segunda-feira, fevereiro 25, 2013

Opinião: “Rapidez de uma desistência”

“Havia duas fotografias candidatas naturais a "imagem da semana": Miguel Relvas a sair pelos corredores do ISCTE perseguido por estudantes aos gritos ou Miguel Relvas sozinho e imóvel no palco do ISCTE, ainda sem saber o que fazer.
Sabemos o que o ministro adjunto de Pedro Passos Coelho acabou por fazer. Ficou no palco dois minutos e 27 segundos a ouvir os gritos que pediam a sua demissão. Relvas ficou ali, aparentemente sereno, com o sorriso incomodado que já vimos antes, e não os interpelou. Desistiu logo ou estava à espera que alguém o socorresse?
Dentro do auditório, pequeno, escuro e com uma única saída para o labirinto de rampas, portas e corredores que é o Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa, a gritaria teve provavelmente o mesmo efeito que a cascata de Iguaçu tem quando nos aproximamos da queda de água e o barulho é tão ensurdecedor que intimida. Mas Relvas não estava de férias no Brasil. E, apesar disso e de todos os alertas, deixou escapar o momento em que, visto à distância, a história podia ter sido escrita de outra forma. Foi logo no início, ao segundo 49. Como num golo que se falha, o ministro não apanhou a leve pausa que os estudantes fizeram, não teve iniciativa, não os convidou para uma reunião a seguir à conferência, não lhes disse que está preocupado com os jovens e que até tem insónias por causa disso, não lhes disse que já se tinham feito ouvir, em directo para a televisão, mas que agora era a sua vez de falar. Qualquer coisa. Até um momento de propaganda teria sido melhor. De fôlego recuperado, e talvez até surpreendidos, os estudantes começaram a cantar com força revigorada. O que teria feito Soares ou Obama? Ou Passos Coelho e Vítor Gaspar?
Quando José Alberto Carvalho, anfitrião e director de Informação da TVI, subiu ao palco, mais de um minuto depois de os gritos terem começado, o ministro disse-lhe algo como "não temos nada a fazer, não é?", a frase não é clara. Relvas foi ao ISCTE como quem entra na toca do lobo, ignorando o facto de ser o íman de todas as iras dos portugueses.
Horas antes, Miguel Sousa Tavares, que animou a plateia da conferência da TVI dizendo mal de tudo e de todos, lançara um bizarro apelo: "O jornalismo de referência tem de ter a coragem de ignorar por completo o que se passa na Internet." Foi desmentido pouco depois. Bastava a Relvas ter alguém a acompanhar o Facebook e saberia, desde as quatro da tarde, o que ia acontecer. Claro que, no seu caso, não seria necessariamente útil. A inacção de Relvas é fácil de explicar. Já ninguém ouve o ministro” (texto da jornalista Bárbara Reis, Publico, com a devida vénia)