“A decisão dos
juízes do Tribunal Constitucional foi mais severa para o Orçamento do que se
previa. Mexe com cerca de 1200 milhões de euros, ou seja cerca de 0,6% do PIB.
Face a isto há que ter em conta os seguintes pontos:
1)
Independentemente de se gostar ou não da sentença, ela é soberana e tem de ser
cumprida. Como aqui disse, os juízes decidem em função da lei que tem; como
afirmou o presidente do TC, são as leis que têm de se conformar com a
Constituição e não o contrário. Acresce que neste acórdão a preferência
político-partidária dos juízes não se fez sentir, em muitos casos. O
escrupuloso cumprimento deste acórdão é essencial, porque é a partir dele que
têm de ser encontradas soluções.
2) Os partidos e
pessoas que se congratulam com a sentença, podem ficar contentes por ter tido
razão, mas não pelo facto de a vida das pessoas melhorar ou de a austeridade
acabar ou ser minorada. Na verdade, depois do chumbo do ano passado, a
austeridade aumentou. Foi distribuída de outra forma e aumentou para a maioria.
A decisão do TC não põe fim a qualquer austeridade, apenas a manda distribuir
de modo diferente.
3) O Presidente
da República tinha dúvidas sobre três artigos do Orçamento. O Tribunal - como
alguém bem-humorado disse - deu-lhe razão em quatro. O Presidente da República
fez mal em não ter pedido a fiscalização preventiva, com a qual teríamos
provavelmente a mesma decisão, mas já tomada em 13 de janeiro passado. O
Presidente tem de refletir se o chumbo, pela segunda vez, de normas semelhantes
de um Orçamento, não configura um irregular funcionamento das instituições. Ou
seja, o país não pode ter um Governo que não é capaz de cumprir a Constituição
em assuntos centrais.
4) O Governo, que
esta tarde se reúne, vai ter de tomar uma medida radical. Seguir - como ameaçou
a deputada do PSD, Teresa Leal Coelho -, pela via de aumento de impostos é
inviável. Do meu ponto de vista, o Governo deveria confessar-se incapaz de
governar nestas circunstâncias e abrir a porta a uma solução mais ampla. O
drama dos 1200 milhões de euros não se reflete só este ano. Para o Orçamento do
ano que vem as medidas agora chumbadas não podem ser incluídas. É possível
deixar aumentar o défice em 2013, mas isso significa que em 2014 o esforço terá
de ser muito maior e optar por medidas diferentes e mais gravosas ainda. Há
ainda os célebres cortes de quatro mil milhões que ninguém sabe se são para
fazer já, se quando e de que modo.
5) A solução
ótima, como já tantas vezes escrevi será encontrar, no âmbito da atual
legislatura, uma solução equilibrada que envolva todos os partidos da
governação. Esse Governo serviria para fazer a reforma do Estado o mais
profunda e consensualmente possível, para desbloquear as relações
institucionais, para - e porque esta legislatura tem poderes para isso - rever
a Constituição em certos pontos em que se sinta valer a pena alterar e,
sobretudo,inverter a crispação crescente, que não conduz a nada de construtivo.
Como ontem escrevia Nogueira Leite no Facebook, se fosse fácil resolver os
problemas apenas através de leis, bastava declarar inconstitucional a
bancarrota e nada tinha a temer.
6) Esta solução
tem de partir, como também já aqui deixei expresso, do próprio
primeiro-ministro e do Presidente da República. Não se trata de um golpe de
Estado, mas de uma pessoa concreta, Passos Coelho, reconhecer que pode haver
soluções melhores (ou menos más) sem que seja ele a liderar o Governo.
7) O PS tem de
aceitar dar o seu beneplácito a uma solução assim. Querer eleições à força como
quer Seguro não faz sentido. As eleições não resolvem o problema de fundo (não
fazem aparecer dinheiro, menos défice ou contas equilibradas) e nem sequer o da
estabilidade (não vão resultar numa maioria absoluta). Tudo o que há a fazer
pode ser feito dentro da legalidade e sem eleições. Renegociar os prazos da
dívida, por exemplo. As conjeturas políticas que passam por poderzinhos
pessoais têm de ser deixadas de lado. A situação é grave. E, por experiência
própria todos sabemos que qualquer radicalização de posições acaba sempre por
nos trazer mais prejuízos do que benefícios” (texto de Henrique Monteiro,
Expresso, com a devida vénia)