O confronto entre a procuradora-geral da
Venezuela, Luisa Ortega Díaz, e o Executivo de Nicolás Maduro se exacerba
rapidamente. A chefe do Ministério Público, antiga aliada do chavismo, promove
vigorosamente o desafio legal à Assembleia Constituinte convocada pelo
presidente. A concordância entre o chavismo crítico da deriva totalitária do
regime e a oposição aglutinada na Mesa da Unidade Democrática (MUD) começa a
ficar evidente. Ambos os setores parecem determinados a se aliar para forçar a
saída Maduro.
A primeira prova de que a procuradora e a MUD
aproximam suas posições ocorreu na segunda-feira. A aliança de oposição chamou
seus seguidores a comparecer à sede do Tribunal Supremo de Justiça, em Caracas,
para fazer parte da iniciativa de Ortega Díaz contra a convocação da
Constituinte, a aposta de Maduro para liquidar seus adversários com a desculpa
de escrever uma nova Constituição. Na segunda-feira, a Sala Eleitoral do
Supremo, controlada pelo regime, não aceitou o pedido da procuradora por uma
“inepta acumulação de pretensões”, ou seja, por pedir no mesmo documento a
nulidade das ações de vários órgãos dos poderes públicos.
A procuradora respondeu imediatamente com três
solicitações que demonstram que a fratura com o Governo é definitiva: um
julgamento de mérito contra seis membros titulares e dois suplentes da Sala
Constitucional que, no fim de março, mediante duas sentenças, liquidaram as
competências do Parlamento e concederam poderes ditatoriais a Maduro; uma
medida cautelar para que os magistrados dessa Sala deixem seus cargos; e o
desligamento de 13 magistrados titulares e 20 suplentes nomeados nos estertores
da legislatura anterior da Assembleia Nacional, então controlada pelo chavismo,
quando se sabia que a MUD assumiria o controle desse poder público.
Tais nomeações foram questionadas pelos
partidos da oposição porque os juízes faziam parte do Partido Socialista Unido
da Venezuela, eram simpatizantes declarados do Governo bolivariano e não
cumpriam os requisitos da comissão de nomeações. Ortega Díaz acabou apoiando
essas denúncias quando contou que, na época, havia questionado as nomeações.
“Não denunciei essas irregularidades antes porque não tinha podido analisar as
provas. [...] Esse processo estava viciado e foi feito nas minhas costas”,
disse a procuradora à Union Radio na segunda-feira.
A assinatura da ata
A Constituição da Venezuela estabelece que o
Conselho Moral Republicano – composto pela Defensoria do Povo, a Controladoria
e o Ministério Público – deve analisar os históricos dos aspirantes a juízes e
determinar se estão de acordo com suas nomeações. Ortega Díaz diz que não
assinou a ata porque não ficou sabendo como foram selecionados. Mas o defensor
do Povo, Tarek William Saab, negou que a procuradora tenha se oposto às
nomeações na reunião que tiveram em 16 de dezembro de 2015, uma semana antes de
a Assembleia Nacional tomasse o juramento dos juízes.
Os contenciosos apresentados pela procuradora
parecem querer deixar em evidência a falta de independência das instituições,
que o chavismo crítico pouco tinha sentido antes desse cisma. “O Governo
pretende desmantelar o Estado e conspira para alterar a forma republicana, como
está estabelecida na Constituição. Não é só através de um ato de força que se
conspira contra a nação, mas também com sentenças”, disse Ortega Díaz ontem, ao
registrar o pedido de julgamento de mérito contra os juízes.
Os documentos tiraram a Mesa da Unidade Democrática
da rotina dos protestos reprimidos pela polícia militarizada. A Assembleia
Nacional se preparava ontem para tomar o juramento dos membros da Comissão de
Nomeações do Judiciário, que deve culminar com a nomeação de novos juízes.
Com a deserção de seus antigos aliados, o
repúdio a Maduro aumenta a cada dia. O regime mantém, por enquanto, o apoio da
Força Armada Nacional Bolivariana, que usa como principal arma para seguir em
frente com seus esforços de purgar a Venezuela. A situação agora se propõe – através
do deputado chavista Pedro Carreño – a pedir ao Supremo que autorize que uma
junta médica determine se a procuradora-geral está em seu juízo perfeito. O
desenlace é iminente (El Pais)
Sem comentários:
Enviar um comentário