quinta-feira, fevereiro 28, 2013

O "justiceiro" de m...: Passos diz que Estado social “é pesado” e deu protecções “muito elevadas”

Segundo a jornalista do  Jornal I, Liliana Valente, "o primeiro-ministro começou ontem a preparar terreno para os cortes que se adivinham nas funções sociais do Estado, assegurando que estas cresceram a um ritmo que se tornou demasiado pesado para os impostos. Se dúvidas houvesse, o primeiro-ministro desfê-las ontem: o corte na despesa pública vai mexer com o Estado social tal como o conhecemos hoje. Num debate organizado pela JSD sobre a reforma do Estado, Passos Coelho falou da necessidade de uma nova "organização económica e política" na Europa e disse que isso deve passar por um debate intensivo sobre o que é o Estado social europeu, mas também ao nível interno. A poucos dias de se conhecerem os cortes de cerca de 4 mil milhões de euros na despesa pública, as palavras do primeiro-ministro não são inocentes e preparam o discurso para as medidas que aí vêm: vão mexer nas funções sociais do Estado, uma vez que este cresceu ao longo dos anos a "um ritmo que se tornou demasiado pesado para os salários". E por isso o corte "é decisivo", e, se queremos "pagar o Estado social", então "temos de ser mais activos, não só mantendo o grau de abertura para o exterior mas pensando a nossa organização económica e política". O governo ainda não divulgou as medidas que vão fazer parte da proposta que está a ser debatida com a troika desde segunda-feira, nem tão-pouco se o montante se mantém ou se o prazo de aplicação será dilatado, mas certo é que, na opinião do primeiro-ministro, este debate deve ser feito de forma "suficientemente livre para questionar muitas coisas", entre elas "precisamos de saber o que vamos fazer ao nosso Estado social". Misturando a realidade europeia com a portuguesa e perante uma plateia atenta enquanto para lá das portas do anfiteatro se concentrava uma manifestação de estudantes contra a política do governo (ver ao lado), Passos Coelho lembrou que "a Europa se construiu também como um dos exemplos de Estado social avançado, em que as pessoas adquiriram níveis de protecção contra riscos sociais e económicos muitos elevados", mas que essas protecções foram adquiridas durante "um tempo em que a Europa crescia a um ritmo bastante vigoroso e em que a nossa demografia ajudava nesse crescimento". Neste momento, lembrou, nenhuma das duas premissas se verifica e por isso levantam-se as perguntas: "Como é que podemos assegurar que os recursos estão disponíveis para aqueles que precisam mais e como é que temos a certeza de que os impostos que os cidadãos pagam e que depois o Estado redistribui correspondem a uma correcção das injustiças na distribuição do rendimento?"
Desta vez Passos Coelho não usou a palavra "crescimento", como tem acontecido nos últimos tempos, para justificar o processo de ajustamento e também o corte que foi acordado com a troika, mas seguiu a linha de argumentação das últimas semanas para defender que é necessário dar "mais sustentabilidade" à despesa do Estado, porque sem isso "não vai ser possível baixar a carga fiscal, que é elevadíssima, reduzir mais rapidamente a nossa dívida perante o exterior e recuperar parte do investimento público". Desde que se iniciou o debate sobre a reforma do Estado, o governo tem-no feito sozinho – sem o resto da oposição – e, num claro recado aos críticos destas mexidas nas funções do Estado, deixou a garantia de que "esta reforma não pode ficar reduzida à parte financeira". Diz que as finanças públicas funcionaram "como gatilho para uma discussão mais ampla, mas não pode ser um elemento redutor da discussão". Quando há semanas chamou o PS para o debate, António José Seguro tinha pedido ao governo que não ficasse amarrado ao valor acordado com a troika e desafiou o primeiro-ministro a avançar com uma verdadeira reforma do Estado e não reduzida aos cortes da despesa".