segunda-feira, novembro 24, 2014

MADEIRA: A PROPÓSITO DA REDUÇÃO DE DEPUTADOS REGIONAIS



Quase todos os candidatos à liderança do PSD regional prometem reduzir o número de deputados na Assembleia Regional, mesmo que dificilmente tenham capacidade de iniciativa, sozinhos, para o fazer. Fico sem saber, mas a verdade é que esse tema não foi devidamente desenvolvido, se essa ideia da redução dos deputados, resulta do facto de concluírem que metade dos atuais mandatos, mais coisa menos coisa, é suficiente, ou se tal proposta resulta de uma imposição decorrente da realidade financeira e orçamental da Região.
Admito que os candidatos à liderança do PSD regional possam abordar este tema, nesta fase, insisto que não deve ser tema usado para demagogia ao desbarato. E reafirmo contudo o que sobre isto já referi: trata-se de matéria que extravasa a disputa pela liderança do PSD-Madeira, que não se compadece com qualquer "lotaria" de mandatos, que não joga com qualquer tipo de populismo na abordagem do tema porque, neste caso concreto, a competência para alterar a lei eleitoral regional vigente é da Assembleia da República. O que implica a necessidade de prévia negociações e o acordo com outros partidos, o que não se me afigura fácil, dado que uma redução drástica do número de deputados vai implicar - embora tudo dependendo dos resultados eleitorais e da dimensão da abstenção - o desaparecimento de vários dos partidos mais pequenos do nosso parlamento regional.
Partindo deste tema fiz um estudo comparativo, tendo por base vários parlamentos regionais de regiões insulares ou ultraperiféricas, como a Madeira e os Açores, para verificar se afinal a nossa Assembleia Legislativa foge àquela que é a realidade presente no continente europeu. Reconheço, e chamo a atenção das pessoas para isso, que tanto em Espanha como na Itália, várias regiões ou comunidades estão a discutir as respectivas legislações eleitorais, apontando todas para a redução do número de deputados, para que por via disso seja possível alguma poupança na despesa. Tem sido essa a palavra de ordem passada aos cidadãos e, obviamente, tratando-se de dois países também com dificuldades e incertezas e onde política e políticos de uma maneira geral andam muito por baixo, ninguém, contesta a lógica e os propósitos de tais objetivos.
Para este estudo utilizei vários indicadores que passo a enumerar:
* Portugal
- Madeira, 47 e Açores, 56
* Espanha
- Canárias, 60, Ilhas Baleares, 59, Astúrias, 45, Madrid, 120, Catalunha, 135, Galiza 75, País Basco, 75 e Andaluzia com 109 deputados
* Finlândia
- Ilhas Aaland, 30 deputados
* Itália
- Sicília, 90, Sardenha, 80, Veneto, 60, Lombardia (Itália), 80, Toscânia, 53 e Lázio (Roma),73 deputados
* Reino Unido
- Irlanda do Norte, 108, Escócia, 129 e Pais de Gales, 60 deputados
* Áustria
- Viena, 100, Tirol, 36 e Salzburgo, 36 deputados
* Bélgica
- Bruxelas, 89 e Região Flamenga, 124 deputados
* Alemanha
- Hamburgo (cidade-estado), 121, Baviera, 187, Baixa-Saxónia, 132, Berlim (cidade-estado), 149 e Baden-Wuttemberg, 139 deputados
O levantamento foi efetuado considerando todos os parlamentos regionais europeus - 2 de Portugal, 1 da Finlândia, 17 de Espanha, mais as cidades espanholas de Ceuta e Melilla, 20 da Itália, 4 da Bélgica, 9 da Áustria, 16 da Alemanha e 3 do Reino Unido (Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte). A França, apesar de ter regiões (os DOM, territórios ultramarinos) que integram o lote das chamadas regiões ultraperiféricas, não dispõe de parlamentos regionais, nem mesmo na ilha de Córsega que o reclama há muito tempo. Pelo contrário, a França está neste momento a debater a redução drástica para apenas 14 regiões nacionais (tem neste momento 22 regiões e 101, num debate rodeado de muita contestação, polémica e agressividade. Tudo por causa da chamada "A Nova Carta das Regiões" do presidente François Holland.
