP na sequência de problemas complexos no desenvolvimento das operações internacionais do seu grupo, que continua a desinvestir, alienando participações em várias geografias.
Quanto ao acionista português, Humberto Pedrosa, também mantém expectativas confiantes, tendo o seu filho David Pedrosa como administrador executivo – numa comissão executiva que integra Antonoaldo Neves e Raffael Guaritá Quintas. Miguel Frasquilho, como chaiman, já veio dizer publicamente que o ano de 2018 não correu bem. Do elenco da administração figuram também Bernardo Trindade, ex-secretário de Estado do Turismo que se tornou uma referência do sector do transporte aéreo porque foi um dos grandes impulsionadores da entrada em Portugal da Ryanair e Esmeralda Dourado, que transitou para a TAP, deixando para trás a tragédia do afundamento do Grupo SIVA. Finalmente, ainda há o caso do administrador da TAP António Gomes de Menezes, que foi presidente executivo da transportadora aérea suíça PrivatAir, que alugava aviões com configurações para a Classe Executiva e abriu falência junto dos tribunais suíços, apesar de ter tido grandes clientes como as companhias Lufthansa, SAS e British Airways (texto de João Palma Ferreira, do Jornal Económico)

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