segunda-feira, junho 19, 2023

Bancos engordam lucros com juros dos créditos e estão mais rentáveis: eis o que nos mostram as contas do primeiro trimestre

CGD, BCP, Santander, BPI, Novo Banco e Montepio registaram mais lucros, concederam menos crédito e estabilizaram os depósitos. Só em Portugal os lucros ascenderam a 844,4 milhões de euros e as receitas com juros dos créditos escalaram como há muito não acontecia. Veja onde cada um dos bancos mais ganhou ou perdeu O ano 2022 já tinha sido bom para os bancos. Os juros dos créditos, nomeadamente as taxas indexadas à Euribor no crédito à habitação, saíram do vermelho e começaram a engordar a margem financeira (diferença entre os juros pagos pelos clientes nos créditos e juros pagos aos clientes nos depósitos). E o início de 2023 prolongou essa tendência. Esta recuperação é há muito desejada pela banca, depois de uma política monetária para atender aos impactos da pandemia que atrasou a subida normal dos juros. Só não se esperava uma guerra e a invasão da Ucrânia pela Rússia trouxe novos problemas ao sistema financeiro.

E como se comportaram alguns dos principais indicadores de negócios dos bancos? Conheça o desempenho da CGD, BCP, Santander, Novo Banco, BPI e Banco Montepio nos primeiros três meses de 2023 em Portugal e a sua comparação com igual trimestre de 2022.

CGD LIDERA NOS LUCROS, SANTANDER É SEGUNDO NO PÓDIO, MAIOR SUBIDA É DO MONTEPIO

Os bancos continuam a sua escalada e no primeiro trimestre deste ano os lucros foram muito maiores do que em igual período de 2022. A Caixa Geral de Depósitos foi o banco que maiores lucros registou - só com a atividade em Portugal - 231,7 milhões de euros, seguida do BPI, mas o Banco Montepio o que registou a maior subida (ver quadros).

As explicações são muitas e passando em revista algumas percebe-se por que razão os bancos estão a engordar os seus resultados, já podem pagar juros mais altos nos depósitos - as taxas de juros chegam a 3% em alguns casos mas são promocionais - , e as margens mais do duplicam na maioria dos bancos, tal como os lucros e a sua rentabilidade.

Tudo boas razões para que mais cedo ou mais tarde os depósitos possam começar a ter melhores retornos e com otimismo partilhado pela banca e até pelo Governador do Banco de Portugal. O BCE espera que o crédito em incumprimento não suba e permita aos bancos manter as reduções significativas que foram feitas durante os últimos anos de crédito improdutivo (o que aconteceu, dizem os bancos, à custa de resultados, de rentabilidade e de capital).

INFLAÇÃO ALTA ACABA POR DITAR AS DESEJADAS SUBIDAS NAS TAXAS

A inflação já estava a subir antes da guerra, mas a invasão da Ucrânia pela Rússia trouxe maiores custos de energia, que entretanto começaram a aliviar. Só que a subida dos preços ganhou vida e foi especialmente forte e persistente.

Conclusão: na Europa o Banco Central Europeu (BCE) começou a fazer o seu trabalho para travar a inflação, ou seja, começou a subir os juros - seguindo, aliás, o que a Reserva Federal dos Estados Unidos já tinham começado a fazer, - e ainda não parou.

Para os bancos portugueses que negoceiam no crédito à habitação com taxas de juro indexadas à Euribor, as margens começaram a subir e a compensar anos de contração.

Até há pouco tempo não eram remunerados os depósitos porque as taxas eram muito baixas ou mesmo negativas, e os clientes pagavam “pouco” pelos créditos.

Agora os bancos continuam a pagar “pouco” pelos depósitos mas já recebem mais pelos créditos e o resultado é visível: as margens financeiras dos bancos vão de vento em popa.

CAIXA DESTACA-SE NOS GANHOS

Mais uma vez os resultados estão à vista. E volta a ser o banco público o que mais ganhou com isso: registou um crescimento de mais de 200%. Acompanhado pelos restantes bancos, como o BCP, Novo Banco, BPI e Montepio, cujos crescimentos foram significativos - acima dos 60% - mas muito longe dos da CGD. Só o Santander registou um crescimento abaixo deste patamar mas ainda assim de mais de 38%.

Mas esta evolução não tem necessariamente a ver com concessão de crédito novo, como se irá ver.

CGD E MONTEPIO SÃO QUEM REGISTA MAIS CRESCIMENTO NAS COMISSÕES

A politica de comissionamento da banca não registou grandes crescimentos, por um lado há clientes que, apesar de manterem os seus depósitos, não estão a contratar produtos estruturados, como fundos de investimento, estão antes a colocar algumas das suas poupanças em certificados de aforro e do tesouro.

