quarta-feira, novembro 11, 2015

Dany: “Vodka? Fico logo bêbado com um copo de vinho”

Já lá vão quase onze anos desde que Danny se mudou para a Rússia. Depois de impressionar no Dínamo, protagonizou a maior transferência local ao mudar-se para o Zenit, por 30 milhões de euros, em 2008. Antes da viagem da seleção portuguesa à Rússia (dia 14, 14h, RTP1), pedimos umas dicas a Danny sobre o país que ele adora, apesar de ter nascido na Venezuela e de ter crescido na Madeira.
A vossa Champions está perfeita: quatro jogos, quatro vitórias...
Está a correr muito bem, graças a Deus. Estamos a fazer na Liga dos Campeões o que não estamos a fazer no campeonato, por causa da restrição no número de estrangeiros que podem jogar. Felizmente, na Liga dos Campeões o mister pode utilizar todos, e estamos a jogar um futebol bonito. Quatro vitórias é um recorde para o Zenit, e somos a única equipa na prova só com vitórias.
O campeonato está pior: 4º lugar.
Pois, a equipa que agora joga na Liga dos Campeões é a equipa com a qual fomos campeões no ano passado, mas este ano há a restrição dos estrangeiros, por isso um tem sempre de ficar de fora.
Bem, mas tu devias poder jogar sempre, porque já estás aí há 11 anos.
Eh, pá, deveria, mas não dá. Aqui, na Rússia, não contam os anos nem o poder ganhar residência... Eles não pensam assim. Não me deixam ser russo [risos].
A adaptação foi difícil?
No princípio, foi complicado, porque é um país muito diferente do nosso e com bastante frio. Mas acho que a Rússia cresceu imenso, em termos de cultura, de imagem... Já é um país mais alegre, com mais abertura para ajudar as pessoas a ambientarem-se mais rapidamente.
Falas bem russo?
Claro, depois de dez anos e meio aqui tenho de falar russo, não é? [risos] Mas a minha mulher e os meus filhos falam melhor, eu não tenho tanto jeito. Também porque no balneário temos muitos estrangeiros, então passo os dias a falar russo com uns, inglês com outros, português, espanhol e italiano com outros. Vou misturando as línguas todas.
O Villas-Boas também fala russo?
Eh, pá, safa-se [risos].
Vejo que gostas de viver na Rússia.
Eu digo-te: se São Petersburgo tivesse mais um calorzito gostoso, com um bocadinho de sol, para mim era das melhores cidades do mundo. Porque é muito bonita e tem tudo para se estar bem com a família e os amigos. Quem não conhece a Rússia tem sempre aquela ideia de chegar aqui e pensar em guerras ou coisas assim, mas não tem nada a ver, pá.
Se calhar têm uma ideia errada porque o Putin tem aquele ar de mauzão...
Quando ganhámos a Liga Europa, os meus colegas estiveram com ele, mas eu não regressei à Rússia logo após a final, por isso não o conheci. Mas eles falaram muito bem dele, que era simpático e adepto do Zenit.
Mas sabes que há quem não veja a Rússia com bons olhos, porque vai receber o Mundial em 2018 mas tem posições controversas sobre a homossexualidade e o racismo...
Percebo, mas aqui não se fala muito disso. Nos jornais, houve algumas conversas sobre isso durante os Jogos Olímpicos de Sochi. Mas nunca vi nada de especial.
Mas já houve algumas situações de racismo com o Hulk, por exemplo.
Sim, mas isso não aconteceu só aqui, passou-se na Europa também. Obviamente que o racismo é uma coisa muito má, e esperemos que acabe rapidamente. Há pessoas que têm um pensamento diferente, mas ultimamente as coisas têm melhorado bastante e vão continuar a melhorar.
Portugal joga aí para a semana. Tens algum conselho para os teus colegas? Do género: vistam duas camisolas e três pares de meias.
[risos] Não, porque por acaso marcaram o jogo para uma cidade que é das mais quentes. Claro que é normal haver temperaturas baixas nesta altura do ano, mas em Krasnodar vão estar entre 10 e 12 graus, não é mau... Há dias em que jogamos com zero graus.
Como é jogar com zero graus?
É complicado, porque estava acostumado ao calor de Portugal e da Venezuela. Tive de me habituar a estar sempre de camisola, luvas e gorro.
Eles gozam contigo?
Não, o frio é tanto que eles também põem, não aguentam. É meias, luvas, gorro, calções, calças, pulôver, tudo.
De vez em quando publicam uns vídeos, como o Hulk a rebentar cacifos...
