Governo de António Costa e Miguel Albuquerque voltam a contestar decisão de Bruxelas que declarou ilegal a forma como Portugal concedeu reduções de IRC. Depois de perder duas acções no Tribunal Geral da União Europeia (UE), Portugal está a tentar anular de novo o processo de recuperação das ajudas ilegais de IRC na Zona Franca da Madeira (ZFM), desta vez apostando as fichas no Tribunal de Justiça da UE. A primeira acção a chegar à jurisdição superior foi apresentada pelo Estado (pela mão do Governo de António Costa) a 30 de Novembro de 2022 e, agora, a própria Região Autónoma da Madeira (RAM) prepara-se para fazer o mesmo, depois de ter perdido há poucos dias um processo no Tribunal Geral.
As duas acções, da República e da RAM, têm o mesmo objectivo e argumentos próximos: Portugal tenta anular a decisão da Comissão Europeia de Dezembro de 2020 que obriga Portugal a reaver os auxílios concedidos a cerca de 300 entidades licenciadas entre 2007 e 2014. Bruxelas declarou ilegal a forma como Portugal aplicou o regime III da zona franca ao atribuir um IRC mais baixo sem verificar se as empresas cumpriam as condições pré-acordadas que garantiam o cumprimento das regras de concorrência no mercado único.
Embora fosse necessário limitar a atribuição das reduções
fiscais aos lucros gerados na Madeira e calcular esses incentivos com base nos
postos de trabalho criados e mantidos na região (e não fora do arquipélago ou
mesmo da União Europeia), Portugal concedeu incentivos sem controlar se as
condições eram cumpridas.
O presidente do executivo, Miguel Albuquerque,
considerou a decisão do Tribunal Geral “estapafúrdia” relativamente ao facto de
os empregos usados no cálculo do IRC reduzido terem de estar apenas localizados
no arquipélago e anunciou que a RAM avançará para o TJUE.
Aí, a República portuguesa já apresentou os seus
argumentos, insistindo em que o tribunal de primeira instância cometeu um erro
na interpretação do requisito relativo à origem geográfica dos lucros e
alegando que o acórdão, ao debruçar-se sobre a questão da localização das
actividades, não teve em conta jurisprudência do Tribunal de Justiça sobre
“centro dos interesses principais [das empresas], do efeito de arrastamento
(spillover effect) e das liberdades fundamentais”.
No regime III, que abarcou as empresas licenciadas
entre 2007 e 2014, as entidades podiam beneficiar, de 2007 a 2020, de um IRC
mais baixo (de 3%, 4% e 5%, consoante os anos) em função de determinadas
condições. Uma delas implicava a criação e manutenção de postos de trabalho na
Madeira. A base tributável sobre a qual se aplicaram as reduções fiscais tinha
tectos e, para o cálculo dos limites, era relevante o número de postos de
trabalho criados e mantidos por cada empresa.
Só que Bruxelas descobriu que Portugal validou incentivos
mesmo havendo uma duplicação de postos de trabalho, trabalhadores
contabilizados fora da Madeira e postos de trabalho a tempo parcial
contabilizados como se fossem a tempo integral.
Para o Tribunal Geral, a Comissão “declarou com razão
que o regime III, conforme aplicado, conferia uma vantagem selectiva aos seus
beneficiários” e concluiu “acertadamente” que a forma como Portugal tratou as
reduções de IRC sem atender à origem dos lucros desrespeitou as decisões
europeias que asseguravam o cumprimento das regras do mercado único.
“A Comissão não cometeu nenhum erro ao interpretar que
as reduções do IRC previstas no regime III apenas poderem ter por objecto os
lucros resultantes de actividades ‘efectiva e materialmente realizadas na
Madeira'” e, “contrariamente ao que alegava a RAM, a expressão ‘actividades
efectiva e materialmente realizadas na Madeira’, na sua acepção habitual, não
pode ser interpretada no sentido de que visa actividades realizadas fora da
RAM, mesmo que por sociedades registadas na ZFM”, explica o Tribunal Geral. O
mesmo diz em relação à forma como os empregos foram contabilizados,
considerando que Portugal violou “o requisito de criação e de manutenção de
postos de trabalho na RAM”.
As mesmas questões serão agora apreciadas na instância superior. E mesmo estando a contestar o caso em tribunal, Portugal continua obrigado a executar a decisão da Comissão, ou seja, tem de avançar com a recuperação das ajudas. O processo está em marcha, mas a demorar mais do que o período previsto no calendário do Governo (Publico, texto do jornalista Pedro Crisóstomo)
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