sábado, junho 04, 2022

Ucrânia: A guerra vai fazer florescer o mercado negro de armas

Criminosos já planeiam pôr as mãos no enorme arsenal que se acumula na Ucrânia, avisou o secretário-geral da Interpol. O mercado ideal para vender é na Europa. O regresso da guerra à Europa, com a invasão russa da Ucrânia, levará à proliferação do mercado negro de armas. Abrindo portas a que o crime organizado parasite o enorme arsenal enviado aos ucranianos pela NATO, alertou o secretário-geral da Interpol, Jürgen Stock. “Quando as armas se silenciarem, virão as armas ilegais. Sabemos isto olhando para muitos outro teatros de conflito”, notou o chefe da organização internacional que facilita a cooperação policial mundial. A União Europeia é “um destino provável para estas armas, porque os preços das armas de fogo no mercado negro são significativamente mais altos na Europa, especialmente nos países escandinavos”,  explicou Stock, esta quinta-feira, em declarações à Anglo-American Press Association, em Paris. 

Este alerta surge um dia após a Casa Branca anunciar que vai aceder aos pedidos de Kiev, e enviar o armamento pelo qual as forças ucranianas mais ansiavam, os M142 Himars. São baterias de mísseis de enorme alcance, até 80 quilómetros, montadas em camiões, que disparam mísseis guiados por GPS com grande precisão. E que têm potencial para fazer a vida negra às forças russas nas vastas estepes do Donbass, onde a artilharia se tornou essencial. 

É difícil imaginar que algum militar corrupto as consiga desviar M142 Himars discretamente ou que criminosos os consigam vender. Mas, junto com este armamento mais avançado, a NATO têm enviado enormes quantidades de armas ligeiras, metralhadoras e até lança-mísseis de ombro, que tropas ucranianas tão bem souberam usar para travar os russos a norte de Kiev e nos arredores de Kharkiv. 

“Grupos criminosos tentam explorar estas situações caóticas e a disponibilidade de armas, mesmo as utilizadas pelas forças armadas, incluindo armas pesadas”, salientou o secretário-geral da Interpol. “Criminosos já estão, neste momento, a focar-se nisso”.  

De facto, não seria sequer a primeira vez que isso acontecia na Ucrânia. Já após a guerra de 2014, no rescaldo da anexação da Crimeia e do conflito com os separatistas do Donbass, a Ucrânia virou um polo do tráfico de armas, com sucessivos roubos de armamento ou militares corruptos a vender o que lhes fora entregue por Kiev ou Moscovo.

Uma investigação da Reuters, em 2016, verificou que um militante francês de extrema-direita tinha sido detido por guardas fronteiriços ucranianos, quando tentava entrar na Polónia, levando kalashnikovs e até lança-mísseis na bagageira da sua carrinha. À época, muito armamento pesado tirado de arsenais ucranianos era enviado para o Médio Oriente a partir do porto de Odessa - uma cidade conhecida pela sua máfia, mas que de momento está sob bloqueio da frota russa do Mar Negro - e já as armas vendidas pelos separatistas russos eram sobretudo compradas por rebeldes chechenos ou inguchenos, que as enviavam para casa, no Cáucaso.  A invasão da Ucrânia, com as autoridades a entregarem livremente armamento à população, de maneira a que consigam defender a sua terra, “vai criar um desafio”, frisou o secretário-geral da Interpol. “Nenhum país ou região consegue lidar com ele isolado, porque estes grupos operam a um nível global” (Sol, texto do jornalista João Campos Rodrigues)

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