O modelo eleitoral atual serve os eleitores e a política? A aposta numa lista única para as regionais - que eu nunca concordei - afasta ou não os eleitores dos candidatos, da política e das eleições, afastamento este expresso numa preocupante e crescente abstenção que em 2011, apesar de terem então existido outros fatores que influenciaram esse crescimento, ascendeu a quase 43%, correspondentes a 110 mil eleitores, praticamente o somatório dos votos do PSD, CDS e PS? A relação existente, antes da lei eleitoral de 2007, entre os candidatos de cada concelho e respetivos eleitores desses municípios aproximava mais os eleitores dos candidatos, ou não? Não responsabilizava mais os candidatos depois de eleitos, perante os seus eleitores, já que a campanha era mais localizada?
Utilizando as mesmas regiões nele selecionadas, comparemos a população e os eleitores recenseados (entre parênteses) de cada uma delas, porque estes indicadores ajudam-nos a ter a noção concreta da dimensão das diferentes regiões europeias e da "insignificância", neste contexto, da Madeira e dos Açores (basta compará-las com Canárias):
* Portugal
- Madeira, 248 mil habitantes (256 mil eleitores) e Açores, 246 mil (195 mil);
* Espanha
- Canárias, 2,2 milhões de habitantes (1,5 milhões de eleitores), Ilhas Baleares, 1,2 milhões (426 mil), Astúrias, 1,1 milhões (950 mil), Madrid, 6,5 milhões (4,6 milhões), Catalunha, 7,5 milhões (3,6 milhões), Galiza, 2,9 milhões (610 mil), Pais Basco, 2,2 milhões (1,8 milhões) e Andaluzia, 8,5 milhões (6,1 milhões)
* Finlândia
- Ilhas Aaland, 28 mil habitantes (20 mil eleitores)
* Itália
- Sicília, 5,2 milhões de habitantes (4,5 milhões eleitores), Sardenha, 1,7 milhões (1,4 milhões), Veneto, 5,2 milhões (4 milhões), Lombardia, 10 milhões (7,90 milhões), Toscânia, 3,9 milhões (3,1 milhões) e Lázio (Roma), 6 milhões (4,7 milhões)
* Reino Unido
- Irlanda do Norte, 1,9 milhões de habitantes (1,2 milhões de eleitores), Escócia, 5,2 milhões (4 milhões) e País de Gales, 3 milhões (2,2 milhões)
* Áustria
- Viena, 1,8 milhões de habitantes (1,1 milhões de eleitores), Tirol, 750 mil (550 mil) e Salzburgo, 600 mil (400 mil)
* Bélgica
- Bruxelas, 1,2 milhões de habitantes (600 mil eleitores) e Região Flamenga, 6,1 milhões (4,9 milhões)
* Alemanha
- Hamburgo (cidade-estado), 1,9 milhões de habitantes (1,3 milhões de eleitores), Baviera, 13 milhões (9,7 milhões), Baixa-Saxónia, 7,9 milhões (3,4 milhões), Berlim (cidade-estado), 3,5 milhões (2,5 milhões) e Baden-Wuttemberg, 11 milhões (7,6 milhões)
Mas para percebermos esta comparação entre os parlamentos regionais – e volto a realçar que em muitos deles se realizamos dias que correm uma discussão centrada mais na redução pura e simples dos mandatos, do que na apreciação de qualquer outra matéria, por exemplo no reforço de competências legislativas e outras – podemos utilizar outros dados comparativos com as regiões que aleatoriamente selecionei como referência para este trabalho.
Deixarei isso para a terceira e última parte deste trabalho, sem antes deixar de sublinhar que no quadro da mudança do sistema político e eleitoral e da pretendida, e bem, proximidade entre eleitores e eleitos, acho que Portugal tem que mudar rapidamente a lei eleitoral para o Parlamento Europeu, na perspetiva de que as ilhas possam eleger o seu próprio deputado, separadamente da lista nacional, que deveria ser obrigatoriamente subdividida em várias circunscrições.
Uma das causas da abstenção criminosa e vergonhosa registada nas eleições europeias em Portugal – uma Europa a quem paradoxalmente muito devemos, apesar de todas as suas contradições, crises e assimetrias cada vez mais acentuadas - tem a ver com o modelo eleitoral de lista única e com o processo de escolha dos candidatos, regra geral uma negociata entre partidos, que acabam por fabricar uma lista onde se cruzam múltiplos interesses mas que pouco ou nada diz aos cidadãos que são os eleitores. Oportunamente desenvolverei este tema num outro texto.
Ressalvo desde já que, estranhamente, não vejo ninguém na Madeira contestar este modelo eleitoral para o Parlamento Europeu sabendo-se que o facto de termos ou uma lista única ou várias circunscrições eleitorais depende apenas da opção de cada país e não de qualquer imposição do Parlamento Europeu como já se tentou vender ao eleitorado.
Quando se fala na redução dos deputados regionais - que confesso ser uma discussão por vezes manipulada e utilizada como instrumento demagógico para influenciar os cidadãos - o problema, dizem os que a suscitam, tem a ver com a necessidade de reduzir despesas, o que obviamente não colhe. Basta que reduzam substancialmente os valores transferidos paras os partidos, obrigando-os a procurar, pelos seus próprios meios, os recursos financeiros complementares e imediatamente teremos um parlamento menos despesista. Não é por aí que a discussão deve ser conduzida.
Suspeito que quando é proposta a redução dos deputados, das duas uma: ou os que suscitam o assunto acham que a Madeira não tem dimensão para ter um parlamento com 47 deputados, e pronto, trata-se de uma perspetiva política e nada mais do que isso ou preconizam essa redução de mandatos no quadro de uma redução da despesa pública, mas neste caso sujeitando-se, os que vão por aqui, a uma natural discussão com os defensores de outras soluções diferentes.
Na sequência das comparações que já publiquei no âmbito deste trabalho, volto a publicar outros dados que ajudarão as pessoas a perceber se afinal os parlamentos da Madeira e dos Açores, comparativamente com outros congéneres europeus, são ou são excessivos, em termos de composição.
Comecemos por verificar a média população/deputado:
·        Finlândia - Ilhas Aaland, 933,33 habitantes por deputado;
·        Portugal - Açores, 4.381,68 habitantes por deputado, Madeira, 5.263,81 habitantes por deputado;
·        Espanha - Baleares, 18.746,59 habitantes por deputado, Astúrias, 24.096,47, Pais Basco, 29.044,52, Canárias, 35.308,65, Galiza, 37.302,04, Madrid, 53.822,37, Catalunha, 55.647,27 e Andaluzia, 76.797,94 habitantes por deputado;
·        Reino Unido - Irlanda do Norte, 16.125,93 habitantes por deputado, Escócia, 39.240,40 e Pais de Gales, 50.076,67 habitantes por deputado;
·        Bélgica - Região de Bruxelas, 11.447,24 habitantes por deputado e Região Flamenga, 49.020,97;
·        Itália - Sardenha, 20.905,05 habitantes por deputado, Lombardia, 122.826,76, Veneto, 81.873,97, Lázio (Roma), 77.833,81, Toscânia, 70.379,81 e Sicília, 56.033,24 habitantes por deputado
·        Alemanha - Bremen (cidade-estado), 7.987,95 habitantes por deputado, Hamburgo (cidade-estado), 14.661,16, Baden-Wuttemberg, 77.258,99, Baviera, 66.780,75, Berlim (cidade-estado), 22.785,23 e Saxónia, 18.746,59 habitantes por deputado;
·        Áustria - Tirol, 19.542 habitantes por deputado, Salzburgo, 14.738,22 e Viena, 16.778,67.
Neste estudo que realizei contando com as 74 regiões europeias dotadas de parlamentos regionais democraticamente eleitos e dotados de competências legislativas próprias, as regiões da Lombardia (Itália), Renânia-Vestefália (Alemanha), Campânia (Itália), Emilia-Romagna (Itália) e Veneto (Itália) são as regiões onde a média população/deputados é a mais elevada. Ao invés, as cinco regiões onde a relação habitantes/mandatos parlamentares é mais baixa, são as Ilhas Aaland (Finlândia), parlamento da Comunidade Germânica (Bélgica), Valle-de-Aosta (Itália), Madeira e Açores (ambas de Portugal) e Burgenland (Áustria).