[risos] Sim, isso é mais o marketing do clube. Os nossos vídeos são feitos em jantares, são mais privados.
Para o ano vai deixar de haver treinadores principais estrangeiros na Rússia. A que propósito?
Se for verdade, acho errado, porque todos os países do mundo têm treinadores estrangeiros, desde que venham com vontade de trabalhar e dar mais qualidade às equipas é normal.
No Zenit só tens o Neto, mas dás-te com outros portugueses aí?
Sim, o Hugo Almeida, o Djaló, o Manuel Fernandes... Estamos sempre em contacto uns com os outros.
Juntam-se para um copo de vodca?
[risos] Não, não, eles estão noutras cidades, falamos mais por telefone. E não gosto de vodca, não bebo álcool.
Mas dá jeito para aquecer...
Não, quando está frio bebo um chá quente.
Nem um bocadinho de poncha?
Nada. O máximo é um copo de vinho, e fico logo bêbado [risos].
Na época passada falou-se que o Benfica estava interessado em ti.
Não é verdade. Não me chegaram propostas de Portugal.
Bem, para o Porto não podes ir.
Porque não?
A história do festejo do cão a urinar.
Ah, isso ficou bem resolvido. Falei com o presidente e expliquei-lhe que foi porque tinha oferecido um cão aos meus filhos. Não teve nada a ver com o Porto, que é um clube que respeito.
Mas se o Zenit calhar com o Porto nos oitavos de final da Champions, achas que não te vão assobiar?
Se calhar, vão assobiar. É normal.
E ainda tens o tal cão?
Tenho, é o Mickey [risos].
Os teus filhos jogam?
Também jogam no Zenit.
Melhor do que tu?
Até agora, acho que sim. Também não é muito difícil [risos]. Mas ainda é cedo, têm 11 anos. Aquela parte dos 14/15 anos é que é mais difícil.
Já foram à Venezuela?
Não, nunca foram à terra do pai.
Como é que começaste a jogar lá?
O meu pai incentivou-me, porque viu que eu só queria jogar futebol, desde os 4 anos. Só queria bola, bola. Então jogava na escola e depois numa escolinha de futebol. Depois disso fui para o Marítimo, e foi aí que começou a minha carreira.
Como surgiu o Marítimo?
Eles foram à Venezuela fazer um torneio, e havia pessoas da minha equipa que conheciam o treinador do Marítimo, por isso falaram-lhe de mim. Depois, o Marítimo fez um amigável com uma equipa venezuelana, e eu joguei pelo Marítimo, para verem como corria. Joguei os 90 minutos, e foram falar com os meus pais para me levarem para a Madeira...
Tiveste medo?
Tive algum receio, claro. É normal quando sais de casa aos 15 anos e tens de fazer uma viagem tão longa para um país diferente. Mas tinha os meus avós e primos na Madeira.
Depois foste para o Sporting jogar com o teu ídolo, o João Vieira Pinto...
Era o meu ídolo e continua a ser. É uma pessoa de quem gosto bastante.
Quando chegaste, foste logo falar com ele ou tiveste vergonha?
Qual vergonha, falei logo com ele. Sempre tive uma personalidade forte, sem receio de entrar, falar, estar e conviver, por isso no Sporting foi igual.
Hoje, na Rússia, o ídolo és tu.
Eh, pá, acho que fiz uma bela carreira aqui. No Dínamo e no Zenit, as coisas que fiz foram bem boas, e as pessoas reconhecem-me esse valor. Ganhei moral com isso e ainda vou continuar a fazer coisas bonitas aqui. Mas se sou ídolo ou não, elas é que sabem.
Se for à Rússia e falar em jogador português, vão dizer-me Danny ou Ronaldo?
Ah, isso de certeza que é Ronaldo. É o melhor do mundo. Mas depois de falarem dele também vão falar bem de mim.
Tens o azar de ser da Madeira, porque o Ronaldo também é...
[risos] Não é azar, é sorte.
Gostavas de continuar na Rússia depois de acabar a carreira?
Nunca se sabe. Também tenho os meus filhos aqui a jogar, quando acabar contrato eles vão ter 13 anos.
Os teus filhos conhecem os clubes portugueses?
Claro. E espanhóis, ingleses, tudo.
E torcem por algum?
É pelo Zenit.
Dos portugueses, quero eu dizer.
Em Portugal, é pelo Marítimo.
E quem tem estado melhor no campeonato português?
Os três grandes estão mais equilibrados este ano, mas o Sporting tem um treinador que é muito bom. Já disse aos ex-benfiquistas e ex-portistas do Zenit [Javi, Garay, Witsel, Hulk e Villas-Boas] que acho que o Sporting vai ser campeão [risos] (entrevista conduzida pela jornalista do Expresso, Mariana Cabral, com a devida venia)

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