
Uma nova política
Insistindo numa tecla que é a sua há muito tempo, e num recado dirigido antes de mais para dentro do PS, sugere a ruptura: “Uma nova cultura. Uma nova política feita para e com as pessoas. Uma política que privilegie o debate de ideias e recuse a fulanização. Que olhe para os partidos políticos como indispensáveis ao funcionamento da democracia, mas que estes saibam conviver com outras formas de participação por parte dos cidadãos que não querem estar inscritos num partido”. Não foi preciso um parágrafo, bastou um post de três linhas na sua página do Facebook, criticando a “obscenidade” do salário de €3 milhões de António Mexia, administrador da EDP, para obter em 15 dias mais notoriedade (e popularidade) do que em muitos meses. O desabafo telegráfico transformou-se num caso nacional: ouviu aplausos e críticas, elogios à coragem para pôr o dedo na ferida, acusações ao populismo de quem denuncia sem apresentar alternativas. Acusou o toque: enviou um requerimento ao ministro das Finanças sobre as orientações do Governo referentes ao estatuto remuneratório dos gestores e assim que receba a resposta promete divulgar o seu pensamento sobre o assunto. Esta segunda-feira, na Universidade do Algarve, foi falar aos estudantes sobre “os rumos da economia portuguesa”, na qualidade de presidente da comissão parlamentar de Economia — lugar-chave nesta conjuntura que, a conselho de vários, ele deverá começar a rentabilizar. Discursou 40 minutos, precedidos de um preâmbulo que repete amiúde a cada intervenção: “O que eu disser vincula-me exclusivamente a mim”. Lamenta que, dois anos após sobre o eclodir da crise, “a memória seja curta. Estamos a agir como se ainda vivêssemos no velho mundo”. Dirige as observações críticas ao mundo em geral, mas a verdade é que elas assentam que nem uma luva ao Governo português. O seu distanciamento das políticas seguidas por Sócrates torna-se claro, sem nunca ser ostensivo, quando afirma: “Há quem diga que os nossos problemas são devidos à economia internacional e que, do ponto de vista interno, não há muito a fazer. Não me revejo neste posicionamento simplista: Portugal pode e deve adoptar políticas nacionais para (...) convergir com a média dos países europeus”. Revela um companheiro partidário que assiste de perto à gestão da sua recatada mas intensa agenda, que os convites para intervir e os desafios para jantar (ora com militantes do PS ora com empresários ou com representantes de outros sectores da sociedade) são crescentes. Mas ele selecciona criteriosamente quando e onde aparecer e, apesar de usar cada vez mais a sua página no Facebook como montra do seu trajecto, doseia com cuidado a exposição pública. Quem o conhece adivinha-lhe o raciocínio: numa altura em que, da esquerda à direita, não há político que não tenha as suas previsões quanto ao momento em que José Sócrates sairá de cena (ainda em 2010? 2011, depois das presidenciais? No fim da legislatura, em 2013?), Seguro tem a sua aritmética pessoal. Se esperou até aqui, vai aguardar sem pressa o dia em que o ciclo Sócrates se cumpra por completo. Só então chegará a sua hora, para exaspero dos que gostariam de o ver precipitar os acontecimentos, ser mais destemido, mais aventureiro, mais sanguinário. Mas sangue na guelra é atributo que este “eterno jovem” — que não se livra do epíteto, apesar de lhe faltarem menos de dois anos para dobrar o meio século de vida — não tem. Nunca eleva o tom de voz, é cortês e cordato. Há quem tema que tanta boa educação se confunda com excesso de prudência, e que esta acabe por não o levar a lugar nenhum, antes o faça perder o comboio que esteve à beira de apanhar em 2004 — era, então, demasiado cedo. Perder o comboio é cenário que não parece atormentá-lo. Não que ele fale sobre o assunto. Não fala. Desde 2004 deu uma entrevista, uma apenas, e para defender o seu projecto de reforma do Parlamento — a única missão de relevo para que Sócrates entendeu convidá-lo durante este período e que ele aproveitou.
Os rivais
Os rivais
A sua cotação interna no PS, diz quem conhece muito bem a máquina socialista, é superior, em termos de afectividade, à do seu putativo rival, António Costa . Ainda que o actual presidente da Câmara de Lisboa tenha uma projecção no país que Seguro demorará a igualar. “E só chega a líder de um partido quem conquista o país”, dizem vários dos seus conselheiros. Resta saber se será Costa o seu adversário — até porque há quem aposte que, estando o país à beira de um ciclo favorável ao PSD, este não tem interesse na corrida. Certo é que o futuro de que falava Coelho há seis anos está aí, ao virar da esquina. E a Seguro resta pôr em prática os seus próprios conselhos aos jovens da faculdade do Algarve: “Correr riscos, tomar o destino nas próprias mãos”.
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