sexta-feira, junho 16, 2023

4 administradores da TAP receberam nove milhões de euros em indemnizações

O antigo ex-secretário de Estado nega ter dado ordens à CEO da TAP para ignorar o Ministério das Finanças e diz que foi "infeliz" na resposta sobre voo de Marcelo. Hugo Mendes, antigo secretário de Estado das Infraestruturas, considera “ridículo” achar que proibiu interação da TAP com o Ministério das Finanças, penaliza-se sobre a reação ao pedido para alterar voo do Presidente da República e defende saída de Alexandra Reis com a necessidade de “empoderar” a ex-CEO, Christine Ourmières-Widener. O antigo governante, braço direito de Pedro Nuno Santos, fez uma longa intervenção inicial na comissão de inquérito, esta quarta-feira, onde tentou explicar os casos em que teve intervenção e rebater algumas das acusações deixadas na comissão parlamentar de inquérito à TAP. Uma delas é de que deu instruções à ex-CEO da TAP e ao presidente do conselho de administração para que a sua interação com o Governo passasse apenas pelo Ministério das Infraestruturas.

“É ridícula a afirmação de que queria impedir a TAP de comunicar com Finanças”, afirmou. Hugo Mendes disse que a troca de mensagem com Christine Ourmière-Widener, onde é dada a instrução para as Infraestruturas ser sempre a “porta de entrada” no Governo, dizia respeito a uma interação tida pela companhia com o Ministério do Trabalho, sem que tivesse conhecimento. Relatou que o mesmo aconteceu com a Administração Interna, Defesa e Negócios Estrangeiros.

Leu também a continuação da troca de mensagens, em que afirma a Christine Ourimières-Widener que a tutela “operacional e laboral” é o Ministério das Infraestruturas e a “financeira” são as Finanças. A tese alimentada sobre ter sido dada uma instrução para o contacto da TAP ser apenas com as Finanças “é absurda, grave e irresponsável”, reiterou, depois de ter sublinhado a “intensa cooperação que sempre existiu entre as tutelas”.

Uma relação que se tornou menos frequente após a aprovação do plano de reestruturação da companhia aérea, em dezembro de 2021. Apesar dela, Hugo Mendes não deu conta às Finanças do acordo para a saída da ex-administradora Alexandra Reis e o pagamento de uma indemnização de 500 mil euros. E, neste caso, reconheceu que falhou. “A verdade é que por uma questão de boa articulação política eu devia ter comunicado com as Finanças”, assume. A verdade é que por uma questão de boa articulação política eu devia ter comunicado com as Finanças.

O ex-governante considerou, no entanto, que a decisão sobre o acordo de renúncia cabia à administração da TAP e que o Governo confiou no assessor jurídico da companhia, a SRS Legal. “Eu não estava e não me queria imiscuir nos pormenores jurídicos e nunca foram levantados riscos jurídicos”, afirmou. “Não me passava pela cabeça que não estava a ser seguido o enquadramento jurído correto”. No início de março, a Inspeção-Geral de Finanças concluiu que o acordo de saída de Alexandra Reis era ilegal, por violar o Estatuto do Gestor Público. Hugo Mendes remeteu as responsabilidades para a companhia aérea e o seu departamento jurídico, considerando que “a camada de compliance da empresa falhou”.

Hugo Mendes justificou a aceitação da proposta para a saída da antiga administradora com a necessidade de “empoderar a autoridade da CEO na liderança da sua equipa”, face ao desejo de substituir uma vogal que não escolhera e com quem não tinha um alinhamento estratégico.

“Não somos nós que mandamos na comissão executiva. É a líder da comissão executiva. Demos a autoridade para a presidente da comissão executiva escolher parte da sua equipa”, dando-lhe condições para gerir a empresa num momento “duríssimo”, defendeu.