Concluindo esta sequência de textos, passemos à média eleitores inscritos/deputado numa série de parlamentos regionais europeus que selecionados aleatoriamente:
·        Finlândia - Ilhas Aaland, 647,30 eleitores inscritos por deputado;
·        Portugal - Açores, 3.445,41 eleitores inscritos por deputado e Madeira, 4.927,79;
·        Espanha - Baleares, 11.690,92 eleitores inscritos por deputado, Astúrias, 21.817,82, Pais Basco, 23.680,69, Canárias, 24.081,30, Galiza, 30.839,51, Madrid, 35.976,43, Catalunha, 38.747,30 e Andaluzia, 55.891,05 eleitores inscritos por deputado;
·        Reino Unido - Irlanda do Norte, 10.258,37 eleitores inscritos por deputado, Escócia, 30.224,06 e Pais de Gales, 37.468,70;
·        Bélgica - Região de Bruxelas, 6.458,35 eleitores inscritos por deputado e Região Flamenga, 37.713,61;
·        Itália - Sardenha, 18.414,75 eleitores inscritos por deputado, Lombardia, 96.184,31, Veneto, 66.037,87, Lázio (Roma), 64.687,05, Toscânia, 56.786,28 e Sicília, 38.747,30;
·        Alemanha - Bremen (cidade-estado), 5.856.54 eleitores inscritos por deputado, Hamburgo (cidade-estado), 10.220,42, Baden-Wuttemberg, 54.078,55, Baviera, 49.847,15, Berlim (cidade-estado), 16.278,39 e Saxónia, 21.429,47;
·        Áustria - Tirol, 14.451,58 eleitores inscritos por deputado, Salzburgo, 10.724,11 e Viena, 11.445,10.
Tal como no item anterior, e contando as 74 regiões europeias dotadas de parlamentos regionais democraticamente eleitos, as regiões da Lombardia (Itália), Renânia-Vestefália (Alemanha), Campânia (Itália), Emilia-Romagna (Itália) e Veneto (Itália) voltam a ser as regiões onde a média eleitores inscritos/deputados é a mais elevada. Ao invés, as cinco regiões onde essa relação eleitores inscritos/mandatos parlamentares é mais baixa, continuam a ser as das Ilhas Aaland (Finlândia), parlamento da Comunidade Germânica (Bélgica), Valle-de-Aosta (Itália), Madeira e Açores (ambas de Portugal) e Burgenland (Áustria).
Finalmente consideremos a média votantes/deputado:
      - Finlândia - Ilhas Aaland 438,87 votantes por deputado; 
- Portugal - Açores, 1.607,68 votantes por deputado e Madeira, 2.993,55; 
- Espanha – Baleares, 7.096,66 votantes por deputado, Astúrias, 13.437,38, Pais Basco, 15.216,25, Canárias, 15.354,73, Galiza, 21.727,40, Madrid, 24.792,03, Catalunha, 23.227,88 e Andaluzia, 41.156,05 votantes por deputado; 
- Reino Unido - Irlanda do Norte, 10.074,44 votantes por deputado, Escócia, 18.821,88 e Pais de Gales, 16.301,53; 
- Bélgica - Região de Bruxelas, 4.964,19 eleitores votantes por deputado e Região Flamenga, 35.095,22; 
- Itália - Sardenha, 12.443,73 eleitores votantes por deputado, Lombardia, 62.167,74, Veneto, 43.859,50, Lázio (Roma), 39.389,99, Toscânia, 34.476,72 e Sicília, 33.880,73; 
Alemanha – Bremen (cidade-estado), 3.369,28 votantes por deputado, Hamburgo (cidade-estado), 6.489,61, Baden-Wuttemberg, 28.866,48, Baviera, 28.868,21, Berlim (cidade-estado), 9.448,01 e Saxónia, 9.518,33; 
Áustria - Tirol, 9.519,81 votantes por deputado, Salzburgo, 7.974,03 e Viena, 7.740,79.
Considerando as 74 regiões europeias dotadas de parlamentos regionais democraticamente eleitos, as regiões da Lombardia (Itália), Campânia (Itália), Emilia-Romagna (Itália), Renânia-Vestefália (Alemanha) e Andaluzia (Espanha) são as regiões onde a média votantes/deputados é a mais elevada. Ao invés, as cinco regiões onde essa relação votantes/mandatos parlamentares é mais baixa, continuam a ser as Ilhas Aaland (Finlândia), parlamento da Comunidade Germânica (Bélgica), Açores (Portugal), Valle-de-Aosta (Itália), Madeira (Portugal) e Bremen (cidade-estado, Alemanha).
Deixo aos leitores retirarem as conclusões que uma leitura racional e pragmática deste tema nos deve impor. Na certeza de que tanto a Madeira como os Açores, independentemente de outros argumentos políticos que compreensivelmente possam ser utilizados, são no contexto dos parlamentos das regiões europeias, daquelas que apresentam indicadores mais baixos para a eleição dos deputados: por exemplo, enquanto nas Canárias, 37.300 cidadãos correspondem a um deputado na Madeira e nos Açores esse valor é de, respetivamente, 5.263 e 4.380 cidadãos. Se considerarmos os eleitores votantes, na Madeira 2.990 deles elegem um deputado contra 1.607 nos Açores e 15.350 votantes nas Canárias (LFM)