As comissões em outros produtos não estão a crescer porque este tipo de colocação abrandou e há mesmo clientes a sair destes produtos.

Globalmente, as comissões cresceram mas a níveis muito inferiores aos de outros indicadores da banca. Estando o crédito a cair, também por aqui não pode haver mais volume de receita.

Os dados recolhidos nos seis bancos que já apresentaram as contas dos primeiros três meses do ano dão conta de que a maior subida de comissões face a igual período de 2022 foi registada pelo Montepio, seguido da CGD. O banco que registou menos crescimento foi o Santander.

CRÉDITO AINDA NÃO DISPAROU

Na sua esmagadora maioria os seis bancos de maior dimensão que já publicaram as contas do primeiro trimestre registaram reduções marginais na concessão de crédito à economia. Estes dados dizem respeito, mais uma vez, ao negócio bancário em Portugal e não incluem as suas operações fora do país.

Neste indicador o BCP e a CGD registam uma redução marginal, mais vincada é a queda verificada no Santander e Montepio, acima dos 2%.

Só mesmo o Novo Banco e o BPI dão nota de crescimento nos créditos, com o banco controlado pelos espanhóis do CaixaBank a evidenciar o maior crescimento no primeiro trimestre.

SÓ BCP CRESCE NOS DEPÓSITOS

Também os recursos de clientes bancários não revelam grandes crescimentos. No BCP o crescimento dos depósitos em Portugal foi de 5,1%. Todos os outros bancos registaram no primeiro trimestre reduções entre os 0,49%, no caso da CGD, e os 4,85%, no caso do Santander. O Novo Banco manteve o nível dos depósitos: 27,562 mil milhões de euros no período.

Os depósitos continuam a ser remunerados com taxas relativamente reduzidas. Há bancos com taxas à volta dos 3%, só que são sobretudo por prazos curtos (menos de um ano) e promocionais.

Mesmo assim os portugueses são fiéis, havendo muitos clientes mais sofisticados que podiam canalizar dinheiro para outros bancos estrangeiros e que acabam por manter o seu aforro na banca a operar em Portugal.

Um cenário que dura há décadas, independentemente de os depósitos a prazo serem ou não serem remunerados.

Neste particular os depositantes são persistentes e resilientes, contribuindo para uma situação positiva de liquidez dos bancos. Aliás, esta é uma situação que nas crises passadas teve de ser muito acautelada já que os bancos tinham um desequilíbrio grande no rácio de transformação - relação entre depósitos e crédito concedido.

Os bancos em Portugal chegaram a ter rácios de 160% e tiveram de cortar muito no crédito para reduzir para menos de 100% - o que demorou alguns anos. Hoje em dia a banca tem rácios de transformação abaixo dos 100% ou mesmo dos 90%.

RENTABILIDADES MAIORES

A rentabilidade tem sido o calcanhar de Aquiles da banca a operar em Portugal. O ROE (Return on Equity), designação anglo-saxónica da rentabilidade dos capitais próprios, revelou estar no bom caminho, nos primeiros três meses do ano. Já no final de 2022 sinalizou a melhoria mas face ao primeiro trimestre do ano passado a diferença é mais significativa.

A pandemia veio deitar abaixo este indicador, que mede a capacidade de retorno para o acionista. E assistiu-se a uma regressão devido a maiores cautelas no que diz respeito a reforço de provisões em anos de incerteza que marcaram a crise da covid-19.

Em 2022 assistiu-se já a uma recuperação mas com diferenças grandes entre bancos.

No primeiro trimestre de 2023 os bancos dão sinais muito positivos. Todos os bancos dão nota de que existem melhorias muito significativas e quer a CGD, quer o BCP quer o Santander e em particular o Novo Banco, que lidera, estão acima dos dois dígitos.

No Novo Banco o ROE era em março de 2022 de 7,1% e nos primeiros três meses do corrente ano passou para 20,3%. O ex-BES, cujo maioria do capital - 75%- está no fundo norte-americano Lone Star, e o restante no Fundo de Resolução e Estado, deverá ser vendido em 2024 e nunca distribuiu dividendos por estar em reestruturação e impossibilitado de o fazer. Quando o indicador que revela a capacidade de gerar valor para o acionista está acima de 10% o banco está no bom caminho para não só atrair capital como para melhor tratar os seus clientes (Expresso, texto da jornalista Isabel Vicente e infografias do jornalista Carlos Esteves)

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