13 administradores receberam 8,5 milhões

Bernardo Blanco, deputado da Iniciativa Liberal, questionou Hugo Mendes sobre outras indemnizações pagas na companhia aérea e revelou que, entre 2020 e 2023, 13 administradores receberam 8,5 milhões de euros, incluindo Alexandra Reis. Juntando um outro que saiu em 2017, a soma sobe para 9,3 milhões. Os dados constam de uma auditoria à EY sobre remunerações e indemnizações pagas na companhia, que já foi entregue à CPI. O ex-secretário de Estado respondeu que desconhece e não deu autorização a outras indemnizações. O deputado acrescentou ainda que no mesmo período saíram da companhia aérea quase 300 pessoas que receberam indemnizações superiores a 100 mil euros, totalizando cerca de 40 milhões de euros.

Hugo Mendes assumiu ainda que errou na resposta a um email da ex-CEO da TAP em que esta questiona sobre um pedido, recebido da agência de viagens que trabalha com a Presidência da República, para alterar um voo onde seguiria Marcelo Rebelo de Sousa. “Penalizo-me pelo comentário que fiz à CEO sobre a viagem do Presidente da República. Não devia ter partilhado opinião no conteúdo e na forma“, afirmou. “Limitei-me a partilhar uma opinião. Foi sem dúvida infeliz, mas não dei nenhuma instrução“, acrescentou.

Na altura, Hugo Mendes sensibilizou Christine Ourmières-Widener para a importância do apoio do Presidente da República ao plano de reestruturação. A ex-CEO decidiu não alterar o voo. O ex-secretário de Estado afirmou que o ministério teve imensas pressões políticas, de agentes económicos e da sociedade civil, nomeadamente em relação às rotas. “Nunca cedemos a pressão externa nem fizemos pressão interna. Quem decide para onde a TAP voa é a comissão executiva”, garantiu.

Elogios a Frederico Pinheiro

Bernardo Blanco quis saber qual a opinião de Hugo Mendes sobre o antigo adjunto de Pedro Nuno Santos e depois de João Galamba, Frederico Pinheiro, que depois de exonerado foi ao Ministério das Infraestruturas buscar o seu computador, envolvendo-se em agressões. O ex-secretário de Estado deixou vários elogios.

“É uma pessoa inteligentíssima, versátil, rápida, um trabalhador incansável, preparadíssima no setor“, descreveu Hugo Mendes, sublinhando o seu “pensamento crítico” e capacidade de transmitir opiniões discordantes. “Sobre ser violento nunca me apercebi de nada. Quando chegava às reuniões cumprimentava toda a gente com um sorriso”, disse.

Hugo Santos Mendes foi secretário de Estado das Infraestruturas de Pedro Nuno Santos entre 30 de março de 2022 e 4 de janeiro de 2023. Demitiu-se na sequência do caso da indemnização de 500 mil euros à antiga administradora Alexandra Reis. No Executivo anterior, tinha sido Secretário de Estado Adjunto e das Comunicações, também com o ministro das Infraestruturas e Habitação, de quem foi chefe de gabinete entre 2019 e 2020. Licenciado em Sociologia e mestre em Políticas Públicas pelo ISCTE, começou a trabalhar em governos socialistas em 2006, como assessor da Ministra da Educação.

A audição do antigo braço direito de Pedro Nuno Santos é a primeira de uma série de audições de peso esta semana, as últimas da CPI. Amanhã será a vez do antigo ministro das Infraestruturas e na sexta-feira do ministro das Finanças, Fernando Medina.

A comissão parlamentar de inquérito para “avaliar o exercício da tutela política da gestão da TAP” foi proposta pelo Bloco de Esquerda e aprovada pelo Parlamento no início de fevereiro com as abstenções de PS e PCP e o voto a favor dos restantes partidos. Nasceu da polémica sobre a indemnização de 500 mil euros paga a Alexandra Reis para deixar a administração executiva da TAP em fevereiro de 2022, mas vai recuar até à privatização da companhia em 2015. Tomou posse a 22 de fevereiro, estando a votação do relatório final prevista para 13 de julho (ECO digital, texto do jornalista André Veríssimo)

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