segunda-feira, novembro 24, 2008

25 de Novembro: opinião

Um artigo sobre o 25 de Novembro de Luiz Carvalho no jornal Expresso:
"A festa tinha sido bonita, mas acabara. Duran Clemente, o oficial revolucionário, entrou no ar interrompendo a emissão da RTP para falar ao povo. Passados minutos, depois de algumas expressões patéticas, foi retirado do ar. O Dany Kaye em filme americano deu-lhe continuidade. A ideologia rosa vencia a ideologia vermelha.Antes, o país entrara em colapso. Aquele Verão de 75 tinha sido quente. Um país em brasa. Os militares rebeldes do Copcon, com Otelo à cabeça, qual Fidel Castro da Europa disposto a meter no Campo Pequeno os fascistas (quem não estava com a revolução era uma espécie em vias de extinção), queriam tomar o poder. Nacionalizações, ocupações selvagens, autogestão, ocupação de empresas pelos trabalhadores, o quadro mais insurrecto podia ser observado no Portugal de 75.O delírio colectivo estava na rua. Soldados ocuparam Lisboa, desviaram autocarros, atravessavam a Ponte 25 de Abril gritando «Soldados são filhos do povo, revolução já!».Na manhã de 26 de Novembro, 200 comandos, sob as ordens do mítico coronel Jaime Neves, abriram fogo sobre o Regimento da Polícia Militar (RPM) em Belém, então comandado pelo major Tomé, que se assumia como a força militar de defesa do MFA. Este movimento «libertador e democrático» que pretendeu «devolver ao povo o genuíno espírito do 25 de Abril» foi uma ratoeira bem armada pelos militares ligados ao Grupo dos Nove, com Eanes no comando.Tudo começou com a movimentação de 123 pára-quedistas ligados às forças de extrema-esquerda sedeados em Cortegaça para que convencessem outros camaradas a ocuparem cinco bases aéreas, entre elas a de Tancos. À mesma hora, forças da direita começavam a levantar barricadas em Rio Maior, a «terra da moca», o ícone da «reacção». Entretanto, Otelo é retido numa reunião do Conselho da Revolução e demitido. Quando chega a Belém para se apresentar ao Presidente Costa Gomes, os carros de assalto do coronel Jaime Neves saem da Amadora e rumam à RPM, a escassos metros do Palácio, para derrubar o último reduto otelista.Foi a vitória de uma facção militar muitas vezes conotada com a direita mais radical, mas que depois do golpe aceitou as regras democráticas de homens como Eanes e Costa Gomes, com um Álvaro Cunhal inteligente a saber usar uma das máximas de Lenine: «É preciso saber dar dois passos à frente e um atrás».

Sem comentários: